por: Sólon do Valle
Com o passar dos anos, as religiões assumiram uma posição muito mais próxima das pessoas, todos os cultos são em português claro, e a música sacra passou a ser o pop e o rock. Com isso, houve, logicamente, uma demanda por excelente qualidade de som nos templos, e um cuidado maior nos projetos. A maioria dos materiais acústicos já existe há muitas décadas, apesar de estarem evoluindo constantemente. Os sistemas de sonorização se tornaram compactos e eficientes; e o surgimento do line array foi o maior impulso nesse sentido.
Mas, diante desse mercado, cada dia mais exigente, qual é o fator primário a ser considerado pelo profissional de áudio ao lidar com um projeto de sonorização de templos? Primeiramente, é importante lembrar que vários são os aspectos a serem analisados. Cada religião, ou denominação, tem uma liturgia diferente, que impõe diferentes graus de exigência a cada aspecto do sistema.
Por exemplo, uma igreja em que são feitos louvores em voz alta, e que fica situada dentro de uma zona residencial e silenciosa, precisará de um isolamento acústico extremamente elaborado – e caro – para não ter problemas com a vizinhança. Outra situação: um culto em que a palavra falada e as letras das músicas são importantes deve ter uma boa acústica e um bom sistema de som.
Sendo assim, é essencial levar em conta todos os fatores determinantes da configuração do projeto. Se, no momento da definição do anteprojeto, não são considerados todos os aspectos do funcionamento do templo, qualquer omissão, ou descuido, pode induzir o projetista a relaxar em alguma exigência técnica, causando uma deficiência global que poderá arruinar o trabalho, mesmo que bem elaborado nos demais itens.
Como lidar com o cliente e a estética visual?
Talvez você se pergunte: até que ponto o dono do templo tem interferência no trabalho a ser realizado? Este é um ponto muitas vezes difícil. É comum o responsável pela igreja “entender de som”, ou ter um conhecido que “é bom nisso”, e tentar provar que suas exigências são exageradas, que “ele já viu uma igreja muito mais simples e que tem um som ótimo”. Ora, pode ser que esta outra igreja, por sorte, tenha uma boa acústica. Ou pode ser que a opinião do tal amigo não seja confiável. Então, o melhor a fazer é explicar, de forma acessível, mas científica, a necessidade real do projeto a ser feito.
E se, por outro lado, você é deparado com a seguinte questão: até que ponto devemos sacrificar o projeto acústico em detrimento da estética visual do templo? Defendo que nenhum sacrifício deve ser feito. A inteligibilidade da voz e da música é essencial à grandeza do culto. Na prática, sempre é preciso fazer concessões à estética visual, evitando, por exemplo, o uso de materiais feios ou indiscretos. Mas é importante lembrar que a estética também contém uma boa parte auditiva, garantindo o conforto do público e atenuando o stress provocado por baixa inteligibilidade.
Equipamentos e materiais
Outra dúvida que pode rondar a cabeça do profissional de áudio refere-se à escolha dos equipamentos. Dentre a gama de opções que temos hoje em dia, não há produtos específicos para utilização em igrejas, embora alguns modelos se mostrem mais adequados pelo tamanho e características. A medida certa se faz pela escolha de um sistema line array. Devido ao seu excelente controle de dispersão vertical, é a opção mais correta, pois praticamente toda a energia acústica é dirigida para a plateia, e muito pouca para superfícies refletivas como chão e teto.
Seu posicionamento ideal é o clássico: duas torres suspensas (flying) em cada lado do altar, possivelmente complementadas por um “cluster” na parte central e acima, em caso de igrejas muito largas. Além disso, subwoofers podem ser colocados sob o altar também.
Em igrejas muito grandes, onde a distância entre as caixas acústicas principais e o público mais afastado é longa demais, recomenda-se o uso de sistema(s) de reforço, corrigido(s) por delay digital. Com relação ao alinhamento do sistema, este deve ser feito de forma convencional, mas sem exagerar na resposta de graves. Na verdade, as regras são as mesmas usadas em sistemas de eventos normais, utilizando-se analisador de espectro (RTA) e gerenciadores de sistemas, ou, pelo menos, equalizadores. Lembrando que não há softwares dedicados a este tipo de trabalho. Ou seja, a sonorização de templos segue os mesmos princípios da sonorização de qualquer ambiente.
Com relação aos materiais acústicos mais utilizados, estão a lã mineral revestida em tecido, painéis de madeira ou fibra, placas acústicas de fibras minerais e espumas acústicas quimicamente estáveis (as convencionais duram pouco mais de cinco anos), poltronas estofadas e cortinas. Já os rebatedores são usados em teatros para reforçar acusticamente a voz dos atores em cena. Em igrejas, com sistema de sonorização, não são necessários. Uma observação: um rebatedor não pode ser forrado de Sonex, senão seria, na verdade, um absorvedor!
Onde buscar informações?
Agora, e para o profissional de áudio que quer se especializar em acústica nas igrejas? Que livros, sites, ou cursos são os mais indicados? Na verdade, não existe uma temática específica em torno do assunto Acústica de Igrejas. Existe sim Acústica, e quem tiver bons conhecimentos dela estará apto a fazer projetos para igrejas.
Sólon do Valle é engenheiro, editor técnico da revista Áudio Música & Tecnologia e autor do Manual Prático de Acústica.