por: Dr. Robert Godfrey
Primeiro – Guerras da Adoração
Você pode ter ouvido a história de dois homens debatendo assuntos de adoração. Eles tinham ideias totalmente diferentes sobre o assunto e eram incapazes de persuadir um ao outro. No final da discussão frustrante, um dos homens disse ao outro: “Bem, você adora a Deus do seu jeito, e eu O adorarei do jeito dEle”.
Você pode rir deste comentário, mas precisamos lembrar de quão variadas são as formas de adoração que as igrejas têm praticado e quão veementes debates sobre adoração têm existido. O debate sobre o uso de imagens no século XVIII e XIX levou à violência na igreja Oriental. Diferenças sobre adoração no século XVI faziam parte do que dividia o Cristianismo Protestante do Católico Romano, uma divisão que continua em nossos dias.
Entre os protestantes contemporâneos encontramos diferenças significativas na adoração. Algumas formas de adoração são cheias de cerimônias e rituais formais, enquanto outras são muito casuais e informais. Algumas são barulhentas e turbulentas, enquanto outras são quietas e contemplativas. Algumas acontecem em belas catedrais, enquanto outras em armazéns ou campos. No meio de tal diversidade, os cristãos, algumas vezes, perguntam se a adoração é simplesmente uma questão de gosto. Todas as formas de adoração agradam igualmente a Deus, desde que os adoradores sejam sinceros? Ou algumas formas de adoração são aceitáveis e outras não?
A questão do que agrada a Deus na adoração chega com urgência especial em nossos dias, visto que nas últimas poucas décadas os protestantes americanos têm visto muitas mudanças nas formas de adoração, mais do que em qualquer período similar desde o século XVI. O resultado é que algumas congregações e denominações têm experimentado sérios conflitos sobre adoração. Igrejas têm se dividido e indivíduos têm se mudado de congregação para congregação, tudo por causa de visões diferentes de adoração.
Algumas das diferenças sobre adoração parecem mais superficiais, embora elas possam gerar debates esquentados.
- Devemos usar um livro de cânticos ou um projetor no alto?
- Devemos nos sentar em bancos ou em cadeiras dobráveis?
Diferenças mais sérias têm levado ao que alguns têm chamado de “guerras da adoração” dos nossos dias.
- Que estilo de música devemos usar?
- Que tipo de instrumentos devemos tocar?
- Como devemos orar?
- Que tipo de pregação é apropriada?
Freqüentemente estas diferenças residem na questão de que se os cultos devem ser orientados para o visitante não-membro da igreja ou para o membro fiel da igreja.
As diferenças sobre adoração podem também refletir teologias e metodologias totalmente diferentes na comunidade cristã. Por esta razão, a Aliança de Evangélicos Confessionais referiu-se ao assunto de adoração em sua Declaração de Cambridge. A Declaração declarou como sua preocupação básica o seguinte: “As igrejas evangélicas de hoje estão cada vez mais dominadas pelo espírito deste século em vez de pelo Espírito de Cristo. Como evangélicos, nós nos convocamos a nos arrepender desse pecado e a recuperar a fé cristã histórica”.
A Declaração então expandiu sobre esta preocupação em relação aos grandes temas do Protestantismo.
Segundo – A Necessidade da Verdadeira Adoração
Todos cristãos precisam cultivar com Deus uma vida que esteja em crescimento e desenvolvimento. Se não estivermos crescendo, estagnaremos ou morreremos. A adoração coorporativa, oficial, do povo de Deus é um meio crucial e essencial que Deus deu para nos ajudar a crescer. Pense sobre as palavras de Hebreus 10:19-22:
Tendo pois, irmãos, ousadia para entrarmos no santíssimo lugar, pelo sangue de Jesus, pelo novo e vivo caminho que ele nos inaugurou, através do véu, isto é, da sua carne, e tendo um grande sacerdote sobre a casa de Deus, cheguemo-nos com verdadeiro coração, em inteira certeza de fé; tendo o coração purificado da má consciência, e o corpo lavado com água limpa.
Esta passagem chama os cristãos para se achegarem a Deus através de Cristo, visto que, mesmo como cristãos, experimentamos uma distância entre nós mesmos e Deus, que somente a obra de Cristo pode superar. Precisamos nos achegar a Ele pessoalmente e individualmente em devoção, meditação e oração; mas também precisamos nos achegar a Ele, encontrando-O na comunhão do Seu povo, onde Deus promete estar especialmente presente (Mateus 18:20). Nos encontramos com Deus quando o povo de Deus se reúne junto, ora junto, canta junto, e ouve a Sua palavra junto.
O Cristianismo é uma religião na qual indivíduos se tornam uma parte integral do corpo de Cristo. Não somos simplesmente uma associação de indivíduos, mas estamos organicamente unidos uns aos outros (I Coríntios 12:12-27; Efésios 1:22-23). Expressamos que somos o corpo de Cristo, especialmente quando encontramos a Deus juntos em adoração pública.
Adorando Falsos Deuses
João Calvino chamou, de maneira apropriada, o coração humano de “uma fábrica de idolatria”, querendo dizer que a adoração fiel não acontece naturalmente nos seres humanos caídos. Pecadores se tornam idólatras porque Deus plantou tão profundamente a necessidade dEle mesmo nos corações humanos, que quando não conhecemos ao Deus verdadeiro, inventamos falsos deuses, falsa religião e falsa adoração. Deus adverte contra tal adoração idólatra no primeiro mandamento: “Não terás outros deuses diante de mim”. A adoração idólatra de falsos deuses é condenada por toda a Bíblia.
Adorando o Deus Verdadeiro Falsificadamente
Precisamos ouvir o convite da Escritura para promover a adoração santa e fugir da idolatria. Mas a adoração de falsos deuses não é somente o único tipo de idolatria condenada na Bíblia. O segundo mandamento nos ensina que a idolatria não é somente uma questão de adorar falsos deuses, que é proibido no primeiro mandamento. É também uma questão de adorar o verdadeiro Deus falsamente. O segundo mandamento diz, “Não farás para ti imagem de escultura, nem alguma semelhança do que há em cima nos céus, nem em baixo na terra, nem nas águas debaixo da terra. Não farás para ti imagem de escultura, nem alguma semelhança do que há em cima nos céus, nem em baixo na terra, nem nas águas debaixo da terra. E faço misericórdia a milhares dos que me amam e aos que guardam os meus mandamentos” (Êxodo 20:4-6).
Este mandamento claramente proíbe o uso de imagens de Deus na adoração, mas também implicitamente proíbe toda invenção humana na adoração. A proibição contra imagens significa que devemos adorar o verdadeiro Deus somente nas formas que Lhe agrada. O povo de Israel reivindicou que estava adorando o Senhor como o verdadeiro Deus quando fabricou o bezerro de ouro. Eles consideravam a imagem como Jeová (Êxodo 32:5-6). Mas tal falsa adoração ofendeu a Deus e trouxe julgamento sobre o povo.
A história do bezerro de ouro nos lembra que o próprio povo de Deus pode cair em idolatria em sua adoração dEle. Podemos querer ser criativos e originais na adoração, mas essa criatividade pode conduzir à idolatria. Repetidamente no Antigo Testamento, Deus julgou Seu povo por causa de falsa adoração. Os filhos de Aarão, Nadabe e Abiú, foram fulminados e caíram mortos, por causa de oferecer “fogo não autorizado perante o SENHOR, contrário ao seu mandamento” (Levítico 10:1). Jeroboão, o primeiro rei do reino norte de Israel, e seus herdeiros foram consistentemente criticados como idólatras por causa das imagens e dos falsos templos e cultos dedicados ao Senhor. O povo de Deus foi censurado nestas ocasiões, não porque adoraram falsos deuses, mas porque adoraram o verdadeiro Deus falsamente.
O Novo Testamento também adverte contra agradar a nós mesmos com a falsa adoração. Paulo escreveu ao Colossenses condenando suas novidades e experiências como “adoração auto-imposta” (Colossenses 2:23). Jesus advertiu contra permitir que tradições dominem e subvertam a Palavra de Deus: “E assim por causa da vossa tradição invalidastes a palavra de Deus” (Mateus 15:6). Jesus não estava falando sobre adoração quando fez esta declaração, mas então Ele usou Isaías 29:13, que é sobre adoração, para confirmar Suas palavras:
Este povo honra-me com os lábios; o seu coração, porém, está longe de mim.
Mas em vão me adoram,
ensinando doutrinas
que são preceitos de homem. (vv. 8-9)
Ele estava dizendo que o nosso culto a Deus, seja na vida em geral ou na adoração coorporativa, não deve ser determinada pela tradição, mas deve seguir o ensinamento de Deus na Bíblia.
Paulo especificamente advertiu os Coríntios contra a falsa adoração na forma como estava administrando a Ceia do Senhor. Os pecados e os erros que infectavam sua adoração levaram Paulo a acusá-los de destruir este sacramento: “De sorte que, quando vos ajuntais num lugar, não é para comer a ceia do Senhor” (I Coríntios 11:20). De fato, Deus se preocupa tanto sobre a adoração que Paulo registra que Deus visitou os Coríntios com julgamento por causa dos seus abusos na adoração, relacionados a este sacramento: “Por causa disto há entre vós muitos fracos e enfermos, e muitos que dormem”.
A Bíblia nos lembra que nem nossos instintos, nem nossas tradições e nem nossas experiências são guias confiáveis para a adoração. A própria Bíblia é nosso único guia confiável. Uma das ironias do nosso tempo é que muitos cristãos que afirmam a inerrância da Bíblia não a estudam realmente para descobrir o que ela diz sobre adoração. Devemos examinar as Escrituras para encontrar a vontade de Deus para nos guiar em nossa adoração. A Declaração de Cambridge faz a seguinte declaração: “Somente a Bíblia ensina o que é necessário para nossa salvação do pecado e qual é o padrão pelo qual todo comportamento cristão deve ser medido”.
Terceiro – O Caráter da Adoração
Para aprender como adorar a Deus duma forma que agradará a Deus, ao invés de ofendê-Lo e ser julgado por Ele, devemos começar entendendo a definição da Bíblia do que é adoração. A Bíblia usa a palavra adoração em pelo menos três formas importantes.
Adoração Pessoal e Corporativa
Primeiro, adoração pode se referir a toda vida do cristão. Devemos viver nossas vidas para Deus e sob Deus. Devemos procurar que tudo o que façamos seja um serviço de amor para com Ele. Paulo tinha este senso de adoração em mente quando escreveu no começo da seção de aplicação do livro de Romanos, “Rogo-vos pois, irmãos, pela compaixão de Deus, que apresenteis os vossos corpos como um sacrifício vivo, santo e agradável a Deus, que é o vosso culto racional. E não vos conformeis a este mundo, mas transformai-vos pela renovação da vossa mente” (Romanos 12:1-2). Nestes versos, toda a vida é considerada como adoração.
Segundo, a adoração pode se referir àqueles tempos pessoais de oração, louvor, reflexão ou leitura da Bíblia, quando nos focamos em Deus. Davi adorava a Deus enquanto orava e cantava sozinho de noite:
No meu leito me lembro de ti; medito em ti nas vigílias da noite.
Pois tu tens sido o meu auxílio; de júbilo canto à sombra das tuas asas. (Salmos 63:6-7).
Em terceiro, a adoração pode se referir ao tempo quando os cristãos se reúnem oficialmente, como uma congregação, para louvar a Deus. Esta forma de adoração é recomendada e ordenada nas Escrituras. “Não deixemos de reunir-nos, como é costume de alguns, antes admoestando-nos uns aos outros; e tanto mais, quanto vedes que se vai aproximando aquele Dia” (Hebreus 10:25). O Salmista celebra este privilégio da adoração corporativa:
Louvai ao SENHOR.
Louvarei ao SENHOR de todo o meu coração,
na assembléia dos justos
e na congregação. (Salmos 111:1)
Claramente Deus quer que Seu povo se reúna como congregações, expressando que eles são o corpo de Cristo, adorando-O conjuntamente.
Este terceiro uso da adoração, a adoração corporativa, merece atenção especial por duas razões. Primeiro, a arena da adoração corporativa é onde a maior parte da guerra da adoração está sendo travada. Mudanças na adoração corporativa precisam de examinação cuidadosa em nosso tempo.
Segundo, muitos cristãos parecem ter uma medida de preconceito contra a adoração corporativa como uma prioridade nas vidas dos crentes. Parecem crer que a adoração oficial da igreja não é muito importante. Acham-na muito formal e impessoal. Sentem que os tempos individuais de oração e leitura da Bíblia, ou as experiências de pequenos grupos, são muito mais importantes no cultivo de uma proximidade com Deus do que a adoração corporativa. Algumas das recentes mudanças na adoração corporativa refletem um esforço para fazê-la mais parecida com a atividade de um pequeno grupo. Contudo, à medida que examinarmos o ensinamento da Bíblia sobre a adoração e o seu conteúdo, veremos que a adoração corporativa é vitalmente importante para todo cristão obediente e em crescimento.
Um Texto Crítico: Hebreus 12:28-29
O livro de Hebreus é particularmente importante aqui, pois mostra a relação entre a adoração do Antigo Testamento e a adoração do Novo Testamento, e também porque chama atenção à unidade da nossa adoração como povo neo-testamentário de Deus. Hebreus 12:28-29 declara:
Pelo que, recebendo nós um reino que não pode ser abalado, retenhamos a graça, pela qual sirvamos a Deus agradavelmente, com reverência e temor; pois o nosso Deus é um fogo consumidor.
Esta passagem nos direciona a dois elementos chaves para o nosso pensamento sobre adoração: primeiro, o caráter de Deus como o objeto de nossa adoração, e segundo, nossa resposta a Deus na adoração.
1. O Caráter de Deus. A primeira verdade sobre a natureza de Deus que precisamos sempre lembrar na adoração é que o nosso Deus é uma Trindade. O único Deus existe eternamente em três pessoas – Pai, Filho e Espírito Santo. Este aspecto da natureza de Deus não está explícito em Hebreus 12:28-29, mas está assinalado no contexto imediato. Assim, Hebreus 12:23-24 nos lembra que na adoração, nos chegamos pela fé ao Deus vivo e a Jesus, que é “o mediador dum novo concerto”. Aqui, duas das pessoas da Trindade são distinguidas.
Como nosso Deus é triuno, assim, nossa adoração deve ser trinitariana. Deus em Sua unidade é um objeto apropriado de adoração, mas assim são também cada uma das pessoas da Deidade. Nós adoramos a Deus, e também adoramos o Pai, o Filho, e o Espírito Santo. Ao adorar qualquer uma das pessoas divinas, estamos adorando toda a Deidade, pois Deus é um.
Nossa adoração pode se focar em qualquer uma das pessoas divinas, em pontos particulares, pois a própria Bíblia nos mostra que cada uma das pessoas da Trindade está associada com certos atos divinos particularmente. Por exemplo, na Bíblia o Pai está particularmente ligado ao planejamento da salvação, para reconciliar os pecadores consigo mesmo. O Filho está ligado à realização da salvação, como o Deus-Homem, vivendo, morrendo e ressuscitando no lugar de pecadores. O Espírito está ligado à aplicação da salvação, trazendo pecadores a Cristo, e dando-lhes fé e vida nova.
A adoração cristã reflete a ênfase da Bíblia sobre a obra de cada pessoa na Deidade. O Pai é particularmente o objeto da nossa adoração. Freqüentemente oramos, como Jesus nos ensinou, “Pai Nosso”. O Filho é o mediador da nossa adoração. Jesus abriu o caminho ao Pai para nós, pela Sua obra salvadora, e nós sempre nos achegamos ao Pai em Seu nome. O Espírito capacita e abençoa nossa adoração. Ele aquece os nossos corações, e nos traz, não para Si mesmo, mas a Jesus e à Sua Palavra. A própria natureza de Deus nos conduz a adorar o Pai, através do Filho, pelo Espírito Santo.
O segundo aspecto do caráter de Deus que vemos explícito em Hebreus 12:28-29 é que Deus é um Deus salvador. Ele preparou um reino inabalável de vida eterna para aqueles que Lhe pertencem. Este reino pertence a Jesus Cristo (Hebreus 1:8), que é o Salvador do Seu povo e o Mediador entre o homem e Deus em toda nossa adoração. Jesus e Seu Evangelho devem sempre permanecer no cerne da nossa adoração. Devemos lembrar que Ele é a eterna segunda pessoa da Trindade, feito homem para ser nosso Salvador. Devemos regozijar em Sua vida perfeita de obediência por nós, em Sua morte na cruz, onde Ele carregou todos nossos pecados, e em Sua gloriosa ressurreição para ser nosso eterno Salvador e Sumo Sacerdote. A adoração falha completamente se Jesus Cristo não estiver no centro. Sua pessoa e obra devem iluminar a adoração do Seu povo. Ele faz Deus completamente conhecido e completamente acessível a nós. Ele é nosso refúgio e fortaleza, um socorro bem presente na hora da angústia (Salmos 46:1). Ele nos salva dos nossos pecados, e nossa adoração devem celebrá-Lo.
O terceiro aspecto do caráter de Deus que vemos em Hebreus 12 é que Deus é um Deus santo, um que é zeloso por Sua adoração. Ele é um Deus que declara Sua oposição ao pecado e que exige um viver santo entre o Seu povo. Hebreus está citando Deuteronômio 4, quando declara que Deus é “um fogo consumidor”. Deuteronômio 4 chama o povo de Deus à fidelidade na totalidade de suas vidas, mas especialmente na adoração:
“Guardai-vos de que vos esqueçais do pacto do SENHOR vosso Deus, que ele fez convosco, e não façais para vós nenhuma imagem esculpida, semelhança de alguma coisa que o SENHOR vosso Deus vos proibiu. Porque o Senhor vosso Deus é um fogo consumidor, um Deus zeloso” (vv. 23-24).
Esta passagem em Deuteronômio claramente descansa sobre o segundo dos Dez Mandamentos, que proíbe a falsa adoração, como temos visto. O caráter santo de Deus deve ecoar tão claramente através da nossa adoração, quanto o caráter salvador de Deus.
Estas passagens mostram que o Senhor considera Sua adoração muito seriamente. Elas nos mostram mui especificamente que nossa adoração deve refletir tanto a grande obra salvadora de Deus em Cristo como Seu santo zelo pela pureza da adoração. Somente tal adoração será aceitável a Ele. Quando Hebreus 12:28 fala de adoração aceitável, ele quer dizer adoração que é primeiramente aceitável a Deus.
Esta prioridade precisa ser reafirmada especialmente hoje. Freqüentemente hoje, quando as pessoas falam de adoração aceitável, querem dizer adoração que é aceitável a elas mesmas ou, talvez, aceitável especialmente àqueles que não são membros da igreja. Embora a adoração deva falar claramente à congregação reunida, a Bíblia insiste que a adoração deve, acima de tudo, ser aceitável a Deus. E nós devemos lembrar que só podemos saber o que é aceitável a Deus através de um estudo cuidadoso da Sua Palavra.
2. Nossa Resposta a Deus. Como devemos responder na adoração a este Deus santo e salvador? Hebreus 12 não somente especifica o caráter de Deus para nós na adoração, mas também clarifica o caráter de nossa resposta a Deus: nossa adoração deve ser caracterizada por gratidão e temor. Especialmente em reação à obra salvadora de Deus, devemos ser gratos e cheios de alegria. Os Salmos freqüentemente expressam esta resposta:
Cantai alegremente a Deus, nossa fortaleza; erguei alegres vozes ao Deus de Jacó! (Salmos 81:1)
Vinde, cantemos alegremente ao Senhor, cantemos com júbilo à rocha da nossa salvação. Apresentemo-nos diante dele com ações de graças, e celebremo-lo com salmos de louvor. (Salmos 95:1-2)
Servi ao SENHOR com alegria, e apresentai-vos a ele com cântico. (Salmos 100:2)
Pois me alegraste, SENHOR, pelos teus feitos; exultarei nas obras das tuas mãos. (Salmos 92:4)
Nossa resposta a Deus deve ser uma resposta de grande alegria e satisfação pela obra salvadora de Jesus. A gratidão deve se manifestar em muitas partes do culto de adoração. Os Salmos nos lembram que a música é um dos modos-chave pelo qual expressamos nossa alegria e gratidão a Deus. (Examinaremos de uma maneira mais completa a música na adoração mais adiante em nosso estudo). Outras manifestações de gratidão incluem oração e resposta sincera à Palavra pregada.
Em resposta particularmente à santidade de Deus, experimentamos temor e reverência diante dEle. Os Salmos também nos mostram esta reação:
Adorai ao SENHOR na beleza da santidade; tremei diante dele toda a terra. (Salmos 96:9)
O SENHOR reina, tremam os povos; ele está entronizado sobre os querubins, estremeça a terra. O SENHOR é grande em Sião, e exaltado acima de todos os povos. Louvem o teu nome, grande e tremendo; pois é santo. És Rei poderoso que amas a justiça; estabeleces a eqüidade, executas juízo e justiça em Jacó. És Rei poderoso que amas a justiça; estabeleces a eqüidade, executas juízo e justiça em Jacó. (Salmos 99:1-5)
Também deve haver, na adoração, uma reflexão séria e sóbria. À medida que nos encontramos com o Deus que criou o céu e a terra, que deu a Lei no Monte Sinai, e que visitou Sua ira contra o pecado em Seu Filho no Calvário, devemos ser cheios de reverente temor. Deveríamos ficar literal e totalmente aterrorizados quando chegamos à presença Deus na adoração. A reverência real nunca é pesada ou tediosa, mas é profunda e emocionante.
Hoje estas duas respostas, alegria e reverência, são freqüentemente colocadas em oposição uma à outra. Um tipo de adoração é chamado alegre, exultante, e exuberante, enquanto outro tipo é chamado reverente, solene e respeitoso. Contudo, nas Escrituras, alegria e reverência não são antitéticas, mas sempre complementárias. A adoração pode ser alegremente reverente e reverentemente alegre. Alegria e reverência sempre devem estar unidas em nossa adoração.
Servi ao SENHOR com temor, e regozijai-vos com tremor. (Salmos 2:11)
O SENHOR reina, regozije-se a terra; alegrem-se as numerosas ilhas. Nuvens e escuridão estão ao redor dele; justiça e eqüidade são a base do seu trono. Adiante dele vai um fogo que abrasa os seus inimigos em redor. Os seus relâmpagos alumiam o mundo; a terra os vê e treme… Sião ouve e se alegra, e regozijam-se as filhas de Judá por causa dos teus juízos, SENHOR. (Salmos 97:1-4,8)
Enviou ao seu povo a redenção; ordenou para sempre o seu pacto; santo e tremendo é o seu nome. (Salmos 111:9)
Esta combinação de alegria e temor nem sempre podem ser fáceis de alcançar, mas ela deve ser nosso objetivo. Devemos lembrar que reverência nem sempre significa quietude, e alegria nem sempre significa barulho. Alegria e reverência são as primeiras de todas as atitudes do coração pelas quais procuramos expressões apropriadas na adoração. A alegria pode ser intensa no cântico de uma música muito serena. A reverência pode ser expressa num cântico barulhento.
A adoração protestante tradicional tem provavelmente sido forte na reverência, e o que tem sido chamado “adoração contemporânea”, freqüentemente parece entusiasticamente alegre. Mas, proponentes de cada aproximação devem perguntar se suas visões alcançam um equilíbrio bíblico. A adoração tradicional pode proceder tão mecanicamente e formalisticamente que a emoção parece ausente. A adoração contemporânea pode ser tão insistente sobre a alegria e o excitamento que a reverência e a reflexão podem ser perdidas.
À medida que procuramos o equilíbrio, devemos começar lembrando que a adoração corporativa é um encontro com o nosso Deus, que é um “fogo consumidor”; e para isto acontecer, devemos conhecer a vontade de Deus com respeito a como devemos adorar. Este conhecimento vem somente através do conhecimento da Sua Palavra.
Quarto – Adoração e a Palavra
As igrejas da Reforma (e também, numa extensão significativa, as igrejas antes da Reforma) não somente procuravam ter a Bíblia como guia de sua adoração, mas também procuravam encher a adoração com a Palavra de Deus. Isto porque a Palavra não somente nos instrui, mas é também o meio através do qual nos achegamos a Deus. Conhecemos, servimos e adoramos a Deus através da Sua Palavra. Ela é também “um lâmpada para os meus pés e luz para o meu caminho” (Salmos 119:105) na adoração.
Como a Palavra deve estar presente e encher nossa adoração? Como a Bíblia mostra, a Palavra está presente de diversas formas.
Lendo a Palavra de Deus
A forma mais óbvia é a leitura da Palavra. Esta Palavra deve ser uma parte distinta e central da adoração. Paulo escreveu a Timóteo, “aplica-te à leitura, à exortação, e ao ensino” (I Timóteo 4:13). Aqui, à leitura da Bíblia é dada uma importância que é coordenativa à pregação e ao ensino. Muitas igrejas hoje parecem contentes com a leitura de, no máximo, somente uns poucos versos da Bíblia. Nos tempos passados, seções significativas de diversas partes da Bíblia eram lidas nos cultos de adoração. No tempo dos Puritanos, diversos capítulos eram usualmente lidos em cada culto.
A Bíblia não estabelece nenhuma regra com respeito a quanto da Escritura deve ser lida em qualquer culto de adoração, mas, realmente amamos a Palavra de Deus, se estamos contentes em ouvir continuamente somente um ou dois versos?
Orando com a Palavra de Deus
A Palavra deve também encher as nossas orações. As maiores orações da igreja são ricas em linguagens da própria Bíblia, oferecendo a Palavra de Deus de volta a Ele, em oração. As palavras da Bíblia devem informar nossas orações com a verdade de Deus, as promessas de Deus, e as bênçãos de Deus sobre o Seu povo.
Hoje, muito do que se passa na oração em nossas igrejas é mero discurso repetitivo e superficial, por querer soar informal e casual. E freqüentemente a oração torna-se somente uma lista de petições a Deus. Ainda pior, em algumas igrejas a oração tem quase desaparecido, porque muitos dizem que as orações pastorais são muito enfadonhas no culto.
Certamente devemos apreciar o privilégio de falar com Deus, juntos, como o Seu povo, e devemos assim fazer duma forma que mostre que Sua Palavra encheu nossas mentes e corações.
Cantando a Palavra de Deus
A Palavra deve ser a base do nosso cantar. No mínimo, os cânticos da igreja devem relatar as verdades da obra salvadora de Deus. Atenção primária deve ser dada ao conteúdo dos cânticos, avaliando as letras das músicas pelo que é escriturístico. Freqüentemente na história da igreja, os Salmos do Antigo Testamento formavam tudo ou pelo uma parte significativa do louvor do povo de Deus. Certamente nossa adoração está empobrecida hoje pela ausência relativa dos Salmos na maioria dos cultos de adoração, na maioria das igrejas. Cantar os Salmos é uma forma maravilhosa de esconder a Palavra de Deus em nossos corações, e é uma maneira certa de agradar ao Senhor que os inspirou e lhes deu ao Seu povo, para o seu bem. (Examinaremos o conteúdo do nosso cântico em maiores detalhes adiante).
A Palavra e os Sacramentos
A Palavra deve estar presente nos sacramentos da igreja – o batismo e a Ceia do Senhor. Agostinho chamou os sacramentos de “a palavra visível”, o que é uma forma útil de pensar sobre eles. Eles não são cerimônias estranhas que distraem de Cristo e da Palavra, mas são precisamente outra maneira na qual Deus comunica Sua Palavra. A água do batismo fala da nossa necessidade do sangue de Cristo para nos limpar (Tito 3:5). O pão e o vinho da Ceia do Senhor falam da nossa necessidade do corpo e do sangue de Cristo para nos alimentar para vida eterna (João 6:53-56). Os sacramentos trazem o próprio cerne da Palavra, o Evangelho de Jesus, para o culto.
A Pregação e a Palavra
Finalmente, a Palavra deve estar presente na pregação da igreja. Pregação é a comunicação verbal da Palavra de Deus, aplicando-a às vidas do povo de Deus. O pregador é um ministro da Palavra de Deus. Sua responsabilidade é estudar a Palavra e então ensinar e aplicar a Palavra como um ato central da adoração. Deus vem ao Seu povo e fala ao Seu povo na pregação fiel da Sua Palavra. Como a Segunda Confissão Helvética diz, “A pregação da Palavra de Deus é a Palavra de Deus”. Quando ouvimos um sermão fiel, estamos ouvindo Cristo nos falar e nos chamar à fé e ao arrependimento.
Romanos 10:14 realmente diz, “Como pois invocarão aquele em quem não creram? e como crerão naquele de quem não ouviram falar? e como ouvirão, se não há quem pregue?” Paulo está dizendo que a fé vem por ouvir as próprias palavras de Jesus, nas palavras fiéis do pregador.
Historicamente a igreja tem freqüentemente chamado a pregação (juntamente com os sacramentos) de um “meio de graça”. Um meio de graça é uma instituição do Senhor pela qual Ele prometeu abençoar Seu povo fiel e ajudá-Los a crescer na graça. A pregação, então, não é uma oportunidade para um pregador oferecer opiniões ou para ser divertido, mas é a instituição que Deus apontou e usa para comunicar Sua Palavra. Onde esta Palavra é ouvida e crida, a benção do Senhor sempre estará presente. O povo de Deus crescerá ao conhecer o perdão misericordioso de Deus e ao conhecer a vontade de Deus para eles. A adoração ordenada de acordo com a Palavra de Deus, considera a pregação como o elemento mais vital da adoração corporativa, essencial para a vida do povo de Deus.
Um das tragédias dos nossos dias é que muitos púlpitos estão cheios de estórias ou psicologia popular, ao invés da Bíblia e da sua verdade. Algumas vezes a pregação é suplementada ou mesmo substituída pelo drama ou dança, como se elas pudessem substituir a pregação. O drama e a dança eram meios de comunicação muito bem conhecidos no mundo antigo, mas os apóstolos e a igreja do Novo Testamento não os usaram. Antes, a igreja usava o discurso – que Paulo chama de “a loucura da pregação” (1 Coríntios 1:21-23) – para comunicar Cristo. O Novo Testamento não dá nenhuma dica de que o drama ou a dança seria apropriado para a adoração cristã.
Freqüentemente ouvimos hoje que vivemos numa cultura visual, onde o discurso perdeu seu poder e relevância. Precisamos de drama, dança ou vídeos para nos conectar com as pessoas em nossos dias, alguns argumentam. Mas o mundo de Paulo também era visualmente orientado. Os templos pagãos tinham imagens e rituais impressionantes. O teatro e o drama era muito mais importantes do que o são agora. Ainda assim, a igreja usou a pregação para comunicar o Evangelho, convencida de que a pregação comunicava a Cristo, que era Ele mesmo “o poder de Deus e a sabedoria de Deus” (1 Coríntios 1:24). A igreja tem sempre sido uma igreja do Livro, a revelação verbal de Deus.
A igreja também precisa de pregadores que desvelarão as Escrituras, porque os cristãos sempre precisam ouvir o que Deus está dizendo em Sua Palavra e como esta Palavra os traz para mais perto dEle. O mundo oferece uma abundância de estórias entretenedoras e dicas úteis sobre se sentir bem. Mas a igreja precisa da voz de Deus. Como a Declaração de Cambridge diz, “A Bíblia, portanto, deve ser ensinada e pregada na igreja. Os sermões devem ser exposições da Bíblia e dos seus ensinos, não expressões das opiniões do pregador ou das ideias da época”.
A pregação fiel não somente desvela a Palavra de Deus. Ela também encontra a Lei de Deus e o Evangelho na Palavra. Semana após semana os cristãos precisam ouvir a exigência de Deus para que vivam vidas santas. Precisam da Palavra de Deus pregada para serem desafiados a crescer em amor e obediência. Tal pregação não aumentará nossa auto-estima diante de Deus, mas nos convencerá do nosso pecado e da nossa necessidade de um Salvador. O ministério da Lei é em primeiro lugar um ministério de morte, nos convencendo da nossa fraqueza e nos conduzindo a Cristo, como nosso único refúgio. E semana após semana os cristãos precisam ouvir da cruz de Cristo, onde Ele carregou seus pecados. Devemos ter o Evangelho repetido para nós, de forma que possamos ver a provisão completa de salvação para nós na morte e na ressurreição de Jesus Cristo. Precisamos ser esmagados pela Lei e chamado à fé no Evangelho. A pregação centrada na Palavra nos traz a Deus.
Se realmente nos deleitarmos na Palavra e procurarmos a adoração que está cheia da Palavra, muitas das tensões e dos problemas que cercam a adoração hoje começarão a se clarificar por si mesmas. Não podemos reivindicar amor à Palavra e estarmos contentes com sua ausência na adoração. Desejaremos ouvi-la na leitura e na pregação, vê-la nos sacramentos, e cantá-la em nossos cânticos. Se não estamos interessados na Palavra de Deus, podemos estar realmente interessados em Deus?
Quinto – Liderança na Adoração
A discussão da Palavra na adoração leva naturalmente ao assunto da liderança na adoração. O padrão clássico da adoração protestante era a do ministro conduzir a adoração. Esse padrão surgiu do ensino do Novo Testamento, visto que dentre a congregação Deus chamou pastores e mestres para serem separados para as funções de liderança. “E ele (Cristo) deu uns como apóstolos, e outros como profetas, e outros como evangelistas, e outros como pastores e mestres, tendo em vista o aperfeiçoamento dos santos, para a obra do ministério, para edificação do corpo de Cristo” (Efésios 4:11-12).
Chamado para o Ministério
Paulo falou sobre esse chamado para o ministério em seu conselho pessoal a Timóteo: “Toda Escritura é divinamente inspirada e proveitosa para ensinar, para repreender, para corrigir, para instruir em justiça; para que o homem de Deus seja perfeito, e perfeitamente preparado para toda boa obra….Prega a palavra, insta a tempo e fora de tempo, admoesta, repreende, exorta, com toda longanimidade e ensino….sê sóbrio em tudo, sofre as aflições, faze a obra de um evangelista, cumpre o teu ministério” (II Timóteo 3:16,17; 4:2,5). Aqui está a ordem de Paulo para um ministro ser fiel em seu ensino e liderança na comunidade cristã, uma ordem que se relaciona com a adoração, assim como com todo o culto de Timóteo ao Senhor.
À luz das responsabilidades do ofício de pastor e mestre, as igrejas não devem somente chamar homens fiéis, mas devem também, quando possível, prover educação especial para eles. Muitas universidades e, mais tarde, seminários foram abertos para educar os líderes da igreja. O fundamento de tal educação descansa sobre a convicção de que um conhecimento completo da Bíblia e da teologia era uma necessidade vital para os pregadores. Hoje, quando a educação das congregações e da população é geralmente mais alta do que nas gerações anteriores, a necessidade de ministros da Palavra bem-educados é maior do que nunca.
Duas Objeções
Hoje, pelo menos duas objeções são levantadas contra o exercício da liderança na adoração por líderes cuidadosamente educados e chamados. A primeira reflete uma tendência anti-intelectual em alguns círculos cristãos. Ela sugere que a educação mata o zelo de um homem. Ela argumenta que o Espírito Santo ajudará um homem a entender a Bíblia, mas uma escola somente minará sua paixão. Esta noção é anti-bíblica, visto que a Bíblia repetidamente chama o povo de Deus para conhecer a Deus e Sua vontade. Oséias escreveu em nome de Deus, “meu povo é destruído por falta de conhecimento” (Oséias 4:6). Isaías registrou a queixa de Deus de que “O boi conhece o seu possuidor, e o jumento a manjedoura do seu dono; mas Israel não tem conhecimento, o meu povo não entende” (Isaías 1:3). Ele estava ansioso pelo dia em que muitos dirão:
Vinde, e subamos ao monte do SENHOR, à casa do Deus de Jacó, para que nos ensine os seus caminhos, e andemos nas suas veredas; porque de Sião sairá a lei, e de Jerusalém a palavra do SENHOR. (Isaías 2:3)
Uma educação piedosa conduz alguém à Bíblia e em direção a Deus, não para longe dEle.
A segunda objeção a uma liderança especial e educada brota de nossa cultura democrática, que sugere que muitas pessoas devem conduzir a adoração, e não apenas uma. Esta visão coloca um alto valor na participação e na expressão individual, que fazem o serviço mais interessante e vital. Seus aderentes freqüentemente apelam a I Coríntios 14:26 como suporte:
“Quando vos ajuntais, cada um de vós tem salmo, tem doutrina, tem revelação, tem língua, tem interpretação”.
Segundo esta interpretação, tal passagem não somente justifica, mas realmente convida para a participação de muitos na liderança da adoração?
Para responder esta questão devemos lembrar que Paulo está escrevendo a uma igreja onde as coisas estavam fora do controle na adoração, e ele está lembrando-lhes que “Deus não é um Deus de desordem, mas de paz” (I Coríntios 14:33) e que “tudo deve ser feito com ordem e decência” (v. 40). Mais especificamente, ele está dando um conselho sobre como regular a profecia e o falar em línguas na adoração (veja I Coríntios 14:1-2).
A situação que ele está descrevendo e regulamentando reflete os dias extraordinários da igreja primitiva, quando o Senhor Jesus ainda estava lançando os fundamentos da igreja na obra dos apóstolos e profetas. Como Paulo escreveu aos Efésios, “Sois membros da família de Deus, edificados sobre o fundamento dos apóstolos e dos profetas, sendo o próprio Cristo Jesus a principal pedra da esquina” (Efésios 2:19-20). Esta obra fundacional inclui tanto a revelação dada aos apóstolos como a obra especial do Espírito, tais como o falar em línguas, na igreja como um todo. Através dos anos da história da igreja, a maioria dos cristãos tem crido que, assim como o ofício de apóstolo cessou depois que o fundamento foi lançado, assim também a profecia, os milagres e o falar em línguas que acompanharam o ministério apostólico como sinais da obra do apostolado (II Coríntios 12:12) cessaram.
1 Coríntios 14:26, então, não é uma instrução específica para a adoração das igrejas hoje. Antes, ela foi uma instrução para aqueles tempos extraordinários do primeiro século. A permanente responsabilidade para a adoração descansa sobre a existência do oficio de pastor e mestre, que o Senhor e Seus apóstolos estabeleceram.
Uma Conversa Espiritual
O ministro conduz a adoração como uma conversa entre Deus e o Seu povo. No movimento de adoração Deus fala aos Seus adoradores, e eles Lhe respondem. Como Tiago nos lembra, “Chegai-vos para Deus, e ele se chegará para vós” (4:8).
A função do ministro em conduzir este diálogo entre Deus e o Seu povo é algumas vezes obscuro, pois na adoração o ministro tanto fala por Deus à congregação quanto fala pela congregação a Deus. Quando o ministro lê a Bíblia, prega, administra os sacramentos, ou pronuncia a bênção, ele fala por Deus à congregação. Quando ele oferece a oração pastoral, ele fala pela congregação a Deus. Pelo convite de Deus e da congregação, o ministro é separado para estas importantes tarefas na adoração. É óbvio que em sua educação, examinação e ordenação, o ministro é separado para pregar. Mas devemos lembrar que ele é separado também para apresentar as orações da congregação a Deus em palavras que agradem a Deus, sejam ortodoxas e representem o interesse de todos.
Em seu papel principal, o ministro conduz a adoração de Deus duma forma que preserva a adoração fiel e expressa a unidade do povo em seu encontro com Deus.
Sexto – Música e Adoração
De todas as batalhas nas guerras da adoração, a batalha sobre a música provavelmente tem sido a mais evidente e a mais emocional. Mudanças no estilo da música têm dividido, frustrado e até mesmo irritado adoradores. Devemos cantar hinos antigos ou corinhos de louvor? A música deve ser clássica, tradicional, folclórica, rock, contemporânea, country e sertaneja, ou o quê? Devemos usar órgãos e pianos, ou guitarras e tambores? A quantidade de tempo dada à música em muitos cultos tem aumentado grandemente. Alguns cultos começam com um longo tempo de cântico chamado “louvor e adoração”, como se somente os cânticos fossem adoração e o restante do culto fosse alguma outra coisa.
O que devemos fazer sobre estes assuntos?
Uma mudança na música – seja em algo antigo ou novo – é difícil, pois a maioria dos adoradores não são músicos e simplesmente gostam do que lhes é familiar. A maioria dos adoradores não é motivada por alguma teoria estética, mas por ligações emocionais que eles têm com suas músicas familiares. Sendo a música tão poderosamente engajada e expressa em nossas emoções, não é surpresa que ela seja um “campo minado” emocional para indivíduos e congregações.
Como com todas as formas de adoração, devemos avaliar a música em primeiro lugar biblicamente. Devemos deixar para trás as nossas próprias experiências e preferências e perguntar novamente, “O que agrada a Deus?” Devemos reconhecer que nem toda música e louvor Lhe agradam. Pense sobre a adoração e louvor que Israel ofereceu a Deus no deserto, no monte Sinai. Eles fizeram um bezerro de outro, chamaram-no de Senhor, e dançaram ao redor dele (Êxodo 32:4-6). Tal louvor foi uma abominação a Deus e evocou Sua ira! Devemos cuidadosamente procurar o que a Bíblia diz sobre como devemos louvar ao Senhor e oferecer música a Ele.
Quando pensamos sobre a música na adoração a Deus, estamos na verdade pensando sobre três assuntos: 1) as palavras que cantamos, 2) as melodias nas quais cantamos aquelas palavras, e 3) os instrumentos que podemos usar para acompanhar o cântico.
As Palavras que Cantamos
Dos três assuntos, o primeiro é o mais importante. As palavras que saem dos nossos lábios para cantar a Deus, devem ser verdadeiras e agradáveis a Ele. A Declaração de Cambridge nos lembra que um dos problemas que enfrentamos hoje é o que cantamos: “Os pastores têm negligenciado sua vigilância legítima da adoração, incluindo o conteúdo doutrinário da música”. Como podemos estar certos de que as palavras que cantamos agradam a Deus? Deus nos deu direção ao dar-nos na Bíblia um livro completo como um modelo do que devemos cantar. O Livro de Salmos (que em hebraico é intitulado o Livro de Louvores) nos provê com cânticos que o próprio Deus inspirou. Os Salmos deveriam pelo menos funcionar como o modelo do que nós, como cristãos, devemos cantar a Deus.
Os Cânticos que Usamos
O que os Salmos ensinam sobre o cântico? Primeiro, eles nos lembram da rica variedade de cânticos que podemos e devemos apresentar a Deus. Os Salmos contém louvor alegre e ação de graças. Os Salmos são chamados o Livro dos Louvores, pois eles não somente contém, mas também culminam no louvor de Deus (veja especialmente Salmos 146-150). Mas os Salmos contém muito mais do que louvor. Alguns Salmos refletem sobre a criação (por exemplo, Salmos 19 e 104); outros contam a grande obra salvadora de Deus em Cristo (Salmos 2, 22, 24 e 110). Há Salmos de lamentação e arrependimento (Salmos 32, 51 e 137), bem como Salmos que expressam a confusão e frustração que o povo de Deus às vezes experimenta vivendo neste mundo caído (Salmos 44 e 73). João Calvino com razão observou sobre o Saltério, “Não há uma emoção da qual qualquer pessoa possa estar consciente, que não esteja aqui presente como num espelho”.
Em muitas igrejas hoje, parece que somente cânticos felizes e alegres são cantados. Mas a alegria não é a única emoção que os cristãos experimentam. A adoração cristã precisa prover tempos quando a tristeza ou as emoções reflexivas são expressas, bem como as felizes. Uma variedade de textos de cânticos, como os encontramos no Saltério, são cruciais para este propósito.
Segundo, os Salmos também são um modelo para nós da substância do nosso cântico. Uns poucos Salmos são curtos e têm elementos repetitivos, mas a maioria deles são cheios, ricos, profundas respostas a Deus e à Sua obra. O cântico de louvor a Deus, o Saltério nos lembra, não é apenas expressão emocional, mas um compromisso real da mente. A ordem para amar a Deus com toda nossa mente deve informar nosso cântico. Mente e emoções juntas são o modelo de louvor nos apresentado nos Salmos, e a igreja moderna deve trabalhar para restaurar tal união, onde ela tem sido perdida.
Uma vez que capturarmos novamente o sentido apropriado dos textos que devemos cantar, os outros dois assuntos sobre cântico são relativamente fácies de resolver. Que melodias devemos cantar? Podemos usar qualquer melodia que seja cantável para uma congregação e que suporte o conteúdo do cântico. A melodia deve refletir o modo e a substância do cântico à luz da alegria e reverência que são apropriadas à adoração. Com aquelas diretrizes em mente (e uma sensibilidade à dificuldade da congregação em relação a uma mudança), o assunto da melodia para os cânticos deve ser resolvido facilmente.
Que Tipo de Instrumentos?
Que tipo de acompanhamento musical é bíblico? Na adoração do Antigo Testamento uma grande variedade de instrumentos era usada na adoração do templo. Todavia, na adoração da igreja, parece que por quase todos os primeiros mil anos de sua história, nenhum instrumento foi usado na adoração cristã. Hoje a maioria das igrejas usa um ou mais instrumentos. Mas onde instrumentos são usados, os instrumentos devem ajudar o cântico da congregação, não sobrepujá-lo. Eles devem contribuir para um espírito profundo de reverência e alegria, não miná-lo.
Em nenhum lugar, na igreja do Novo Testamento, os instrumentos são claramente usados para a adoração. Eles certamente não tinham um papel central ou independente na adoração. No máximo, eles devem auxiliar o cântico, o qual a congregação é ordenada a fazer. Se este é o seu propósito, as bandas de rock devem ser claramente inapropriadas para a adoração cristã, mas pode ser usado tanto um órgão como uma guitarra.
A música é um elemento poderoso e vital na vida de adoração do povo de Deus. Mas precisamente por ser tão significante, precisamos dar uma cuidadosa atenção a ela. Devemos estar certos de que estamos agradando a Deus e não entretendo a nós mesmos. A tentação de transformar a adoração num entretenimento é grande, pois, como pecadores, estamos muito mais inclinados a sermos centrados em nós mesmos do que centrados em Deus. Somos muito mais inclinados a divertir a nós mesmos do que servir a Deus.
Sétimo – Entretenimento, Evangelismo e Adoração
O convite ao entretenimento na adoração em nossos dias é freqüentemente lançado numa forma particularmente sedutora. O entretenimento é freqüentemente vendido com o nome de evangelismo. Somos informados que devemos tornar a adoração interessante e excitante para os não-convertidos, de forma que eles venham à igreja e sejam convertidos. À primeira vista, este argumento é muito apelativo. Todos nós desejamos ver muitos trazidos à fé em Cristo. Quem deseja ser contra o evangelismo? Mas devemos lembrar: entretenimento não é evangelismo, e evangelismo não é adoração. As pessoas são evangelizadas, não por um malabarista, mas pela apresentação do Evangelho. E embora o evangelismo possa ocorrer na adoração à medida que o Evangelho é fielmente proclamado, o propósito e o foco da adoração é de que aqueles que crêem em Cristo possam se reunir e encontrar a Deus.
Em I Coríntios 14:24-25 o apóstolo Paulo comenta sobre a presença de um incrédulo em um culto de adoração. Ele não convida a igreja para entreter o incrédulo ou fazê-lo sentir confortável. Antes, na clara e compreensível articulação da verdade, o incrédulo deve ser convencido de que ele é um pecador. “prostrando-se sobre o seu rosto, adorará a Deus, declarando que Deus está verdadeiramente entre vós”. A adoração fiel, onde o propósito primário é o encontro de Deus com o Seu povo através da Sua Palavra, pode muito bem ter o resultado secundário, ou seja, que os incrédulos cheguem à fé. Mas a adoração não deve ser construída para o incrédulo. Antes, ela é para Deus e para a igreja.
O culto como um todo na igreja, então, não deve ser modelado, seja para o entretenimento, seja para o evangelismo. Ao invés disso, ele deve servir para unir o povo de Deus para seu encontro com Deus.
Oitavo – Adorando com o Coração
Temos focado muita de nossa atenção neste artigo sobre as formas ou exterioridades da adoração corporativa. Mas, devemos lembrar que tais formas são, no máximo, somente metade da história. As formas mais fiéis e bíblicas não garantem a verdadeira adoração. Usar boas formas pode significar somente que somos formalistas, indo junto com a maré na adoração. Jesus citou Isaías quando disse, “Este povo honra-me com os lábios; o seu coração, porém, está longe de mim” (Mateus 15:18). Em uma disposição similar, Paulo advertiu contra aqueles “que têm a forma de piedade, mas negam o seu poder” (II Timóteo 3:5). A verdadeira adoração ocorre quando adoramos com o coração.
Preparando para a Adoração
Para nos encontrarmos com Deus precisamos vir à adoração preparados. Precisamos vir bem descansados, expectantes, ponderadamente prontos para nos encontrarmos com Deus. Precisamos estar cientes de que Deus estará presente nos elementos da adoração que Ele apontou. Ele estará presente para falar através da Sua Palavra e estará presente para ouvir nosso louvor e orações. Precisamos vir com claro entendimento das maneiras nas quais a adoração com o povo de Deus irá nos abençoar, e devemos vir procurando tal benção.
Nos chegamos à adoração em fé. A fé é confiar em Cristo, descansar em Sua obra consumada para o perdão dos nossos pecados. Nossa fé deve ser real à medida que vamos à igreja, de forma que nossa confiança em Cristo possa aprofundar-se. Chegamos à adoração com arrependimento, reconhecendo que somos pecadores e buscando a graça de Deus, para que mais e mais nos voltemos do pecado e persigamos a santidade. Nos chegamos à adoração com amor por Deus e pelo Seu povo. Tal amor nos faz desejar comunhão com o povo de Deus e desejar nos achegar mais a Deus.
ALEGREI-ME quando me disseram:
Vamos à casa do SENHOR. (Salmos 122:1)
Quando o coração está preparado para adoração e engajado nela, podemos entrar nos sentimentos do Salmista:
Ensina-me, SENHOR, o teu caminho, e andarei na tua verdade; une o meu coração ao temor do teu nome.
Louvar-te-ei, Senhor Deus meu, com todo o meu coração, e glorificarei o teu nome para sempre.
Pois grande é a tua benignidade para comigo, e livraste a minha alma das profundezas do Seol. (Salmos. 86:11-13)
Sonda-me, ó Deus, e conhece o meu coração; prova-me, e conhece os meus pensamentos; vê se há em mim algum caminho perverso, e guia-me pelo caminho eterno. (Salmos 139:23-24)
Eu te louvarei, de todo o meu coração; na presença dos deuses a ti cantarei louvores.
Inclinar-me-ei para o teu santo templo, e louvarei o teu nome pela tua benignidade, e pela tua verdade; pois engrandeceste a tua palavra acima de todo o teu nome. (Salmos 138:1-2)
Quando o coração está preparado pela Palavra de Deus e pelo Espírito de Deus para adoração, então a adoração que desejamos é a adoração que deleita a Deus. Nós nos chegamos, não para sermos agradados, mas para oferecer a Deus a adoração que Lhe agrada. Nos movemos da auto-centralidade, que caracteriza aqueles que não conhecem a Deus, para a centralidade em Deus, que deve caracterizar aqueles que O conhecem.
Avaliando a Adoração
Com tantas abordagens sobre como adorar e tantas variedades de igreja para igreja, o cristão deve se tornar um avaliador da adoração. A questão “Como devemos adorar?” está inevitavelmente ligada à questão “Onde devemos adorar?”. Uma vez que sabemos o que agrada a Deus na adoração, precisamos estar onde tal adoração ocorre.
Para avaliar a adoração de uma maneira apropriada, você precisa começar consigo mesmo. Precisa se auto-avaliar. Precisa perguntar para si mesmo o seguinte:
- Quanto eu sei sobre o que a Bíblia diz sobre adoração?
- Quem pode me ajudar a aprender mais sobre a adoração bíblica?
- Desejo acima de tudo me achegar a Deus em adoração?
- Desejo agradar a Deus, ao invés de me agradar, na adoração?
- Desejo entender minha responsabilidade de adorar a Deus com Seu povo regularmente?
- Buscarei a vontade de Deus na adoração, enquanto evito um espírito legalista e de julgamento para com os outros?
Você também precisa fazer estas perguntas sobre a adoração, com respeito a qualquer igreja que planeje freqüentar:
- Esta igreja ama e crê na Bíblia?
- A adoração desta igreja está cheia da Palavra de Deus?
- Quanto do tempo do culto é dado à leitura da Bíblia?
- Quanto do tempo do culto é dado à oração bíblica?
- Quanto do tempo do culto é dado ao cântico que é bíblico no conteúdo e no caráter?
- Qual é o conteúdo da pregação?
- A pregação é uma parte substancial do culto?
- A Lei de Deus é claramente apresentada no culto?
- O Evangelho de Jesus Cristo é claramente expresso e central no culto?
- Qual é o papel dos sacramentos no ministério da igreja?
- Há elementos no culto que são mais de entretenimento do que bíblicos?
- A ação de graças alegre e o temor reverente são expressos e balanceados no culto?
Não podemos ser casuais sobre questões de adoração. Elas são muito importantes. Precisamos ser racionais e bíblicos. Para fazer isto, precisamos assumir nossa responsabilidade pessoal de estudar e orar sobre adoração. Devemos buscar ajuda de ministros e amigos fiéis. E devemos buscar uma igreja onde a adoração é fiel à Palavra de Deus.
Um Convite para Adoração
Neste estudo pensamos juntos sobre a adoração numa variedade de formas. Mas no final, devemos lembrar que Deus quer que O adoremos.
Ó, vinde, adoremos e prostremo-nos; ajoelhemos diante do SENHOR que nos criou. Porque ele é o nosso Deus, e nós povo do seu pasto e ovelhas que ele conduz.(Salmos 95:6-7).
Precisamos atender ao chamado para adorar e para nos identificar com uma congregação que adora fielmente. Devemos adorar duma forma que agrade a Deus, porque nosso Deus é um fogo consumidor.
O Autor
Dr. W. Robert Godfrey é Presidente do Seminário Teológico de Westminster em Escondido, Califórnia. Ele é também professor de História da Igreja. Ele recebeu os graus de A.B., M.A., e Ph.D. da Universidade de Stanford, e o grau de M.Div. do Seminário Teológico de Gordon-Conwell. Ele ensinou no Seminário Teológico de Westminster (tanto na Pensilvânia como na Califórnia) por aproximadamente 20 anos. Ele é um ministro ordenado na Igreja Reformada Cristã. Dr. Godfrey foi um contribuidor de John Calvin: His Influence on the Western World (João Calvino: Sua Influencia no Mundo Ocidental); Reformed Theology in America (Teologia Reormada na América); e de Scripture and Truth (Escritura e Verdade). Ele editou o Westminster Theological Journal (Jornal Teológico de Westminster) por vários anos, e é um preletor freqüente em conferências cristãs. Dr. Godfrey é nativo da California. Ele e sua esposa, Mary Ellen, têm três filhos: William, Mari e Robert.
Tradução: Felipe Sabino de Araújo Neto. Cuiabá-MT, Dezembro/2004.
Texto revisado por Levi de Paula Tavares em Outubro/2007
Fonte: http://www.monergismo.com.