por: Fábio Lindquist
A História da Antigüidade ocidental começa, geralmente, pelo período greco-romano, também conhecido como Antigüidade Clássica.
No desenvolvimento artístico de diversas civilizações, é quase sempre possível vislumbrar um momento, de maior ou menor duração, que se costuma denominar “clássico”. É a culminância, freqüentemente luminosa, de perfeição formal e integração espiritual.
Nenhuma civilização e nenhum país deu, todavia, a este conceito de clássico, uma contribuição tão decisiva e essencial que aquela dada Grécia, num período relativamente breve, que abarcou, mais ou menos, os séculos V e IV a.C.
O classicismo grego revela, pela primeira vez, uma manifestação artística que se afirma e se difunde unicamente pelo efeito da sua qualidade intrínseca, ou seja, pela eficácia e evidência de seus valores formais e expressivos. É uma arte de exaltação da importância do homem como tal, considerado “a medida de todas as coisas”. Essa arte exprime, portanto, aqueles valores de equilíbrio, harmonia, ordem, proporção e medida, que pertencem à razão humana. É uma arte que, em sua quase totalidade, tem uma destinação pública e religiosa.
Se a individualização dos valores do classicismo grego se reveste de tanta importância, nem por isso sua pesquisa se torna fácil. A arquitetura não tem sequer um monumento íntegro. Todos estão em estado de ruínas, por vezes, de ruína arqueológica que permite reconstruir, idealmente, mas não ver, uma estrutura arquitetônica perdida. (PISCHEL, 1966)
Neste período, a arquitetura assistiu ao nascimento do templo grego. Trata-se da transformação em sentido estrutural e monumental daqueles edifícios mais rudimentares, erigidos anteriormente para dar uma “casa” elementar à divindade.
Inicialmente de madeira, desenvolve-se até chegar aos templos de mármore, solidamente construídos sobre uma plataforma com degraus. De planta retangular, com desenvolvimento predominantemente horizontal, e com cálculo de dimensões e proporções, de modo a contrapor à desordem da natureza a geométrica racionalidade da vontade arquitetônica.
A arquitetura grega é essencialmente monumental. Assim, o templo grego é um espaço mais externo que interno. Seu edifício interno não é feito para acolher e conter grandes massas de fiéis. É um lugar concebido como moradia de um determinado deus, onde é colocada sua estátua. Para os fiéis, o templo é erguido a fim de ser contemplado no seu conjunto, para que subam até ele levando sacrifícios e homenagens; não, porém, para ficarem lá dentro. (PISCHEL, 1966)
Sendo assim, a maior parte das manifestações musicais se davam em lugares abertos, de menores recursos acústicos, como o Agora, a praça do mercado e dos principais edifícios públicos, e a Acropolis, a “cidade alta”, o topo da colina onde ficavam os templos. Os espaços onde a música era executada contando com mais recursos acústicos eram os anfiteatros. Estes eram construídos em encostas, assim dispondo sua arquibancada em um semicírculo íngreme, que amplificava as vozes dos atores, cantores e músicos.
A palavra música vem do grego “mousiki”, que significa “a ciência de compor melodias”. Há uma lenda mitológica que diz que a música ocidental começou com a morte dos deuses conhecidos como Titãs. Depois da derrota destes deuses, foi solicitado a Zeus que se criasse divindades capazes de cantar as vitórias dos Olímpicos. Há também, na mitologia, outros deuses ligados à história da música, como Museu, que quando tocava chegava a curar doenças; Orfeu, que era cantor, músico e poeta; Anfião, que depois de ganhar uma lira de Hermes, passou a se dedicar inteiramente à música.
Assim como da arquitetura grega clássica só nos restam ruínas, da produção musical grega só nos restaram raros fragmentos, em alguns papiros e em capitéis de colunas de mármore. Mas, se de músicas propriamente ditas não temos quase nada, o mesmo não se pode dizer da teoria musical. Inúmeros tratados sobre música escritos em grego, e cópias em árabe e latim, sobreviveram.
Uma das primeiras explicações formais sobre a natureza da arte musical reveste-se de caráter fantástico: é a ideia pitagórica segundo a qual o universo se constituiria de sete esferas cristalinas que emitem em seu movimento concêntrico as respectivas notas da escala musical em perfeita harmonia.
A teoria musical tem como objetivo a elaboração de um conjunto de disciplinas e interpretações gerais sobre os elementos e estruturas musicais. Pitágoras foi quem desenvolveu matematicamente os intervalos entre as notas musicais, demonstrando as proporções numéricas das escalas musicas.
Os gregos utilizavam duas formas primitivas de notação musical: uma instrumental, composta de quinze símbolos distintos, possivelmente derivados de algum alfabeto arcaico; e um vocal, baseado nas 24 letras do alfabeto jônico. A notação com letras e todos os padrões harmônicos, escalas e outros aspectos musicais influenciaram toda a produção musical do Ocidente (de do Oriente Médio) até o fim do sistema modal, no século XVII.
Uns dos maiores legados da cultura grega é sua literatura. A literatura grega é a mais antiga da Europa, e desde suas origens está associada à música, ao teatro e também à dança. Do Período Helenístico em diante, entretanto, estabeleceu-se uma certa independência entre a música e a literatura.
Poesia Épica: poesias que narravam feitos heróicos, geralmente se baseavam em fatos históricos, misturados a lendas e personagens mitológicos. Composições deste tipo, em versos, foram criadas antes da invenção da escrita e conservadas graças à memória de incontáveis gerações de poetas-cantores, os aedos. É bom esclarecer que a poesia grega não era parecida com o que hoje conhecemos por “poesia”. Não havia rimas, e sim uma estruturação do verso em sílabas longas e curtas, de tal modo que a declamação adquiria um ritmo e uma musicalidade muito própria à língua grega. E os versos eram sempre acompanhados de música.
Poesia Lírica: durante o período Arcaico, época de grande efervescência cultural, a poesia, a música e a dança tornaram-se ainda mais estreitamente ligadas, mas a temática já era outra. Os poetas praticamente abandonaram os longos temas épicos e heróicos, e preferiram criar obras mais curtas, pessoais e emotivas. Era muito apreciada, também, poesias compostas para ocasiões cívicas, como festivais religiosos e disputas esportivas. O qualitativo lírica, usado até hoje, refere-se ao fato de estes poemas terem sidos usualmente apresentados com o acompanhamento da lira. Usava-se muito também a palavra ode, que significa simplesmente canto, em relação a qualquer forma de poesia lírica. Havia a “lírica monódica”, em que o poeta declamava sua poesia, e a “lírica coral”, em que a composição era apresentada por um coro.
Tragédia e comédia: a tragédia evoluiu, aparentemente, a partir dos ditirambos, cantos corais apresentados nos festivais em honra ao deus Dionísio. Em algum momento do VI a.C. um dos componentes do coro passou a declamar, numa espécie de conversa com o restante do coro, e quando um segundo membro passou a dialogar com o primeiro, e ambos com o coro, surgiu a ação dramática, cerne da tragédia grega. As tragédias florescera na Atenas do século V a.C., após as guerras greco-pérsicas. Eram apresentadas nos concursos dramáticos dos festivais da cidade: as Lenéias (janeiro), as Dionísias Urbanas (março e abril), e as Dionísias Rurais (dezembro). As apresentações aconteciam em teatros semicirculares, e dois ou três atores masculinos com máscaras faziam todos os papéis principais. O tamanho do coro, que cantava, dançava e dialogava com os atores durante a peça, variou conforme a época. A comédia também se originou nas festas populares em honra ao deus Dionísio. Na ocasião, os camponeses dos cortejos se apresentavam bêbados de vinho, e diziam impropérios e palavrões em voz alta, para atrair boas colheitas. Em Atenas os concursos de comédias começaram mais tarde que os de tragédia, por volta do ano 486 a.C. Os coros usavam em geral roupas que lembravam animais, e os atores tentavam despertar o riso com barrigas e falos postiços. Eram também usuais os trocadilhos, paródias e cenas burlescas de vários tipos.
Os gregos tinham uma ideia antropocêntrica da vida, e mesmo seus deuses eram humanamente concebidos de uma forma infalível. Mas, talvez sua idealização das características humanas tenha contribuído para o desenvolvimento de dos famosos arquétipos dionisiano e apoloniano. Os gregos da Antigüidade viram uma ligação entre estilos de expressão musical e impulsos contrastantes da vida incorporados na distinção dionisiana/apoloniana.
Havia assim uma música cujo efeito era de tranqüilidade e elevação e a música que tinha como objetivo produzir agitação e entusiasmo. A primeira estava associada com a adoração de Apolo, celebrado em tranqüilidade e ordem; o instrumento usado era a lira e suas formas poéticas a ode e o épico. A segunda estava associada com a adoração de Dionísio, celebrado com vinho e embriaguez; o instrumento era o aulos e suas formas poéticas o dithyramb e o drama. A música era usada para incitar paixões e até mesmo promover o hedonismo. (STEFANI,2002)
O último momento da arte grega é o período helenístico. Inicia-se antes do fim do século IV a.C., mas é difícil indicar o ponto final desse momento. Do ponto de vista artístico, o período não se fecha com a conquista política da Grécia por Roma; aliás, essa conquista conduz à admiração dos romanos para a cultura e arte grega, bem como a transferência, para Roma, de mestres e artesãos gregos. Assim ocorrem as infiltrações helenísticas na arte romana. (PISCHEL, 1966)
Não é paradoxo afirmar que a maior construção dos romanos foi seu Estado. Através dos diversos regimes da monarquia, da república e do império, passa de modesta liga de povos rurais, para a força que unificou toda a Itália, até tornar-se a potência que dominou todo o Mediterrâneo, depois conquistando a Europa, a Ásia e a África. Nesse território Roma instaurará – a todos fazendo cidadãos romanos – a sua civilização, fundada sobre o critério do Direito e sobre singulares inter-relações da autoridade e democracia.
Não admira, pois, que tal mundo revela em todos os setores, e também na arte, um cunho praticista. Estradas pavimentadas para o exército; pontes sólidas de alvenaria; aquedutos em arcos, que de longe transporta água para as cidades. Tudo isso faz parte da precoce arquitetura romana. Seu próprio teor monumental, procurando a grandiosidade como símbolo de potência e se orientando mais pela solidez imponente do que para a elegância e graça, será caracterizada pela preocupação relativa às exigências das grandes massas populares: foros, termas, teatros, circos.
Para o estudo da arte romana e importante identificar as diversas contribuições proporcionadas pelas civilizações pré-romanas. O território itálico, saindo da Idade do Bronze, não experimentou unidade política, e portanto, não expressou unidade artística. A característica de sua produção de arte pode ser reconhecida pelas diferenças de níveis qualitativos e pela variedade de manifestações. As principais influências foram primeiramente os etruscos, e posteriormente os gregos.
Quando no século VIII a.C., Roma inicia sua vida histórica, adota em sua forma urbana a solução etrusca de cidade murada, com portas de acesso, ruas em retícula e casa de planta elíptica. Num período republicano mais avançado, Roma passa, na construção de seus templos, das receitas etruscas aos módulos gregos. A própria Roma se refaz, então, com exemplos urbanos helênicos, abrindo pórticos nas alas laterais de suas praças, e edifícios monumentais.
Com a expansão da civilização romana no período imperial, Roma se torna hiper-populosa. Para seus governantes, deve representar o mais vasto império do mundo, deve tornar-se o centro esplêndido de semelhante domínio. Aqui se exprimiria o melhor da cultura; aqui a arte será entendida como recurso de exaltação a potência do Império. As grandes soluções urbanísticas e as grandes construções darão, entre outras coisas, trabalho a grandes massas de proletários.
Utilizando as ordens arquitetônicas gregas de maneira mais livre, a arquitetura romana se enche aos poucos de originalidade. Prédios curvos e dinâmicos, em oposição à solução retilínea e estática da arquitetura grega. (PISCHEL, 1966)
Musicalmente, ocorreu o mesmo que com as demais artes romanas. A música grega foi incorporada, somada às influências de outros povos dominados pelo império romano. Estava principalmente ligada aos eventos públicos, como reuniões e festividades religiosas; eventos esportivos e lutas de gladiadores; eventos cívicos, militares e festividades dos imperadores em seus palácios; acompanhamento para teatros, dança e poesia.
A grande arrancada artística se dá na renovação monumental de Roma, após o incêndio de Nero, no primeiro século da Era Cristã. A obra arquitetônica mais conhecida da época é o Coliseu. Nenhuma outra obra desta época alcança, em Roma, tamanho equilíbrio estético.
No século II, a arquitetura nos revela domínio do espaço real em construções isoladas, e domínio da ficção espacial na relação entre forma arquitetônica e espaço urbano.
O século III reflete, em todas as soluções artísticas romanas a ânsia de manifestações destinadas a surpreender por sua magnificência.
Quando irrompe o Cristianismo, no século IV, Roma já concluíra sua parábola artística.(PISCHEL, 1966)
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