(Falsas) Estratégias de Crescimento para a Igreja

A Secularização dos Evangelizados

por: Pr. Douglas Reis

Acompanhei, sem me manifestar, a conversa informal de alguns amigos. Tudo começou quando alguém fez menção a uma banda de rock, a qual trazia referência em suas letras a conceitos cristãos, inclusive parafraseando versos bíblicos. Vale frisar: não era uma banda cristã. Diante do sucesso dos músicos, meus amigos teceram conjecturas diversas, sobre como as pessoas secularizadas anseiam e apreciam a religião. Um deles até observou que a apreciação vinda do público apenas revelava que os secularizados ouvem a mensagem cristã quando vem na embalagem certa, isto é, o gênero musical que conhecem e apreciam.

É de se indagar se outras explicações possíveis não dariam conta de entender o fenômeno: e se as pessoas gostassem tanto do som da banda a ponto de a receptividade ser a mesma, independente de citarem versos bíblicos ou suras dos Alcorão? Ou se as pessoas simplesmente se sentissem atraídas por um modelo de espiritualidade sem vínculo com instituições religiosas, o que as faria abertas a ouvir de uma banda de rock o que não se disporiam a ouvir de um pregador cristão, representante de uma igreja X, com suas regras abjetas aos olhos de pessoas sem compromisso religioso?

Para além de fazer notável que um fenômeno social nem sempre tem sua resolução no leito de Procusto das análises que ora são feitas, chamo a atenção para a conclusão de que as duas alternativas que propus são igualmente falhas. Não digo que não fossem possíveis, mas lhes falta ir ao cerne da questão: afinal, quem são as pessoas secularizadas e por que não as conseguimos alcançar com a nossa mensagem?

A secularização é um fenômeno que começou com o advento da modernidade e, por mais que muito se falou sobre isso, os estudiosos não chegaram a um consenso sobre suas características. Basicamente, dado o desenvolvimento de uma sociedade, surgem alternativas a mitologias religiosas, de maneira que ocorre o “desencanto da religião”. O mundo deixa de ser aquele lugar mágico, onde os deuses habitam e operam. Há lapsos conceituais nessa perspectiva, no que se refere à religião bíblica, que nunca deixou de reconhecer a existências de fenômenos físicos, conquanto admitisse que Deus os ordenou. Todavia, não vamos entrar nos méritos. Resta dizer que a teoria da secularização sofreu algumas mudanças porque, ao contrário do que previam os sociólogos, a religião não deixou de ser paradigma influente na sociedade. O aumento de oferta e procura por crenças, tanto as tradicionais quanto as alternativas, foi chamado ironicamente de “a revanche do sagrado”.

A religião não sumiu; então, os defensores da secularização se equivocaram? Em parte, sim. Mas acertaram no que diz respeito aos efeitos da secularização, no aspecto de que a religião perde seu domínio diante da noção (pós-)moderna de privatização. A fé se tornou parte da vida, uma esfera, confinada a algumas atividades e a determinados sentimentos. Fé não é mais a perspectiva geradora, a força motriz das decisões, a visão do todo – e mesmo para pessoas religiosas.

A mudança do pensamento global, que desembocou na pós-modernidade, veio depois. Assim, equivaler pessoas secularizadas a pessoas pós-modernas é confuso, incorreto e problemático. Outro equívoco frequente: referir-se às pessoas mais jovens como pós-modernas. Aliás, se entendermos que as premissas pós-modernas já se achavam bem disseminadas na cultura dos anos 1960, teríamos de admitir que ao menos três gerações poderiam ser consideradas pós-modernas – Boomers (1940-1960); Geração X (1960-1980) e Millenials ou Geração Y (1980-2000). Todas essas gerações, descontando fatores geográficos, sociais e culturais, grosso modo possuem uma perspectiva secularizada, sem, com isso, dizer que sejam gerações de ateus empedernidos!

Assim, precisamos desfazer alguns conceitos bem populares e, contudo, infundados: (1) pessoas secularizadas não são contra a religião ou declaradamente anticristãs! Elas não suportam hipocrisia atribuída aos religiosos, reclamam de intolerância (ou do que julgam que isso significa) e preferem espiritualidade à religião (eu posso ser espiritual sem frequentar uma igreja, mantendo hábitos que eu entenda saudáveis para minha conexão com o que quer que eu considere transcendente); (2) pessoas secularizadas existem mesmo dentro das igrejas cristãs – esse negócio de “secularizados são os outros” (parafraseando Sartre) nos impede de ver que, quando muitos de nós agimos no dia a dia sem refletir nossa fé professada, estamos indicando que o vírus do secularismo já nos atingiu faz tempo; (3) pessoas secularizadas não podem ser atraídas por uma nova liturgia ou uso de músico pop para a fé cristã, porque seria o mesmo que curar um alcoólatra lhe dando bebida com baixo teor alcoólico! Usando métodos assim, não conseguiremos evangelizar os secularizados, mas secularizar os evangelizados!

A forma de evangelizar pessoas secularizadas é mais simples: siga os métodos de Cristo. Ele Se misturou por entre as pessoas e Se mostrou sensível às necessidades que possuíam. Compartilhou amor e as verdades divinas com compaixão e exemplo. Ele inspirava as pessoas com Sua retidão e palavras poderosas. Se fizermos o que Ele fez, vivermos como Ele viveu, abalaremos o mundo. Afinal, o Império Romano, altamente secularizado, não foi transformado porque os cristãos tentaram adaptar sua mensagem aos tempos; eles evangelizaram o império vivendo intencionalmente sua mensagem.


Fonte: Questão de Confiança


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