A Adoração

O Culto

por: Antonio Carlos Gonçalves Mataruna

1 – Definições

Definições gerais

Ao efetuarmos a abordagem do culto cristão, precisamos deixar claro o significado das palavras que se relacionam com ele, que são CULTO, LOUVOR e ADORAÇÃO. Consultando os dicionários da língua portuguesa, encontramos os seguintes significados para essas palavras:

Culto

Dicionário Brasileiro Globo – Homenagem que se presta à divindade; adoração; veneração.
Minidicionário Luft – 1. Homenagem de caráter religioso a seres sobrenaturais. 2. Adoração; veneração. 3. A religião em suas manifestações externas; rito.

Louvor

Dicionário Brasileiro Luft – Ato de louvar; elogio; glorificação; apologia.
Minidicionário Luft – 1. Elogio; encômio; aplauso. 2. Exaltação; glorificação

Adoração

Dicionário Brasileiro Globo – Culto a Deus; (fig.) amor profundo; veneração.
Minidicionário Luft – Ato de render culto a (divindade). 2. Amar ao extremo.

Essa definições nos induzem a concluir que, basicamente, culto, louvor e adoração significam a mesma coisa, pois suas definições se confundem. Entretanto alguns estudiosos consideram que existem algumas pequenas diferenças entre essas definições. Diante disso, podemos sintetizar dizendo que CULTO é a cerimônia, o conjunto de atos de LOUVOR, os quais são expressões de apreciação por algo ou alguém, fruto do nosso estado de ADORAÇÃO.

Definições específicas

Em se tratando de adoração cristã, o alvo do culto é a Trindade Divina – Pai, Filho e Espírito Santo. O culto a Deus deve se constituir num estado de espírito permanente na vida daqueles que reconhecem a sua soberania, desde o despertar até o adormecer, buscando a comunhão com ele. O nosso culto pode ter caráter individual ou coletivo, sendo este último caracterizado quando nos reunimos como igreja de Cristo para, em tempo e local pré-determinados, cultuarmos a Deus em conjunto.

Nos textos originais das Sagradas Escrituras encontramos expressões particulares que foram traduzidas para o Português como CULTO, LOUVOR ou ADORAÇÃO. A imagem mais antiga que encontramos no Antigo Testamento, significando culto, é a de curvar-se, colocando o rosto em terra, diante do objeto ou pessoa que estejam sendo cultuados. A palavra hebraica SHACHAH (adorar) representa este ato e foi traduzida, na SEPTUAGINTA, como PROSKUNEIN.

O Espírito de Deus está constantemente ao nosso redor, ou seja, nós estamos imersos nele. Entretanto, somente quando o nosso espírito se abre para ele é que ele entra na nossa vida e faz a sua obra, permeando as fronteiras do nosso eu, fazendo com que haja comunhão entre nós e ele. O culto individual e o culto coletivo são ações em que essa comunhão com Deus pode ser desenvolvida. Entretanto, o culto coletivo é quem nos prepara para o exercício do culto individual.

2 – Origens do Culto

Na Antigüidade remota

Os estudos da Antropologia revelam que o homem, desde os tempos mais remotos, tem revelado uma necessidade natural de cultuar algo ou alguém. Tais revelações têm demonstrado que o homem é religioso por natureza e deve ter algum alvo de culto. A história antiga nos aponta as diversas oportunidades em que o homem tem se envolvido em rituais supersticiosos e sacrifícios dedicados a algo ou a alguém de caráter transcendental. Os povos pagãos se curvavam diante de imagens de madeira ou de pedra, acreditando, com isso, que obteriam benefícios transcendentais ou afastariam maldições, pragas e outros malefícios.

Nos dias de hoje ainda vemos o homem cultivando outras espécies de idolatria pagã, reverenciando possessões, prazeres, poder, suas próprias personalidades ou até mesmo familiares.

No Antigo Testamento

Quando Deus entregou os Dez Mandamentos a Moisés, deixou bem claro o seguinte:

“Não terás outros deuses diante de mim. Não farás para ti imagem de escultura, nem alguma semelhança do que há em cima nos céus, nem em baixo na terra, nem nas águas debaixo da terra. Não te encurvarás a elas nem as servirás; porque eu, o Senhor teu Deus, sou Deus zeloso, que visito a maldade dos pais nos filhos até a terceira e quarta geração daqueles que me aborrecem.” (Êxodo 20.3-5)

Neste texto encontramos as palavras encurvarás e servirás, as quais significam atitude de culto. O serviço como culto, traduzido do grego, significa serviço sacerdotal. Serviço também pode ser tradução de LATREIA, encontrado no texto de Mateus 4.10, quando Jesus rebate a Satanás, dizendo:

“…Vai-te, Satanás, porque está escrito: Ao Senhor teu Deus adorarás e só a ele servirás.

Neste texto, o servirás vem de LATREUSEIS, enquanto que o adorarás vem de PROSKUNESEIS, que é outra palavra grega com significado de culto

3 – O Culto no Cristianismo

A igreja primitiva

Não podemos perder de vista o contexto em que a igreja cristã nasceu. Jesus era judeu, da linhagem de Davi e cresceu recebendo o ensino aplicado na sinagoga. Prova disso é o relato escriturístico que narra a sua circuncisão (Lc 2.21), sua ida ao templo (Lc 2.46)

O Paralelo de Kierkegaard

Søren Asbye Kierkegaard (1813-1855), filósofo e teólogo luterano dinamarquês, em seu livro Purity of Heart is to Will One Thing, traça um paralelo entre o culto cristão e a dramatização teatral. Sua visão é de que, comparativamente, o culto se assemelha a uma dramatização. No culto, o corpo de atores é constituído pela congregação (a igreja), sendo os ministros, o coro, os solistas, os instrumentistas, os declamadores e outros, os “pontos” (de apoio) fora do palco para dar “deixas” para o exercício da adoração coletiva; Deus é o auditório, a platéia, aquele que recebe a performance da adoração (Ver DONALD HUSTAD, Jubilate – A música na igreja, páginas 77 e 165). Em seu livro, anteriormente citado, Kierkegaard faz a seguinte declaração:

No sentido mais enfático, Deus é o crítico freqüentador de teatro, que observa para ver como o texto é declamado, e como ele é ouvido… O orador, portanto, é o ponto, e o ouvinte encontra-se abertamente diante de Deus. O ouvinte, se posso assim dize-lo, é o ator, que verdadeiramente atua diante de Deus.” (The Purity … , página 164 – edição de 1938 – ou página 181 – edição revisada de 1948).

4 – Declarações Contemporâneas

Culto é adoração! Adoração é culto! As duas palavras significam louvor! Sobre isso, Donald Hustad faz a seguinte declaração:

“Alguém disse que nós nos reunimos de manhã para dar uma hora ou duas a Deus, como penhor do fato de que tudo na nossa vida é dele. Esta é a parte humana, mas o culto de adoração é ainda mais: ele é um macrocosmo de toda a história da salvação, dos séculos de auto-revelação de Deus e do seu convite à nossa resposta afirmativa. “ (Jubilate … , página 74)

O pastor Isaltino Gomes Coelho, em seu artigo “A Principal Missão da Igreja”, publicado em O Jornal Batista, edição de 27/7/97 e 2/11/97, no suplemento Notas em Pauta, da AMBB (Associação dos Músicos Batistas do Brasil), declara que o culto à Trindade Divina é a principal finalidade da existência da Igreja Cristã. Desse artigo extraímos a seguinte declaração do autor:

“A principal missão da Igreja, para mim, não é a evangelização, mas a adoração. Se a evangelização fosse a razão de ser da Igreja, fosse sua missão primeira, no céu não haveria Igreja, pois que lá não há perdidos para evangelizar. Mas no céu há e haverá Igreja porque lá há e haverá Deus. Ela existe em função dele e não dos perdidos. (…) Verdade é que Jesus nos deixou um “Ide”, mas antes deste houve um “vinde”. Os discípulos foram chamados a ele.” (Mateus 10.1)

O pastor Isaltino também cita uma declaração do teólogo americano Conner, que em seu livro “O Evangelho da Redenção” editado pela JUERP, na página 228, diz o seguinte:

“A principal obrigação, portanto, de uma igreja não é o evangelismo, nem missões, nem beneficência; é a adoração (…) O Cristianismo moderno em toda a sua extensão tem sido demasiado propenso a subordinar Deus ao homem. Nossas igrejas têm sido modeladas de acordo com o padrão de uma corporação de negócios, organizadas para terem eficiência em seus negócios. A voz de Deus tem se perdido no tumulto da maquinaria e no barulho da organização. A igreja moderna tem vendido a sua alma por causa da eficiência. Vamos à igreja para ouvir uma “pessoa dinâmica” que, do púlpito, antes estimula os seus irmãos a levar ao fim um programa, em vem de ouvir a voz de Deus falando-nos das realidades eternas. Nossos seminários teológicos preparam homens para serem administradores de igreja, em vez de pregadores da Palavra. O ministro moderno dedica-se às reuniões de comissões e aos jantares nas igrejas.”

Em seu livro “Adoração Bíblica” (pp. 105-112), o Dr. Shedd aponta quatro efeitos da adoração, a saber:

  • segurança íntima
  • comunhão íntima da família de Deus
  • busca da santificação
  • desejo crescente do adorador para testemunhar (evangelização)

Ao argumentar sobre esses efeitos, ele cita uma declaração de autor desconhecido, que diz:

“A adoração transforma o adorador na imagem do deus diante do qual ele se curva.”

Com base nessa declaração, o Dr. Shedd lembra os casos daqueles que fazem do dinheiro, da saúde e bem-estar, da família, e outros, o seu deus, e sublinha que quando a adoração é verdadeira e oferecida pelo Espírito ao único Deus, surgem os efeitos citados anteriormente. Então, concluímos que ao expressarmos o nosso reconhecimento pela soberania do nosso criador, ao exaltarmos o seu nome, ao rendermos graças a ele pela sua provisão já recebida por nós anteriormente, recebemos acréscimo de bênçãos através da tranqüilidade que a adoração nos confere e pela intimidade que desenvolvemos paulatinamente ao buscarmos a comunhão com ele. E aí surge o lugar o engajamento na evangelização como efeito produzido por essa adoração. O Mestre primeiro desenvolveu a comunhão com os seus discípulos, depois convidou-os a seguirem-no (Mt 4.19; Mc 1.17; Lc 5.10).


Bibliografia

HAHN, CARL JOSEPH. História do culto protestante no Brasil. São Paulo: ASTE, 1989. 403 p.

HUSTAD, DONALD P. Jubilate – A música na igreja. Tradução de Jubilate! Church music in the evangelical tradition. São Paulo: Edições Vida Nova, 1991. 310 p.

MARTIN, RALPH P. Worship in the early church. Grand Rapids: William B Eerdmans Publishing Company, 1975. 144 p.

MILNE, BRUCE. Estudando as doutrinas da Bíblia. São Paulo: Aliança Bíblica Universitária, 4 e., 1995. 293 p.

MURADAS, ATILANO. Decolando nas asas do louvor. São Paulo: Editora Vida, 1999. 168 p.

SEGLER, FRANKLIN M. Christian Worship: Its theology and practice. Nashville: Broadman Press, 1967. 245 p.

SHEDD, RUSSELL P. Adoração bíblica. São Paulo: Edições Vida Nova, 1991. 170 p.

UNDERHILL, EVELYN Worship. USA: Harper & Brothers, 1937. 350 p.

WHITE, JAMES F. Introdução ao culto cristão. Tradução de Introduction to Christian Worship. São Leopoldo: Sinodal, 1997. 267 p.


Fonte: Publicado originalmente em: http://www.musicanoculto.xpg.com.br

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