A Forma da Adoração

Devemos Adorar a Deus Através da Dança?

por: Ciro Sanches Zibordi

O irmão Daniel Gomes da Silva enviou-me a seguinte pergunta:

“Existem vários versículos indicando que a dança era praticada como um ato de adoração a Deus. Até o homem segundo o coração de Deus dançou. “Louvai-o com o tamborim e a dança” (Salmos 150:4). “Tempo de chorar, e tempo de rir; tempo de prantear, e tempo de dançar” (Eclesiastes 3:4). “E sucedeu que, chegando a arca da aliança do SENHOR à cidade de Davi, Mical, a filha de Saul, olhou de uma janela, e, vendo a Davi dançar e tocar, o desprezou no seu coração” (I Crônicas 15:29). “Então Miriã, a profetisa, a irmã de Arão, tomou o tamboril na sua mão, e todas as mulheres saíram atrás dela com tamboris e com danças” (Êxodo 15:20). Será que o senhor poderia explicar o porquê de a dança não ser uma maneira válida de se adorar a Deus?”

Minha resposta:

Caro irmão Daniel, os mandamentos contidos em Salmos 149:3 e 150:4, ao lado dos episódios envolvendo o extravasamento de alegria espontâneo de Miriã e Davi mediante manifestações corporais, têm sido citados com frequência pelos defensores de todo tipo de dança mundana — até o street dance! — dentro das igrejas. É claro que os Salmos não oferecem fundamentação segura quanto ao que chamam hoje de adoração com dança. Por quê? Porque os seus destinatários originais são os israelitas, e não a Igreja. Além disso, o termo hebraico empregado em ambas as passagens para “dança” também pode ser traduzido por “flauta”.

Digamos que os tais mandamentos dos Salmos citados sejam para os cristãos. Como deveríamos interpretá-los? Para muitos “adoradores”, eles significam: “Louvem o seu nome com street dance”? e “Louvai-o com o adufe e o xaxado”? Outros preferem: “Louvem o seu nome com coreografias” e “Louvai-o com o adufe e o heavy metal”. Agem como se a Bíblia pudesse ser manipulada a bel-prazer, a fim de satisfazer as nossas preferências. Que engano!

Não há dúvida de que os israelitas se alegravam através da dança (Eclesiastes 3:4; Lamentações 5:15). Quando o povo de Israel atravessou milagrosamente pelo meio do Mar Vermelho, houve extravasamento de alegria mediante danças (Êxodo 15:20). A filha de Jefté, sabendo da vitória que Deus concedera a seu pai, recebeu-o com adufes e danças (Juízes 11:34). E Davi ficou tão alegre com o retorno da arca do Senhor que também dançou (II Samuel 6:14).

Mas, como Davi dançou? Valeu-se ele das danças pagãs ou manifestações corporais usadas pelos ímpios do seu tempo? É claro que não! Veja o que ele mesmo afirmou, em Salmos 9:2: “Em ti me alegrarei e saltarei de prazer, cantarei louvores ao teu nome, ó Altíssimo”. Isso que Davi disse se aplica a nós hoje, a despeito de não sermos israelitas e daquele tempo. Podemos, em momentos de extrema alegria, saltar de prazer na presença de Deus. Mas há uma diferença muito grande entre extravasar a alegria interior saltando e dançar freneticamente ao som de funk, axé, samba, forró, etc., não é mesmo?

Fala-se muito de Miriã e das mulheres que saíram atrás dela com tamboris e com danças (Êxodo 15:20-22). Mas as danças que vemos em nosso meio, hoje, assemelham-se muito mais às mencionadas em Êxodo 32:19-20: “E aconteceu que, chegando ele ao arraial e vendo o bezerro e as danças, acendeu-se o furor de Moisés, e arremessou as tábuas das suas mãos, e quebrou-as ao pé do monte, e tomou o bezerro que tinham feito, e queimou-o no fogo, moendo-o até que se tornou em pó; e o espargiu sobre as águas e deu-o a beber aos filhos de Israel”.

Miriã, Davi e outros saltaram num momento de extrema felicidade. É plenamente compreensível o fato de uma pessoa dançar (gr. orcheõ, “saltar com regularidade de movimento”) de alegria, como aconteceu com o ex-coxo que ficava à entrada do Templo, em Jerusalém (Atos 3:8). Entretanto, movimentar-se num momento de grande felicidade não equivale, em hipótese alguma, a dançar sob ritmos eletrizantes. Em todo o Antigo Testamento, não há menção à dança acompanhada de música dentro do Templo.

Não há como negar que Davi dançou, ao recuperar a arca do Senhor (II Samuel 6:16). Mas precisamos responder a algumas perguntas. Primeira: Como ele dançou? Já vimos que a sua dança nada tem a ver com o que vemos hoje dentro das igrejas. Segunda: A dança de Davi é suficiente para abonar todos os tipos de danças mundanas, inclusive as erotizantes? Terceira: O fato de Davi ter dançado, isoladamente, fornece-nos suficiente base para criarmos o ministério da dança? Quarta: O primeiro rei de Israel apoiava esse pretenso ministério?

Sabemos que há diversidade de ministérios (I Coríntios 12:5), porém não nos esqueçamos de que isso alude à maneira multiforme de o Espírito Santo atuar. Essa menção de modo algum apoia todo e qualquer ministério inventado por pessoas que querem fazer prevalecer as suas preferências pessoais. A despeito de a Bíblia não apoiar o chamado ministério da dança, existem grupos chamados de ministérios de dança e coreografia nas igrejas (coreografia é uma forma de dança também!), formados por pessoas sinceras. Mas repito: não há no Novo Testamento nenhuma passagem que apoie a introdução da dança no culto público e coletivo. Isso é uma influência do secularismo, uma palavra mais suave para mundanismo (Romanos 12:1,2; I João 2:15-17; Tiago 4:4).

As danças de Miriã e Davi foram parte da comemoração de uma vitória. Não devem ser vistas como parte integrante de um culto litúrgico — aliás, Davi depois ofereceu um culto a Deus sem dança! Embora o Senhor não tenha rejeitado aqueles gestos e manifestações pessoais, isso não é uma justificativa para se introduzir na casa de Deus ou no culto ao Senhor (independentemente do local) todo tipo de arte ou manifestações corporais do mundo, como coreografias, balé, shows de rap, street dance e bailes como parte da liturgia. Além disso, aquelas danças isoladas não respaldam as chamadas “baladas gospel” e outros modismos da atualidade.

Davi e Asafe organizaram o ministério do louvor apenas com músicos e cantores (I Crôncas 25:1-7). A despeito de terem sido eles os principais artífices da organização primitiva da música cultual, não chamaram para exercer esse importante ofício os dançarinos e os coreógrafos. Se Davi, de fato, era um apoiador da dança como uma forma de louvor a Deus, por que não a introduziu no culto a Deus, no Templo?

Se o Senhor gosta tanto da “nossa dança”, por que Davi, um homem segundo o coração de Deus (que inclusive dançou do lado de fora do Templo), não a incluiu na liturgia dos israelitas? Por que ele e Asafe não acrescentaram danças e coreografias ao culto veterotestamentário? Ora, quem examina as Escrituras, à luz dos contextos histórico, cultural e literário, sabe que a dança de Davi foi um ato único, pessoal, fora do Templo, isolado. Não foi um ato litúrgico, exemplar, inaugural ou profético, como pensam muitos “adoradores”.

Mesmo que Davi tivesse introduzido a dança no culto veterotestamentário — o que não aconteceu, como vimos —, precisaríamos de suficiente fundamentação no Novo Testamento para termos a certeza de que o Senhor se agrada de toda e qualquer coreografia (que é um tipo de dança), de street dance, de baile gospel, etc. Mas não há nas páginas neotestamentárias abono à dança como forma de louvor a Deus (Romanos 15:11; Hebreus 13:15; Tiago 5:13). João não viu nenhuma forma de louvor com dança no Céu (Apocalipse 45), a menos que algum “adorador” queira chamar de coreografia a adoração dos 24 anciãos que se prostraram diante do Senhor!

Na verdade, a dança “evangélica”, que começou, em algumas igrejas, como uma coreografia simples, executada ao som de hinos melódicos, ficou mais complexa, até evoluir para apresentações de balé e shows de hip-hop. Hoje, não há mais limites! Já temos o erotizante funk dentro de algumas igrejas, além coreografias quase idênticas — sem exageros — às performances de Madonna, Britney Spears, Beyoncé e Michael Jackson.


Ciro Sanches Zibordi é pastor na Assembléia de Deus em Cordovil, Rio de Janeiro e articulista. Autor dos livros “Perguntas Intrigantes que os Jovens Costumam Fazer“, “Adolescentes S/A“, “Evangelhos que Paulo Jamais Pregaria” e “Erros que os Pregadores Devem Evitar“, todos editados pela CPAD.


Fonte: Blog do Ciro


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