por: Isaltino Gomes Coelho Filho
[…] Impressiona-me que as pessoas, principalmente formadoras de opinião, não vejam o todo. Somos uma cultura cada vez mais imersa na sensualidade, e não no cognitivo. As pessoas não são chamadas a pensar, mas a sentir. O mote hoje é “Sinto, logo existo”. Os sentimentos validam a existência. As emoções valem mais que a razão, e numa cultura altamente individualista, as emoções da pessoa lhe são as válidas e as norteadoras de sua conduta. Não há mais dever nem senso do coletivo. As pessoas não são mais entes pensantes e sociais. São apenas animais que devem ter seus instintos saciados. Mesmo que baixos. O prazer rege o mundo, não o dever ou a responsabilidade.
Vejo o mesmo na igreja. Em uma perspectiva sensual, as pessoas querem o prazer. Não sexual, mas querem o prazer. Avaliam o culto se ele lhes fez bem. O cântico pode ter uma letra esotérica e até antibíblica, mas se fez bem à pessoa, então é válido. Cantamos aberrações, mas se elas nos dão prazer são válidas. A busca do prazer é o culto de si. Numa prática litúrgica sensual (isto é, sustentada pelos sentidos), Deus é um pretexto para as pessoas cultuarem a si mesmas. Como somos espiritualmente sofisticados, não fazemos isso explicitamente, mas camuflamos. Prevalece o nosso gosto: o bom culto é o que nos faz bem e não o que proclama a cruz e anuncia a graça de Deus. Muitos buscam não a glória de Deus, mas sua satisfação pessoal. Alguns acham que Deus foi glorificado se eles se sentiram bem. Por exemplo: uma senhora me disse ter discordado da mensagem bíblica do seu pastor, “porque o seu espírito não corroborou o Espírito”. Sua visão pessoal era mais valiosa que as Escrituras. O que ela ouviu não lhe fez bem, e assim o que ela sentia se sobrepôs à Palavra.
Muitos crentes não têm senso de dever nem visão do todo. Buscam apenas a satisfação pessoal. Não querem o Espírito, mas o espírito (que por vezes dimensionam como o Espírito). “A Bíblia diz” cedeu lugar ao “eu sinto”. O entendimento cedeu espaço ao sentido. Nós não cremos mais. Nós sentimos. A fé deixou de ser compreensão e passou a ser sensação. O “eu” prevaleceu sobre o “Ele”. E o Deus que se revelou para ter sua mensagem compreendida pelos homens se tornou o Deus das sensações. Nada de razão e tudo de sentido. Não ao cognitivo e sim ao sensual. Estamos copiando a cultura do mundo.
O culto sensual, a valorização dos sentidos, a glorificação do eu e o baixo nível de espiritualidade das igrejas têm conexão. Quando os evangélicos surgem na mídia é porque sucedeu algum escândalo. E não adianta culpar a mídia. Se escândalos não acontecerem não serão noticiados. É que os padrões estão baixos. A sensualidade os rebaixa. A ética requer cognição. Se a abolimos e vivemos na sensação não temos ética.
Não estou “viajando”. Estou abismado com a incompreensão de tantos pregadores. O elemento cognitivo e racional da fé tem sido posto de lado. Nem sempre a Palavra é pregada e assim as pessoas não são chamadas ao raciocínio. Elas são chamadas apenas a sentir. O culto é programado para lhes provocar sensações. Elas são vistas como clientes que devem receber o que buscam. Nesta ótica, o púlpito não proclama a Palavra, mas procura fidelizar clientes. Não chegamos ao chulo e ao obsceno, mas fomos empobrecidos. Vejo isto nos cânticos pobres, na pregação pobre que não expõe a Palavra e sim conceitos culturais que afagam o ego dos ouvintes, e no empobrecimento cultural do culto. Tocam-se os instrumentos mais simples, e assim mesmo nos acordes mais fáceis. A cultura secular está empobrecendo e se mediocrizando. A cultura teológica e cúltica também. Estamos descendo e não subindo. Nosso nível está caindo. Não falo de sofisticação, mas da elevação do espírito que a fé cristã sempre proporcionou.
Compreensão não mata. “… Entendes tu o que lês? E ele disse: Como poderei entender, se alguém não me ensinar? E rogou a Filipe que subisse e com ele se assentasse” (Atos 8:30-31). O mundo precisa entender e a igreja precisa saber explicar. A fé vem pelo ouvir, e não pelo sentir: “De sorte que a fé é pelo ouvir, e o ouvir pela palavra de Deus” (Romanos 10:17). Cuidado com o sensualismo. Um pouco de cognoscibilidade nos fará bem. A cultura dos sentidos não é a mais elevada.
Fonte: Isaltino Gomes Coelho Filho