por: Pr. Douglas Reis
A cultura Nerd vive de fóruns sobre pormenores. Ela disseca o objeto de admiração em muitos ângulos, em um exercício de multiplicação monotemática. A internet ampliou estendeu essa característica nerd. Surge a figura do fanboy, uma espécie de Nerd xiita que defende com unhas e dentes seu ídolo, achando argumentos para todas as críticas contrárias. Ele vive de cultuar.
Hoje há fanboys se digladiando em todos os espaços da internet: aqueles que vivem do confronto Messi x Cristiano Ronaldo ou que se limitam a falar de super-heróis. Em praticamente todas as discussões, das mais tolas às pertinentes, há fanboys expressando opiniões tão cegas quanto apaixonadas, em um exemplo de unilateralidade que vai contra a racionalidade das discussões inteligentes, baseadas em argumentos factuais ou, ao menos, factíveis.
O cristianismo pop do século XXI, com seus artistas gospel, pastores-celebridades e escritores evangélicos de autoajuda é o melhor cenário para o surgimento de fanboys. Chega a ser tedioso ver discussões intermináveis sobre quem é o melhor tenor de quartetos de todos os tempos – a própria questão, além de inócua, é impossível de se analisar, ainda mais porque metade do povo que discute isso não conhece mais do que 10 grupos do gênero. A superficialidade parece outra característica do comportamento dos fanboys, mesmo dos cristãos.
Se a admiração extrema beira à idolatria, exaltar artistas cristãos se torna ainda mais perigoso, porque desvirtua o sentimento religioso. Cria-se um vínculo com o cantor ou pregador, como se a experiência religiosa devesse se concentrar em acompanhar sua ministério (ou carreira) e defendê-lo absolutamente.
Escrevendo aos coríntios, Paulo combate essa mesma classe de sentimentos. “Meus irmãos, fui informado por alguns da casa de Cloe de que há divisões entre vocês. Com isso quero dizer que cada um de vocês afirma: ‘Eu sou de Paulo’; ‘eu de Apolo’; ‘eu de Pedro’; e ‘eu de Cristo’”. (1 Coríntios 1:11-12, NVI). Ao invés de se beneficiar da ministração dos apóstolos, os coríntios compartimentalizaram sua atuação. Eles criaram preferências em torno das personalidades dos pregadores. E, uma vez feito isso, logo surgiram partidos em torno das preferências.
O escritor bíblico combate o sentimento, afirmando que a fé cristã não se baseava no talento de seus expositores, nem tampouco em seu carisma e habilidades pessoais. Usando uma diatribe cheia de ironia e severidade, Paulo indaga: “Acaso Cristo está dividido? Foi Paulo crucificado em favor de vocês? Foram vocês batizados em nome de Paulo? (1 Coríntios 1:13, NVI) Tanto na época de Paulo como em nossa cultura digital o problema é o mesmo: concentrar-se desequilibradamente no ministério de pessoas leva a perder de vista o fundamento da fé: a pessoa e ministério do Senhor Jesus.
Paulo, em outro contexto, elogiou aqueles que não aceitavam sua palavra sem uma mentalidade crítica (Atos 17:11) – o apóstolo era contra os fanboys, mesmo quando era alvo da admiração deles! Vale notar que a palavra grega traduzida por “nobres” pode ser entendida como “mente nobre” ou “mente aberta”. Os bereanos foram elogiados por possuírem uma atitude mental altamente seletiva, do tipo que sabe ouvir e ponderar, sem aceitar um discurso pelo número de recomendações ou pela fama de quem o profere. Seria interessante encontrar mais exemplos dessa mentalidade na contemporaneidade…
Fonte: Questão de Confiança