por: Adrian Theodor
Temos visto, nos últimos tempos, pessoas que advogam o uso do estilo Soul na adoração. Estas pessoas defendem que este é um estilo perfeitamente apropriado para a adoração, tendo como base os seguintes argumentos:
- Música Soul é como qualquer outra música
- Não vejo nada de prejudicial
- O que eu sinto é uma sensação muito boa quando canto ou ouço um louvor de música Soul
- Soul significa “alma”
- Música Soul fica muito bonita
- Música Soul me traz alegria, fervor, vontade enorme de louvar mais e mais
- Minha mente não me acusa de nenhum erro e nem sinto que Deus não goste da música Soul, e pra mim isso basta.
Vemos que estes argumentos apoiam-se em dois alicerces principais:
- O que “eu” acho ser certo, e
- O que “eu” sinto quando uma música Soul é executada.
Este artigo pretende ressaltar alguns pontos importantes que devem ser levados em consideração quando o assunto é o uso da música na adoração ou louvor a Deus. Antes de entrar no debate do uso ou não do Soul, devemos entender o que é, propriamente, o culto a Deus e o que Ele pede a este respeito. Somente depois disso é que poderemos tentar discutir sobre o uso da música na adoração. Sabendo que a música Soul tem como característica principal um forte apelo emocional, trataremos neste artigo, de modo sucinto, da tensão entre a razão e a emoção na adoração. Vamos por partes:
I. O que é correto e o que é incorreto no uso dentro da igreja? O que é o culto? Qual deve ser nossa postura no culto?
O motivo do cristão em ir à igreja, ao contrário do que se diz no costume popular, não é o de “assistir ao culto”. Deveríamos ir à igreja, a cada sábado, não para ver o pastor pregar, ou para assistir à Escola Sabatina, mas para prestar um culto conjuntamente com o pastor e participar ativamente da Escola Sabatina. O pastor, ao pregar (além de estar alimentando o rebanho com o alimento espiritual) está representando toda a sua congregação diante de Deus, ou seja, está adorando a Deus conjuntamente com todos aqueles que compartilham daquela mensagem. O pastor prega e o verdadeiro adorador participa! O verdadeiro adorador não é apenas um ouvinte passivo, é um participante ativo: em ouvidos, respostas, “améns”, pensamento, oração!
Deste pensamento, tiramos um outro muito precioso: se a adoração é ativa, devemos oferecer algo a Deus! Mas Deus pede alguma coisa de nós? Claro que sim! E o que Deus pede?
Em João 4:23-24, lemos: “No entanto, está chegando a hora, e de fato já chegou, em que os verdadeiros adoradores adorarão o Pai em espírito e em verdade. São estes os adoradores que o Pai procura. Deus é espírito, e é necessário que os seus adoradores o adorem em espírito e em verdade”. Portanto, o que Deus pede de nós na adoração é nada mais, nada menos do que: adoração em espírito e verdade e nosso coração! Ou seja, Deus pede o melhor que podemos dar!
Sobre o ato da adoração no culto, sobre aquilo que Deus pede (sobre o que devemos oferecer), sobre “certo X errado” e sobre qual a relação de tudo isso com a música, indico vários artigos:
2. Adoração – O Presente do Homem para Deus
3. A Dualidade Divina para a Música e Adoração
4. A Escolha da Música é Realmente Importante?
Indico sobre este assunto vários outros artigos correlatos, localizados na Seção “A Forma da Adoração” do site Música Sacra e Adoração.
II. Por que o Soul? O gosto pessoal é o mais importante ou a Bíblia apresenta uma diretriz sobre este assunto?
Faço a você, leitor, apenas duas perguntas: 1. Quando a mulher de Ló, ao sair corrida de Sodoma, virou-se para trás e tornou-se estátua de sal, estava buscando a verdade de Deus ou o seu gosto pelas coisas mundanas de sua antiga cidade? 2. Quando Caim ofereceu o seu melhor para Deus e, mesmo assim foi rejeitado, estava ele seguindo os preceitos de Deus ou o seu próprio coração, o seu próprio gosto?
Através desses dois exemplos já podemos ver que o gosto do homem leva à perdição… Com a escolha da música acontece o mesmo! Ai de nós se escolhermos a música errada para adorarmos a um Deus que é Amor, mas que é também Soberano, Juiz, Altíssimo e Senhor do Universo! Devemos ter este cuidado porque lemos em Hebreus 12:28-29 as seguintes palavras: “Portanto, já que estamos recebendo um Reino inabalável, sejamos agradecidos e, assim, adoremos a Deus de modo aceitável, com reverência e temor, pois o nosso Deus é fogo consumidor!”
Para que escolhamos a música correta, é necessário termos em mente, com muita oração, leitura da Bíblia e do Espírito de Profecia, qual é a teologia bíblica da adoração! Ao perceber que a bíblia apresenta sim, e claramente, uma teologia com respeito à música e à adoração, descobriremos também que o gosto pessoal é insignificante. Artigos básicos sobre o tema:
1. Dois capítulos do livro “O Cristão e a Música Rock” de autoria do Dr. Samuele Bacchiocchi: O Capítulo 6 – “Uma Teologia Adventista da Música na Igreja” e o Capítulo 7 – “Princípios Bíblicos de Música“.
2. Bases Bíblicas Para Uma Teologia de Música e Adoração
III. A música Soul é apropriada? Pode ser usada dentro da igreja?
Para responder a essa pergunta, teríamos que remontar às origens deste tipo de musica.
A música Soul é uma música característica dos negros norte-americanos e nasceu a partir de modificações de um outro ritmo, o Blues. Para entendermos melhor o Soul precisamos entender a sua raiz, o Blues.
A palavra Blues é uma gíria dos negros norte-americanos para “tristeza”, ou “melancolia”. É mais ou menos um correlato da palavra que os negros trazidos para o Brasil usavam: “banzo”. A palavra representava a tristeza profunda por estar na situação de escravo, de estar longe da terra natal, ou (mesmo depois da libertação) de serem cidadãos marginalizados e vítimas de imenso preconceito racial. Esta melancolia foi canalizada pelos negros norte-americanos em uma música que ficou conhecida segundo a palavra que lhe dera origem, ou seja, o Blues. Hoje, por exemplo, o grande expoente do Blues é B.B.King.
Até aqui, não é possível ver qualquer ligação entre este estilo musical e a adoração. Muito pelo contrário, vimos que este é um estilo puramente emocional e que, além disso, tenta expressar toda a melancolia de um povo oprimido. A religião cristã é exatamente o oposto destas duas características.
Podemos exemplificar a origem da música Soul com o seu maior expoente, Ray Charles. Ele começou tocando Blues (mais especificamente, Rhythm & Blues, mas, para não alongarmos este desvio do assunto, não entraremos no mérito das posteriores alterações do Blues). A este estilo musical ele acrescentou elementos da música Gospel (que já se misturava aos estilos populares, com Elvis Presley e outros) e também adicionou uma seção de metais, principalmente o trompete com surdina. Estava formada, em poucas palavras, a música Soul.
Vemos assim que a música Soul nasce como uma forma híbrida. Por um lado encontramos o Blues, o melancólico, o triste. Por outro, temos o Gospel, que já começava a perverter os valores cristãos, em uma busca apelativa do puro sentimento. Não entrarei aqui em detalhes sobre este desenvolvimento, uma vez que não é este o propósito do artigo, mas, mais uma vez, indico algumas leituras (quem realmente estiver interessado sobre a verdade, lerá esses artigos):
1. Os capítulos 09 – “Como a Música Pop Entrou na Igreja“, e 10 – “A Música Popular e o Evangelho“, do já citado livro do Dr. Bacchiochi.
2. O Capítulo 01 – “A Verdadeira e a Falsa Teoria Comparadas” do livro “Santificação”, de Ellen White
IV. Mas se “eu me sinto bem”, se “eu estou contente”, se “a música não afeta minha adoração”, não estou correto? O que importa não são minhas sensações? Quais os limites entre razão e emoção?
Este, infelizmente, tem sido assunto de imensos e acalorados debates. Em primeiro lugar devemos tomar o cuidado de não dividir rigidamente o ser humano em dois: um racional, outro emocional. O ser humano, tal qual criado por Deus, é, ao mesmo tempo, racional e emocional, não um átomo ora emocional, ora racional.
O que devemos ter em mente, portanto, não é se devemos escolher uma música para o culto de Deus (ou para a nossa adoração diária) segundo o critério da razão ou da emoção, mas sim que o critério (o único infalível) é aquele apresentado pela Bíblia (como já dito anteriormente). Afinal, após o pecado, tanto a nossa razão quanto a nossa emoção foram destroçados, embotados, diluídos. Sobre este assunto, indico dois artigos. O primeiro, tencionando a razão e a emoção em busca do equilíbrio; o segundo, nos advertindo de que não se deve confiar nas circunstâncias para escolher uma música, sim na palavra de Deus:
1. Adoração Intelectual ou Emocional?
2. A Verdade Está Acima da Contingência
Espero, com sinceridade, que o Espírito de Deus os oriente no caminho das leituras apresentadas. O trabalho de conhecer a verdade não é sempre fácil, e algumas leituras e reflexões são necessárias. Depois de ler bastante acerca da vontade de Deus, dificilmente nos perderemos em debates infrutíferos e rasos. A leitura destes textos será uma experiência altamente enriquecedora e espiritual, tenho certeza!