Perdido Dentro da Igreja

Entrevista com o Pr. Marcos Faiock Bonfim


Marcos Faiock Bonfim nasceu em Taquara, RS, em 1963, como o mais velho de uma família de três irmãos Viveu praticamente toda a infância e juventude em São Paulo, onde se formou em Teologia, em 1985, no então IAE, hoje Unasp. Concluiu o Mestrado em Teologia em 1998, no Unasp, campus Engenheiro Coelho, e atualmente faz pós-graduação em Terapia Familiar, em Porto Alegre. Ainda durante o bacharelado em Teologia, foi professor de Musicalização Infantil e maestro de corais em escolas adventistas de São Paulo.

Depois de formado em Teologia, trabalhou como pastor distrital durante nove anos, na Grande São Paulo. Em seguida, passou seis anos servindo como departamental na Associação Catarinense, de onde foi para o Rio Grande do Sul, onde coordena, desde 2001, os departamentos de Mordomia Cristã e Ministérios da Família da Associação Sul-Rio-Grandense (ASR). Além disso, é o apresentador do programa diário “Novo Tempo em Família”, da Rede Novo Tempo de Rádio.

É casado com a pedagoga Mariluz da Silva Bonfim e tem duas filhas adolescentes, Luana, de 16 anos e Alana, de 14.

Nesta entrevista, concedida a Michelson Borges, fala das lutas pelas quais passou na juventude e de como se converteu, após um período de afastamento de Deus.


Revista Adventista: Mesmo tendo nascido em um lar adventista, o senhor esteve um tempo afastado de Deus. Como isso aconteceu?

Marcos Bonfim: Às vezes acontece que filhos criados em lares ativamente empenhados na nutrição espiritual de seus membros se afastem de Deus. Mas não são felizes longe dEle. O Espírito Santo fica trabalhando na consciência e o prazer do pecado acaba deixando um certo “amargo na boca”. No meu caso, havia uma inconstância muito grande em minha vida espiritual. Ora deixava-me influenciar pelo lar, pelo colégio (IAE) e pela igreja; ora pelos amigos ou companheiros. Tentando tornar-me aceito pelo grupo de amigos, aabei fazendo concessões e comprometendo princípios.

RA: Como você acabou se interessando pelo estilo de música rock?

Marcos Bonfim: Certa vez, contra a vontade de meu pai, fui acampar por cerca de quatro dias  com um grupo de jovens. Todos cantávamos em um dos corais da igreja, mas o acampamento era independente (sem a supervisão de líderes da igreja), praticamente não havia adultos com coragem para se posicionarem e que se responsabilizassem pela manutenção dos princípios espirituais.

Durante todo o tempo, dia e noite, música rock era tocada em volume muito alto. No primeiro dia, quase não pude suportar a experiência de ouvir aquela música, já que em casa estava habituado apenas à música cristã ou clássica. No fim do segundo dia, minha mente já estava mais acostumada com a batida, e ao terceiro dia já encontrava verdadeiro prazer naquilo que antes me causava repulsa. Desse modo, o rock foi para mim a porta de entrada para a música popular.

RA: Qual o problema com esse tipo de música?

Marcos Bonfim: O rock, bem como outros tipos de música muito ritmada, tende a levar o indivíduo a estados pré-hipnóticos, por causa da batida cadenciada. Se isso ocorrer, dependendo do volume do som e do grau de envolvimento, o indivíduo acaba sendo prejudicado em sua capacidade decisória, no juízo crítico e no raciocínio lógico. É nessa hora que os impulsos mais baixos tomam as rédeas e isso é a senha para que espíritos satânicos assumam completamente a direção. Além da pré-hipnose, a letra da maioria dessas músicas, o estilo de vida dos artistas e suas crenças são uma mal disfarçada tentativa de impor os valores do império das trevas. Alguns desses músicos inclusive já confessaram que compunham diretamente sob inspiração satânica, e que este fato é fartamente comprovado em literatura sobre o assunto.

RA: E as demais músicas populares? Também são assim tão nocivas?

Marcos Bonfim: Eu estenderia o mesmo raciocínio para boa parte da música popular. Existem pessoas que recuariam horrorizadas diante de um rock pesado, mas passam horas e horas escutando inocentemente música popular. Ouvem sem prestar atenção, imaginando que não há perigo algum nisso. Mas se esquecem que Satanás é um ser real, muito inteligente, e que nunca perde tempo. Ele sabe que a música é algo que mexe profundamente com os sentimentos do ser humano; sabe que tipos diferentes de acordes, dispostos em seqüências e ritmos diferentes, podem produzir sentimentos que influenciam a mente para aceitar o pecado ou para se afastar de Deus; sabe que esses sentimentos, se repetidos, fixam padrões de conduta ou resposta. Assim, é importante saber que o que entra no cérebro humano pelos sentidos influenciará de algum modo, para o bem ou para o mal. O conceito teológico do Grande Conflito nos revela que neste mundo simplesmente não existe coisa alguma absolutamente neutra.

Com o passar do tempo, percebi claramente que esse tipo de música, apesar de não ser aparentemente tão agressivo quanto o rock, tirava-me quase que completamente o gosto pelas coisas de Deus, e diminuía muito minha resistência contra o pecado.

RA: E o que dizer das músicas sacras com estilo pop?

Marcos Bonfim: Abandonar a música popular representou para mim uma luta muito grande. Talvez seja por este motivo que tenho hoje sérias dificuldades para adorar a Deus quando ouço na igreja uma música tipicamente popular, com letra sagrada. A música popular, por suas características musicais, tende a privilegiar mais o movimento corporal, o prazer sensorial e os instintos mais baixos em detrimento da introspecção, da razão e do raciocínio lógico, essenciais para a comunhão com Deus. Não podemos nos esquecer de que, depois da queda, nossos instintos passaram a estar sob influência da natureza pecaminosa.

Já a verdadeira música sacra apela aos instintos mais nobres, como o da busca do espiritual, por exemplo, e isso requer introspecção, paz. Esse tipo de música, talvez por estar em oposição à nossa tendência pecaminosa, acaba sendo naturalmente muito menos atrativo à pessoa que não possui discernimento espiritual. A confusão acontece quando existe a mistura dos dois elementos – música popular com letra sagrada. Acontece então uma falta de integridade, uma inconsistência entre a letra e a música.

RA: Você também gostava muito de televisão. Como a televisão prejudica a espiritualidade do cristão?

Marcos Bonfim: Existe um princípio básico que rege o funcionamento da mente humana, que afirma que ela simplesmente não consegue resistir à repetição. Este é um princípio que pode ser utilizado tanto por Deus quanto pelo inimigo. Sobre este princípio apóiam-se todos os sistemas de lavagem cerebral, como as mensagens subliminares, por exemplo. Você pode escolher conscientemente o que vai influenciar a sua mente, mas depois de estar exposto a essa influência, sua capacidade de resistir a ela fica muito reduzida. Satanás, que é um profundo estudioso da mente humana, serve-se da TV e outras mídias para criar emoções e prender a atenção, prejudicando a capacidade de escolha. É por isso que muita gente acaba se sujeitando a ver coisas com as quais não concorda. Parece que não conseguem desligar a TV ou sair de um site. Tudo o que emociona ou choca, sejam novelas, filmes, seriados, jornais ou até programas esportivos, acabará, por assim dizer, fortalecendo as sinapses (ligações entre os neurônios) correspondentes, que finalmente se tornarão o caminho mais fácil e natural para um dado impulso nervoso.

É assim que o pecado se torna mais automático e natural que a santidade. Dessa maneira, martelando sua ideologia na mente dos incautos, Satanás consegue vendê-la ao preço que quiser. E acaba custando muito caro. Às vezes a família; outras vezes a honra. A saúde ou mesmo a salvação.

RA: Conte como foi a sua conversão.

Marcos Bonfim: Certo dia, quando de namoro a estudos, nada estava dando certo em minha vida, entre brincadeiras e conversas dentro da igreja, ouvi um pregador que tentava provar à congregação que a Bíblia era mesmo um livro de origem divina. Já que intimamente também punha em dúvida a origem da Bíblia, a ousadia do pregador despertou-me a atenção, e escutei, talvez para que depois pudesse ridicularizar o seu raciocínio. Depois de falar do cumprimento das profecias que envolvem o fator tempo, desafiou: “Se sua vida vai mal (era o meu caso) e você quer descobrir se a Bíblia é mesmo o livro de Deus, faça um teste: comece a lê-la todos os dias e procure obedecer a tudo o que Deus lhe mandar. Se sua vida continuar a mesma ou piorar, então desista da Bíblia e de Deus. Mas se sua vida começar a melhorar depois disso, não será uma evidência da existência do poder que lhe deu origem?” Eu pensei: “Por mais que, com minhas próprias forças, eu queira fazer minha vida melhorar, ela piora cada vez mais.” Naquele momento percebi que minha vida só poderia melhorar com auxílio sobrenatural. O pastor também desafiou todos a orarem secretamente e a esperar por respostas.

Tudo aquilo me fez refletir, e resolvi começar a ler a Bíblia por mim mesmo. Comecei por Gênesis e encontrei profundo prazer na leitura, tentando descobrir toda e qualquer ordem de Deus para que então pudesse obedecer. Comecei também a orar e a fazer pedidos a Deus. Muito rapidamente constatei minha fraqueza e incapacidade para cumprir aquilo que descobria ser a vontade de Deus, e fiquei muito desanimado.

Foi então que ouvi também um sermão do pastor Alejandro Bullón, dizendo que ninguém precisa esconder de Deus as suas fraquezas, e que a gente pode até dizer para Deus que está gostando do pecado, porque Ele sabe de tudo e nos ama mesmo assim. Depois parei de ficar olhando apenas para os meus pecados e fraquezas, tentando tornar-me santo pela minha própria obediência, e comecei a olhar para o Senhor, para a Sua santidade, diariamente, pela manhã, e em “primeiro lugar”. Mateus 6:33.


Fonte: Revista Adventista, Fevereiro/2004, pp. 5-6.