por: Elsie Landon Buck
Recentemente alguém me fez a pergunta, já bem antiga, “Os fins justificam os meios?” Será que as vantagens – os valores e os padrões – de nossa sociedade moderna justificam os atalhos e desvios freqüentemente tomados para alcançar um objetivo? Eles minimizam a nossa responsabilidade para com as obrigações morais consagradas pelo tempo?
Especificamente, os fins justificam os meios utilizados na adoração pública? A adoção gradual da “Música Cristã Contemporânea” (MCC) que temos visto na América e ao redor do mundo durante as duas últimas décadas justifica este tipo de música como um meio de ampliar a freqüência à igreja?
Uma Pergunta no Brasil
Quando meu marido Edwin e eu estivemos no Brasil, há alguns anos atrás, fomos a uma igreja na capital de um dos estados brasileiros. Uma convenção, com a presença de várias autoridades estava ocorrendo naquela época. Entre estas autoridades estava o presidente da Divisão Sul Americana da Conferência Geral dos Adventistas do Sétimo Dia.
Ao final do culto matutino, apresentei-me ao presidente e lhe entreguei uma cópia do periódico Notes, a publicação oficial da Associação Internacional de Músicos Adventistas. Ele ouviu atentamente, enquanto eu discorria sobre os tópicos com ele, concordando ocasionalmente. Então, de forma inesperada, ele olhou para mim muito seriamente e perguntou, “Por que é que vocês na América do Norte estão nos enviando tanta música que é questionável e não atinge os padrões da verdadeira música para a igreja?”
Permaneci em silêncio. O que eu poderia dizer? Sabia sobre o que ele estava falando. Quem deve ser responsabilizado por impregnar a nossa denominação com a música chamada de popular?
Música e Adoração
Um grande desafio se apresenta à Igreja Adventista do Sétimo Dia hoje, em suas escolhas da música para a adoração congregacional. Muita ênfase tem sido colocada em nossa necessidade de revitalização, de renovação, para um despertamento que alcance os jovens, os não convertidos, e a todos que ouvem aos artistas contemporâneos e à MTV. De modo a atrair essas pessoas para a nossas igrejas, se diz, devemos fornecer a eles sons com os quais eles estejam familiarizados – somente, é claro, com as palavras trocadas e temas mais elevados. Muita discussão e controvérsia têm resultado disso.
Como Deus deseja que O adoremos? Com a música da cultura pop ou com algo diferente, especial, santo? Não deveríamos dirigir os nossos jovens à santidade de Deus através de uma música que O exalta de todas as formas possíveis?
Através dos séculos, retrocedendo até os tempos bíblicos, tem havido controvérsia sobre o que se presume que agrada a Deus e o que não O agrada. O próprio Deus nos pede para que O adoremos “na beleza da Sua santidade” (I Crônicas 16:29; Salmos 96:9). Mas Ezequiel, inspirado por Deus reclamou do povo de sua geração que “não fazem diferença entre o santo e o profano” (Ezequiel 22:26).
A música para a igreja precisa ser diferente. Ele deveria ser especial. Seu conteúdo e estilo deveria contrastar de forma marcante com o que é ouvido ordinariamente em outros lugares. A música as igreja deve ser sagrada. Para atingir a determinação do próprio Deus, devemos fazer uma diferença entre o sagrado e o profano.
Ao fazermos esta diferença, precisamos nos lembrar que a música não é apenas um veículo para as palavras, mas tem uma mensagem em si mesma. Ela tem poder para expandir a mensagem das palavras que acompanha ou para corrompê-las. A música pode enobrecer o impacto das palavras ou diminuí-lo.
Estudos têm convencido até mesmo a Associação Médica Americana (AMA) de que algumas músicas contemporâneas têm resultados negativos entre os jovens. Publicações da AMA desde 1989 afirmam que “os médicos devem estar alerta aos hábitos auditivos de seus pacientes jovens como pistas para a sua saúde emocional, porque a fascinação com o rock ‘n’ roll, especialmente a música heavy metal, pode estar associada com uso de drogas, sexto pré-marital e rituais satânicos.” Acrescenta-se que “um estudo demonstrou que alunos da 7a. e 10a. séries, depois de assistir a uma hora de vídeos musicais, eram mais propensos a aprovar o sexo pré-marital do que um outro grupo de controle, também de adolescentes. (1)
Certamente a música que está associada com uso de drogas, rituais satânicos e sexo pré-marital não pode ser descrita como “santa”. A música sacra deve ser um tipo de música separada, não contaminada pelo crescente clamor que inunda nossos ouvidos hoje em dia. A música que verdadeiramente adora a Deus precisa transmitir santidade.
Propósitos da Música Sacra
A música sacra serve a vários propósitos durante um culto de adoração.
1. Puro Louvor. Todos concordam que um dos propósitos da música em um momento de adoração é expressar louvor a Deus. Dia e noite, ao redor do trono de Deus no céu, os quatro “seres viventes” cantam “Santo, Santo, Santo é o Senhor Deus, o Todo-Poderoso, aquele que era, e que é, e que há de vir.” (Apocalipse 4:8). De tempos em tempos, os vinte e quatro anciãos respondem ao seu cântico com “Digno és, Senhor nosso e Deus nosso, de receber a glória e a honra e o poder; porque tu criaste todas as coisas, e por tua vontade existiram e foram criadas.” (Apocalipse 4:11). Pelo menos uma vez em visão João ouviu a “toda criatura que está no céu, e na terra, e debaixo da terra, e no mar, e a todas as coisas que neles há” dizendo “Ao que está assentado sobre o trono, e ao Cordeiro, seja o louvor, e a honra, e a glória, e o domínio pelos séculos dos séculos.” (Apocalipse 5:13). (Temos sido elevados ao ouvir estas palavras cantadas [no coro final do oratório] O Messias, de Haendel.)
É importante que observemos de passagem, que quando este arrebatador hino de louvor foi concluído, ninguém no céu sentiu que seria apropriado bater palmas. A Bíblia diz que, em vez disso, os quatro seres viventes disseram: “Amém. E os anciãos prostraram-se e adoraram.” (Apocalipse 5:14).
Assim, um dos principais propósitos da música na adoração é expressar o louvor. Mas o louvor é apenas um dos aspectos da verdadeira adoração. Há vários outros.
Muitos comentaristas vêem em Isaías 6 uma ilustração esclarecedora da verdadeira adoração. Neste capítulo, Isaías diz primeiro que ouviu os serafins (que são os mesmos seres viventes do Apocalipse) cantando “Santo, santo, santo é o Senhor dos exércitos” (Isaías 6:3). Aqui está o aspecto do louvor na adoração.
2. Arrependimento e Confissão. Mas qual foi a reação de Isaías a um louvor de tal forma puro? No céu, os vinte e quatro anciãos, que são sem pecado, “prostraram-se e adoraram.” Isaías, que era pecador, também reagiu com humildade, mas no seu caso, ele reagiu adicionalmente com arrependimento. “Ai de mim!” ele clamou em agonia, “pois estou perdido; porque sou homem de lábios impuros, e habito no meio dum povo de impuros lábios; e os meus olhos viram o Rei, o Senhor dos exércitos!” (Isaías 6:5).
O cântico de louvores que nos deixa extasiados mas não arrependidos fica a dever como verdadeira adoração. Se chegarmos realmente à compreensão da santidade e do tremendo poder de Deus, nos tornaremos humilhados e arrependidos. A música que está preocupada com a beleza da santidade apoiará o aspecto do arrependimento na adoração, assim como o aspecto do louvor.
3. Súplica. A súplica é ima parte integral da maioria dos cultos de adoração. Na experiência de Isaías, sua desesperada confissão de indignidade não expressa realmente uma súplica, mas ela está claramente implícita. Ele estava, obviamente, desejoso que Deus removesse sua indignidade.
Muitos dos Salmos (que eram poemas escritos para serem cantados como hinos) são orações de súplica.
4. Perdão. Deus respondeu ao arrependimento e confissão de Isaías, e à sua súplica implícita, através de um dos serafins, que tocou seus lábios com uma “brasa viva, que tirara do altar”, e dizendo: “Eis que isto tocou os teus lábios; e a tua iniqüidade foi tirada, e perdoado o teu pecado.” (Isaías 6:6-7).
Portanto, a música de adoração deve apoiar mensagens de perdão para os pecados confessados, dos quais nos arrependemos. Líderes de louvor deveriam se lembrar de que a Bíblia não promete em lugar algum o perdão dos pecados dos quais não houve arrependimento e confissão.
5. Chamado e Entrega. Imediatamente depois de ter sido perdoado, Isaías ouve o Senhor perguntando, “A quem enviarei, e quem irá por nós?” A este chamado Isaías responde, “Eis-me aqui, envia-me a mim.” (Isaías 6:8).
Um quinto aspecto da verdadeira adoração – juntamente com a música de adoração – é o chamado ao serviço e o nossa resposta em entrega. Enfaticamente, a música não está confinada ao louvor!
6. Instrução. O restante do capítulo 6 de Isaías (versos 9-13) consiste de instruções a Isaías com respeito às tarefas para as quais ele havia acabado de ser comissionado. É uma instrução “impopular”, advertindo Isaías do aparente fracasso que aguardava seus esforços. Como ele estaria levando a verdade de Deus às pessoas, as congregações seriam hostis e, numericamente falando, seus resultados seriam nada mais do que um remanescente.
Como todos nós sabemos, em muitos cultos de adoração cristãos, a instrução é fornecida na forma de sermões, mas alguns dos Salmos (por exemplo 105 – 107) são, na realidade, lições sobre a história da igreja, e tanto Lutero quanto Wesley prepararam hinos de instrução para suplementar as suas pregações.
Lutero, que era músico, assim como teólogo, estava bem consciente de que os profetas do Antigo Testamento freqüentemente deram a sua instrução em forma de poesia hebraica, forma na qual ela poderia ser facilmente cantada em modo de cantochão. Diz-se que ele observou certa vez que “quando expressavam a sua teologia, os profetas não o faziam como geometria, não como aritmética, não como astronomia, mas como música; assim, eles consideraram a teologia e a música como estando corretamente conectadas, e proclamaram a verdade através do Salmo e do cântico.” (Geometria, aritmética, astronomia e música eram os quatro assuntos principais – o quadrivium – ensinados aos alunos das universidades mais avançadas nos dias de Lutero.)
Os pioneiros adventistas, profundamente convencidos do significado da sua mensagem, também usaram os hinos para propósitos instrutivos. Pense nos hinos “O Rei Vindouro” (HASD nr. 130) e “Vigiai, Cristãos” (HASD nr. 126). (*)
O Hinário Adventista do Sétimo Dia (**)
Se podemos concordar que a música na verdadeira adoração deveria suportar não apenas (1) o louvor, mas também (2) o arrependimento e confissão, (3) a súplica, (4) o perdão, (5) o chamado de Deus e o nossa entrega, e (6) a instrução, estamos prontos para olharmos com novos olhos para o nosso Hinário Adventista do Sétimo Dia.
O Hinário Adventista do Sétimo Dia oferece hinos que suportam todos os aspectos da adoração que mencionamos. Eis aqui um exemplo de cada:
Louvor: “Quão Grande És Tu” (HASD nr. 34).
Arrependimento: “Eu Venho a Ti, Senhor” (HASD nr. 281).
Súplica: “Ó Deus, Contigo Almejo Andar” (HASD nr. 404).
Perdão: “Teus Pecados Brancos se Farão” (HASD Nr. 194).
Chamado e Entrega: “Eis de Cristo a Voz Que Chama” (HASD Nr. 323).
Instrução: “Castelo Forte” (HASD Nr. 33).
A Introdução ao Seventh-day Adventist Hymnal observa corretamente que “este hinário pode ser usado para guiar congregações a formas mais criativas e significativas de louvor a Deus, a um mais profundo amor por Jesus Cristo, a uma compreensão mais aguçada do lugar e missão da igreja no mundo, a um conhecimento renovado da vontade de Deus para cada vida e a uma preparação para a segunda vinda de nosso Senhor” (ênfase da autora).
Nosso hinário não despreza as crianças. O que podemos dizer de “Tudo Que Há em Terra e Mar” (HASD nr. 37), “Estrela de Luz” (HASD nr. 46) e “Jóias Preciosas” (HASD nr. 462)? Você sabia que, além dos hinos listados na seção “Crianças“, na página 876 do hinário, existem muitos outros que as crianças e os jovens gostam de cantar? Ou seja, eles gostam de cantá-los depois que alguém ensinar estes hinos a eles.
Quantos jovens em idade escolar hoje estão familiarizados com os grandes hinos da igreja? Quantos hinos eles conhecem? Quantos os usam como avenidas pessoais de entrega e amor ao seu Criador? Hinos, uma vez aprendidos, podem guiar os jovens a Deus, solidificando a sua fé e crenças e servindo como âncoras.
Tornando os Hinos Significativos
Os hinos podem ser trazidos à atenção e vivificados por qualquer pessoa que esteja envolvida em cantá-los – o diretor de música, o ministro, o acompanhador e, é claro, a congregação. Ensinar um pouco a respeito do próprio hino – seu autor (o nome no canto superior esquerdo) ou seu compositor (o nome no canto superior direito) – chamar a atenção para algum aspecto da mensagem do hino, e então pedir à congregação para cantar de forma inteligente e com sentimento pode tornar o cântico de hinos uma experiência agradável e significativa. Isto é especialmente verdade se o acompanhador toca de forma cuidadosa e atenta. Quem não se entusiasma quando, no final de “O Deus Eterno Reina“, o organista diminui o tempo e abre o registro do órgão em um poderoso crescendo, acompanhando as palavras “E reine para sempre enfim, o eterno Rei dos reis”?
Uma renovação no uso do Hinário deveria ser feita em nossas igrejas, em todos os lugares. Quando estamos cantando hinos, a Palavra de Deus se torna uma declaração pessoal da nossa fé. Ao cantar hinos, crianças, jovens e adultos, todos podem encontrar entendimento acerca dos caminhos de Deus e do Seu cuidado em nossas vidas.
É um dever primordial para o bem estar de todos aqueles que vem adorar a Deus na beleza de Sua santidade, que experimentem o valor dos hinos. Devemos ver no Hinário um guardião da verdadeira adoração, um caminho dado por Deus, tanto para a mente quanto para o coração de cada homem, mulher, jovem, adolescente ou criança. Nos hinos cristãos podemos encontrar um tesouro, uma fivela de ouro que nos liga a Deus e uns aos outros.
A música para a adoração deve ser divinamente orientada, conscientemente respeitada e reverenciada. “Amarás ao Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma, e de todo o teu entendimento” (Mateus 22:37). A santidade na adoração evita a repetição trivial em sons e palavras. A santidade na adoração evita a batida degenerada e o estilo rebuscado dos artistas pop. A santidade na adoração é adorar verdadeiramente ao Senhor “na beleza da santidade”, devolvendo a Ele o dom da música, com o qual Ele tão generosamente agraciou a raça humana.
Os hinos levam consigo o poder elevador e enobrecedor da Palavra de Deus em texto e música, proclamando a todos o dom expiatório de Cristo, o Redentor e Salvador do mundo.
Que tudo que seja feito em nome da música seja feito em honra Àquele que é o nosso Criador e em gratidão Àquele que morreu na cruz para a nossa redenção. Seja nos Estados Unidos – ou no Brasil – ou em qualquer outra parte do mundo, o Deus do universo merece nosso mais elevado respeito e reverência. Deus nos dá, a cada um, o direito de escolhermos – com todas as conseqüências – o que verdadeiramente O honra.
Para alcançar pecadores, os hinos são um meio e um fim, o meio correto, o meio de Deus.
Vós, criaturas do Senhor, Oh, elevai a Deus louvor! Oh, louvai-O! Aleluia!
Tu, sol dourado a refulgir; Tu, lua em prata a reluzir! Oh, louvai-O! Aleluia!
Ó terra e céu, a Deus honrai; Preitos de amor e graças daí! Oh, louvai-O! Aleluia!
Flores, erguei-vos em canção Ao grande Deus da criação! Oh, louvai-O! Aleluia!
Vós, homens sábios e de bem, Daí ao Senhor louvor também! Oh, louvai-O! Aleluia!
Daí glória ao Filho, Glória ao Pai, E ao Santo Espírito Louvai! Oh, louvai-O! Aleluia!
(Francisco de Assis, HASD nr. 15)
Notas:
(1) Chicago Sun Times, 15 de Setembro de 1989; citado em How to Conquer the Addiction of Rock Muisc (Oak Brook, Ill.: Institute in Basic Life Principles, 1993), pp. 79-80.
Elsie Landon Buck é Presidente da Associação Internacional de Músicos Adventistas
Notas do Tradutor:
(*) No original, é citado o hino “Look for the Waymarks” (SDA Hymnal nr. 596), que não tem correspondente no nosso hinário, mas que é do mesmo autor e com o mesmo assunto de “O Rei Vindouro“.
(**) A partir deste ponto, a tradução será feita adaptando os hinos citados no original aos hinos traduzidos para o Hinário Adventista do Sétimo Dia em português, ou a hinos equivalentes, quando não constar no HASD a tradução do hino citado.
Traduzido por Levi de Paula Tavares em Maio de 2005
Fonte: Este artigo foi publicado no periódico Adventists Affirm, volume 13, Nr. 1 (Primavera de 1999), pp. 6-10