Debate Sobre a Música na Igreja / Ellen G. White e a Música na Igreja

Ellen White Era Contra a Bateria na Música Sacra? – Uma Resposta – Parte 05

A Bateria e o Fim dos Tempos

A Bateria e o Fim dos Tempos

Como demonstramos acima, os tambores que Ellen White viu eram aqueles usados em Indiana e não a bateria moderna. Poderíamos parar por aqui e considerar o paralelo entre os dois como incorreto e a proibição atual, falsa. Mas infelizmente, a “profecia dos tambores” tem se tornado um exemplo clássico de descontextualização e desvirtuamento do que Ellen White intencionava.

A Bateria e o Fim dos Tempos

Evidentemente, é do conhecimento geral que a bateria atual é essencialmente diferente do tambor utilizado em Indiana. Um paralelo direto e estrito entre os dois realmente é incorreto, embora não seja, de forma alguma, incorreta uma comparação dos efeitos causados por ambos, uma vez que se tratam de instrumentos da mesma classe, a saber, a percussão.

Porém, o fato de que Ellen White tenha se referido a uma certa espécie de tambor (“um grande bumbo“) ao invés de estar falando da bateria completa como a conhecemos hoje deveria ser um elemento de preocupação e de reforço da oposição ao seu uso, e não de dissolução desta oposição.

Já destacamos anteriormente, mas deve ser enfatizado, que naquela ocasião, foi usado apenas um bumbo, e, pela utilização dada a este instrumento, grande mal foi causado, criando “uma balbúrdia de barulho” que “choca os sentidos e perverte aquilo que, se devidamente dirigido, seria uma bênção.” Ora, se isso ocorreu com o uso de apenas um bumbo (entre outros instrumentos, mas o tambor foi citado de forma específica no texto em questão), o que pode ocorrer (ou já tem ocorrido) quando usamos uma bateria completa, com bumbo, surdos, caixas e pratos? Considerando a natureza humana, a tendência seria para uma maior solenidade e espiritualidade no culto? Ou e tendência seria (ou tem sido) para “uma balbúrdia de barulho” ainda maior, e de resultados ainda mais maléficos, perfazendo a obra que havia sido profetizada que seria levado a efeito por Satanás em nosso meio?

Portanto, vemos que a diferença entre os instrumentos utilizados é somente mais um ponto de atenção na comparação entre os dois, considerando-se a longa lista de problemas com esta classe de instrumentos na adoração.

A ironia neste trecho da argumentação é que este paralelo entre os dois, com base na comparação de seus efeitos – o qual o articulista diz ser incorreto – o próprio articulista o faz indiretamente, na medida em que afirmou em trechos anteriores: “Os tambores, juntamente com os outros instrumentos estavam sendo usados para criar um êxtase emocional e físico“. Ora, pela observação do contexto musical evangélico atual, verifica-se que todos os movimentos e cultos onde existem, nas palavras do articulista “…falsa doutrina e emocionalismo que acompanham o seu uso” é a bateria moderna e não mais o bumbo como “aqueles usados em Indiana” que está presente.

Deve ser notado que não estamos demonizando a bateria, ou dizendo que sua utilização sempre, em qualquer circunstância, seja maléfica por definição. Já concordamos que Ellen G. White não condenou os instrumentos “per se“, mas sim o resultado sonoro e seus efeitos sobre os ouvintes.

O que estamos efetivamente dizendo é que devemos estar alertas quanto ao uso desta classe de instrumentos, pois a maneira que temos presenciado este instrumento sendo utilizado tende a ser – por vários motivos que não nos cabe detalhar neste espaço – exclusivamente para enfatizar uma marcação rítmica dançante, desconstruindo o ambiente de reverência e solenidade que deve caracterizar nossa aproximação a Deus (Testemunhos para a Igreja, v. 4, p. 73; v. 5, p. 493; Educação, pp. 242-243; Orientação da Criança, pp. 538-547; Evangelismo, pp. 277, 314; Mensagens aos Jovens, p. 266)

Falando sobre o uso de bateria na adoração, a Dra. Eurydice V. Osterman, compositora e professora de música na Universidade de Oakwood em Huntsville, Alabama – EUA, escreveu:

Dos três principais elementos da música – ritmo, melodia e harmonia – o ritmo é o elemento que oferece satisfação imediata, e não requer o grau de reflexão e contemplação que a melodia e a harmonia requerem. O aspecto característico da bateria e de outros instrumentos de percussão na música de hoje, é o de acentuar a batida suplantando a melodia e todos os outros elementos. Pesquisas científicas têm provado que quando o tempo entre o impulso e o repouso da música é rápido, apela mais ao físico. Por outro lado, quando o tempo entre o impulso e o repouso é mais lento, a mente é mais ativamente envolvida. Esta é a razão pela qual os jovens naturalmente se inclinam para a música que é rápida ou que tem uma batida enérgica. O fato de ela ser contemporânea é significativo e relevante para eles – o que eles podem entender. Isso apóia o raciocínio de que se alguém quer que Deus controle sua mente, é difícil que Ele o faça através de uma maneira que acentua o físico no lugar da mente. ‘Satanás sabe que órgãos provocar para animar, absorver e seduzir a mente, de maneira que Cristo não seja desejado. Os anseios espirituais da alma por conhecimento divino, por crescimento na graça, estão ausentes’ (White: Lar Adventista, p. 407).” (Dra. Eurydice V. Osterman – O Que Deus Diz Sobre a Música (Unaspress – Engenheiro Coelho SP), p. 71)

Para sermos fiéis à intenção original da mensagem e aplicá-la corretamente, precisamos respeitar a perspectiva do período de tempo e o lugar a que ela se refere. Como vimos anteriormente: “Quanto aos testemunhos, coisa alguma é ignorada; coisa alguma é rejeitada; o tempo e o lugar, porém, têm que ser considerados.[l]

Ellen White recebeu a visão sobre o movimento da Carne Santa em janeiro de 1900, oito meses antes de ele surgir em Indiana:

Mas em janeiro último o Senhor mostrou-me que seriam introduzidos em nossas reuniões campais teorias e métodos errôneos, e que a história do passado se repetiria.

As coisas que descrevestes como ocorrendo em Indiana, o Senhor revelou-me que haviam de ocorrer imediatamente antes da terminação da graça. Demonstrar-se-á tudo quanto é estranho. Haverá gritos com tambores, música e dança.

É melhor nunca ter o culto do Senhor misturado com música do que usar instrumentos musicais para fazer a obra que, foi-me apresentado em janeiro último, seria introduzida em nossas reuniões campais.

O Espírito Santo nada tem que ver com tal confusão de ruído e multidão de sons como me foram apresentadas em janeiro último.[li]

O primeiro parágrafo deste trecho é perfeito. É lamentável que – como já vimos anteriormente e veremos novamente em seguida – o articulista não se atenha a este princípio que ele próprio pretende defender. Este tema será retomado no trecho conclusivo desta réplica.

A real e mais grave falácia da argumentação apresentada é que neste ponto o articulista começa a introduzir o sofisma de tentar restringir a aplicabilidade deste texto unicamente à época contemporânea a Ellen G. White, congelando esta advertência a um momento específico de tempo. Segundo esta lógica, seria correto afirmarmos que nos nossos dias Satanás não está mais interessado em usar a música para enredar em seus enganos os crentes incautos. O absurdo desta conclusão a que chegamos, claramente rechaçada por Ellen G. White (Testemunhos para a Igreja, v. 1, pp. 497 e 506) demonstra o absurdo da falácia retórica empregada pelo articulista.

Conforme também já destacamos anteriormente, o período de tempo ao qual ela se refere é bastante específico: “imediatamente antes da terminação da graça.” Considerando que estamos mais perto da “terminação da graça” do que a época de Ellen White, a aplicação para os nossos dias tem primazia em relação a uma aplicação específica para sua sua época.

Além disso, que ela está se referindo a um tempo futuro ao seu, pode ser facilmente intuído através dos tempos verbais utilizados: “Demonstrar-se-á“, “haverá“, entre outros. Isso fica ainda mais claro no decorrer do texto completo, quando, a partir da página 38 ela aplica claramente a profecia ao futuro, quando escreve que “Essas coisas que aconteceram no passado hão de ocorrer no futuro…“. Este trecho, convenientemente omitido aqui pelo articulista, demonstra que, realmente, “para sermos fiéis à intenção original da mensagem e aplicá-la corretamente, precisamos respeitar a perspectiva do período de tempo o lugar a que ela se refere” mas, obviamente, esta aplicação precisa ser feita levando em conta a mensagem como um todo, e não somente os trechos que nos interessam.

É importante verificar que ela começa a falar de coisas a ocorrer em um momento futuro a partir do trecho iniciado com “As coisas que descrevestes como ocorrendo em Indiana“, ou seja, ela escreve depois do fato de Indiana ter ocorrido e ter sido relatado a ela pelo irmão Haskell, e não oito meses antes, quando ela recebeu a visão. Assim, vemos que o futuro descrito por ela é em relação à conferência de Indiana, e não em relação à visão que ela havia recebido em janeiro de 1900, como o articulista pretende sugerir.

Aliás, apenas para deixar todos os pontos claros, a referência que o articulista rotula como [li] é do volume 2 do livro Mensagens Escolhidas, e não do volume 1, como informado na nota de rodapé correspondente.

Veja como Arthur White, neto, biógrafo e depositário de Ellen White aplica a visão:

Ellen White recebeu a revelação do que iria ocorrer em janeiro de 1900 quando estava na Austrália. A obra estranha estava apenas se desenvolvendo em Indiana e ela viu o que ocorreria na reunião campal.[lii]

Primeiramente, note que para descrever a Carne Santa, Arthur White usa o mesmo termo, “estranha” que Ellen White usa para o que ocorreria “no futuro”, ou seja na reunião campal de setembro de 1900 quando o movimento aflorou. Sendo que a carta foi lida por Ellen White na Conferência Geral em abril de 1901, o “futuro” aqui também se refere à reunião campal que estava prestes a ocorrer dois ou três meses depois, no verão de 1901 se a heresia se perpetuasse na igreja Adventista. Portanto, Arthur White em seu relato do episódio aplica a mensagem da carta de Ellen White estritamente ao que ocorreu em Indiana em 1900-1901.

Realmente, as doutrinas defendidas pelos participantes do movimento da Carne Santa eram muito estranhas ao corpo de doutrinas da IASD, e isto se refletia em sua música. Ellen White se refere a estas doutrinas com as seguintes palavras:

Fui instruída a dizer aos de Indiana que estão defendendo doutrinas estranhas: Estais dando feição errada à preciosa e importante obra de Deus. Mantende-vos dentro dos limites da Bíblia. Tomai as lições de Cristo, e repeti-as mais e mais” (Mensagens Escolhidas, vol. 2, pág. 33).

Este trecho da mensagem profética encaixa-se perfeitamente àquilo que Arthur White se refere, pois aqui Ellen G. White está escrevendo acerca do movimento, suas ideias e doutrinas, e não de suas manifestações exteriores, como ocorre no trecho ao qual articulista quer, equivocadamente, fazer uma ligação inexistente no escritos da autora.

Novamente, neste ponto o articulista se enreda em seus próprios erros de interpretação. Conforme também já destacamos no início desta argumentação, o texto-base em questão, do livro Mensagens Escolhidas, volume 2 compõe-se, na verdade, de dois textos distintos de Ellen G. White, os quais, juntos, formam o terceiro capítulo deste volume.

O primeiro texto (pág. 31 a 36) é o discurso de Ellen White na Conferência Geral de 1901 e tem como foco central o combate à doutrina do movimento da Carne Santa.

O segundo texto, que abrange as páginas 36 a 39, é a resposta da Sra. White à primeira carta de S. N. Haskell e se concentra nas manifestações carismáticas, do ponto de vista físico, exterior, ocorridas durante a campal de Indiana.

No primeiro texto, em seu discurso feito à Conferência Geral de 1901, a Sra. White não se refere, em momento algum, ao futuro. Nem haveria necessidade desta referência, pois a serva do Senhor estava combatendo a heresia e o fanatismo daquele momento histórico. A única menção ao tempo futuro neste discurso é a seguinte:

“Não somos agora capazes de descrever acuradamente as cenas a serem representadas em nosso mundo no futuro; isto, porém, sabemos: que este é um tempo em que precisamos velar em oração; pois o grande dia do Senhor está às portas” (p. 35).

Ou seja, a única menção ao futuro é para dizer que ela não iria dizer nada acerca do futuro. O foco dela neste texto é sempre o seu tempo presente, onde ela ataca firmemente a doutrina da Carne Santa com as seguintes palavras:

O ensino dado com relação ao que é denominado “carne santa” é um erro.” (p. 32)

Fui instruída a dizer aos de Indiana que estão defendendo doutrinas estranhas: Estais dando feição errada à preciosa e importante obra de Deus. Mantende-vos dentro dos limites da Bíblia.” (p. 33)

São citadas neste texto manifestações semelhantes do passado, a fim de fazer uma comparação, mas o futuro não é descortinado. Para concluir o texto, ela volta a advertir sobre estes enganos em sua época presente:

Muitos movimentos dessa espécie surgirão neste tempo [seu tempo presente], quando a obra do Senhor deve manter-se elevada, pura, sem superstições e fábulas. Precisamos estar em guarda, manter íntima ligação com Cristo, para não sermos enganados pelos ardis de Satanás.” (p. 35)

Deus chama Seu povo a andar com sobriedade e santa coerência. Eles devem ser muito cuidadosos de não representar mal e nem desonrar as santas doutrinas da verdade mediante estranhas exibições, por confusão e tumulto.” (p. 36)

Porém, no segundo texto, a partir da página 36, em sua Carta 132 ao irmão S. N. Haskell, ela freqüentemente se refere – de forma inspirada – a um tempo futuro de data indeterminada, inclusive usando tempos verbais apropriados, no qual estes eventos e manifestações exteriores, com “tambores, música e dança” ocorreriam no meio da igreja, advertindo que seriam obra direta de Satanás, impingidos ao povo de Deus como se fosse obra do Espírito Santo, e que desta maneira seriam recebidos, representando grande perigo para a igreja.

Não podemos nos esquecer que, apesar de a revelação divina haver sido dada oito meses antes da campal em Indiana, a carta ao irmão Haskell foi escrita em resposta ao relato oferecido por ele dos acontecimentos daquela campal. Portanto, é cristalino o conceito que a expressão “hão de ocorrer no futuro“, não pode referir-se de àquela época, e muito menos ao próprio evento de Indiana, o qual já havia ocorrido e, portanto, estava no tempo passado.

Neste ponto da argumentação, o leitor atento estaria perguntando a si mesmo se o próprio texto do articulista, ao qual esta réplica se contrapõe, não seria um dos sinais do cumprimento desta profecia. Esta preocupação é pertinente, visto que este artigo pretende impor, no seio da Igreja Adventista, práticas condenadas enfaticamente por aquela que é considerada por este movimento como sendo inspirada por Deus para dar uma mensagem especial a este povo nos últimos dias.

O Pr. Jorge Mário de Oliveira, comentando acerca desta resposta de Ellen White ao irmão Haskell, escreve o seguinte:

“Analisando a forma como escreve a Haskell, percebe-se claramente uma linguagem escatológica. No contexto dessa carta, vê-se um profeta exercendo seu papel de revelador do futuro. Não que tenha a pretensão de fazê-lo, mas na autoridade da revelação recebida. Daí a relevância do conteúdo revelado.” (Pr. Jorge Mário de Oliveira – “A Música na Escatologia de Ellen White“) (18)

Para termos uma ideia desta contextualização futura, o texto da carta a Haskell se inicia com as seguintes palavras:

As coisas que descrevestes como ocorrendo em Indiana, o Senhor revelou-me que haviam de ocorrer imediatamente antes da terminação da graça. Demonstrar-se-á tudo quanto é estranho. Haverá gritos com tambores, música e dança. Os sentidos dos seres racionais ficarão tão confundidos que não se pode confiar neles quanto a decisões retas. E isto será chamado operação do Espírito Santo.” (Mensagens Escolhidas, v. 2, p. 36 – ênfase acrescentada)

Caso ela estivesse se referindo ao seu próprio tempo, o Senhor não precisaria revelar a ela que essas coisas “haviam de ocorrer imediatamente antes da terminação da graça“, pois elas já haviam ocorrido em outras ocasiões, como ela própria testemunha ao dizer:

A mesma espécie de influência se introduziu depois da passagem do tempo em 1844. Fizeram-se as mesmas espécies de representações. Os homens ficaram exaltados, e eram trabalhados por um poder que pensavam ser o poder de Deus.” (p. 37)

Se, conforme veremos adiante, podemos compreender o período “imediatamente antes da terminação da graça” como estendendo-se desde 1844 até o efetivo fechamento da porta da graça, então essas ocorrências do passado já se inseriam neste período profético e não faria sentido uma revelação dizendo que tais coisas ocorreriam (no futuro), mas sim que estavam ocorrendo (no presente).

O foco temporal deste segundo texto é, claramente, o futuro em relação à autora, conforme pode se depreender dos tempos verbais utilizados neste pequeno trecho e repetidos ao longo de todo este texto. Embora, assim, como no texto anterior, ela também cite o passado para fins de comparação, pouca coisa neste texto pode ser interpretada como conselhos para o seu tempo.

Assim, querer aplicar a carta ao irmão Haskell apenas ao período específico de 1900-1901 é uma falácia sutil; porém, mas que não se sustém diante de um exame detalhado do texto e certamente não foi esta a aplicação dada por Arthur White, como o articulista pretende nos fazer crer.

Ellen White continua dizendo que
Essas coisas que aconteceram no passado hão de ocorrer no futuro. … Deus convida Seu povo, que tem a luz diante de si na Palavra e nos Testemunhos, a ler e considerar, e dar ouvidos. Instruções claras e definidas têm sido dadas a fim de todos entenderem.

As “coisas do passado” não se referem ao movimento da Carne Santa, como se quer aplicar hoje, e sim a outros movimentos fanáticos que surgiram no Adventismo na década de 1850-60.[liii] Portanto, quando aplicamos “as coisas que aconteceram no passado” a Indiana em 1900, estamos ferindo a intenção original de Ellen White e potencialmente desvirtuando o sentido da mensagem. Mais sobre esse ponto a seguir.

O articulista tem razão ao dizer que a expressão “coisas do passado” não se refere ao movimento da Carne Santa, como muitos pretendem aplicar hoje. É evidente que o problema com o movimento da Carne Santa estava no presente. Portanto, ao se referir ao passado, ela está referindo-se a outros movimentos fanáticos que surgiram no Adventismo na década de 1850-60. Isto é bem claro em ambos os textos que compõe o capítulo 3 do volume 2 do livro Mensagens Escolhidas.

No primeiro texto ela começa a descrição das “coisas do passado” com o trecho “No período da decepção, depois da passagem do tempo em 1844, levantou-se o fanatismo em várias formas…” (p. 34).

No segundo texto, esta descrição inicia-se com “A mesma espécie de influência se introduziu depois da passagem do tempo em 1844…” (p. 37).

Abrimos aqui um parêntesis para ressaltar que esta própria repetição da descrição desses eventos passados é mais uma prova (embora desnecessária) de que o capítulo 3 engloba dois textos distintos, pois em um texto único essas repetições seriam redundantes.

Mas, aparentemente, em sua análise o articulista se esquece, convenientemente, da frase que ele próprio cita no início deste trecho, que diz “…hão de ocorrer no futuro“. Como pode ser verificado pelo leitor mais atento, esta expressão é uma conclusão do trecho no qual ela fala das coisas do passado. Depois de descrever os acontecimentos do passado ela fala:

Essas coisas que aconteceram no passado hão de ocorrer no futuro. Satanás fará da música um laço pela maneira por que é dirigida.” (p. 38 – ênfase acrescentada)

“…hão de ocorrer no futuro“. Esta pequena frase faz cair por terra a pretensa aplicação retroativa do texto profético ao período específico de 1900-1901, uma vez que ela, em sua carta de 1900 a S. N. Haskell, se refere ao futuro, em um período indeterminado.

Portanto, temos o seguinte quadro: O problema com o movimento da Carne Santa está ocorrendo no presente; ela diz que algo parecido ocorreu no passado “depois da passagem do tempo em 1844” e que, semelhantemente, voltará a ocorrer no futuro, “imediatamente antes da terminação da graça“. Ou seja, não há qualquer necessidade de confusão cronológica. À luz desta contextualização, quem então, está “ferindo a intenção original de Ellen White e potencialmente desvirtuando o sentido da mensagem“? Para compreender corretamente o sentido de uma mensagem escrita, basta ler o texto como ele se apresenta, utilizando metodologias de interpretação de texto que são ensinadas no ensino elementar, sem buscar malabarismos argumentativos para tentar forçar um significado que simplesmente não está ali.

Para ajudar no entendimento do uso correto da passagem em questão e a aplicação de seus conceitos ao culto e música adventistas hoje, dois pontos devem ser explorados:

Primeiro, Ellen White entendia que o tempo imediatamente precedente ao fechamento da porta da graça, quando esses elementos se apresentariam, era em seus dias.
Note que ao mesmo tempo que ela diz

“As coisas que descrevestes como ocorrendo em Indiana … haviam de ocorrer imediatamente antes da terminação da graça.”

ela complementa dizendo
“Muitos movimentos dessa espécie surgirão em nossos dias, quando a obra do Senhor deve manter-se elevada, pura, sem superstições e fábulas.” [liv]

Portanto, “em nossos dias” e “no tempo do fim da graça” para ela são sinônimos. Pelo contexto e aplicação geral da carta estritamente ao movimento da Carne Santa (como demonstrado por Arthur White), deve-se entender o “haviam de ocorrer” como sendo uma descrição do próprio movimento da Carne Santa que Deus revelou em janeiro de 1900 haviam de ocorrer em setembro de 1900, “nas reuniões campais”. Faz sentido em nossa perspectiva concluir que esse culto falso com tambores, gritos e coisas estranhas reapareceria hoje, “no futuro”, ou porque vivemos mais “imediatamente antes do fim da graça” mas para Ellen White, esse tempo era em seus dias.

O fato de a Sra. White esperar para os seus dias o fechamento da porta da graça não deveria ser estranho; todo aquele que vive acalentando em seu coração esta “bendita esperança”, a espera para os seus dias. Isto já era verdade na igreja apostólica, a ponto de ser necessário que Paulo instruísse a igreja a este respeito em II Tessalonicenses 2:1-3. Mas o próprio apóstolo Paulo, ao advertir a igreja, indica nos versos 7 e 8 a possibilidade de um cumprimento abreviado da promessa. Portanto, a possibilidade de Ellen White inserir-se, pela fé, neste período, não quer dizer que ela não tivesse uma visão clara dos períodos proféticos e dos sinais da Vinda do Senhor.

Já demonstramos anteriormente que o foco temporal da carta a S. N. Haskel é, claramente, o futuro em relação à autora e não vemos necessidade de repetir toda a argumentação aqui. A argumentação distorcida do articulista neste trecho é simplesmente um desenvolvimento das distorções apresentadas em trechos anteriores, as quais já foram cabalmente desmascaradas.

Devemos ter em mente que quando Ellen G. White fala em “imediatamente antes da terminação da graça” o evento profético escatológico relevante no contexto seria a própria terminação da graça e a repetição das “coisas que descrevestes como ocorrendo em Indiana” seriam somente o sinal de que estaríamos às vésperas deste evento.

Uma vez que já demonstramos que a autora coloca a repetição da balbúrdia e confusão de Indiana (ou seja, o sinal da proximidade da terminação da graça) em um momento futuro ao seu próprio tempo, fica óbvio que para ela a própria terminação da graça também estava em um momento futuro, ainda mais além.

Conseqüentemente, podemos concluir que, se a graça ainda não terminou (o que sabemos ser verdade), a observação da repetição daqueles acontecimentos em nossos dias atuais serve perfeitamente como sinal para a proximidade deste evento escatológico (a “terminação da graça“), o qual estaria “imediatamente” adiante de nós. Portanto, diferentemente do pretendido pelo articulista, este texto possui para nós uma aplicação muito mais real do que nos dias de Ellen G. White.

Mesmo que interpretássemos o ponto de partida da revelação como sendo contemporâneo ao evento de Indiana, como sugerido pelo articulista, ainda assim sua interpretação de “terminação da graça” não seria capaz de sustentar-se e sua aplicação para os nossos dias ainda seria válida, pois estamos muito mais próximos da “terminação da graça” do que os que viveram no período de Indiana. Ellen White não se enganou nesta predição, pois ela veio à tona por meio de uma frase que se iniciou com a expressão “o Senhor revelou-me“.

É interessante que no fechamento de sua ideia o articulista concorde com os argumentos que colocamos aqui, dizendo que “Faz sentido em nossa perspectiva concluir que esse culto falso com tambores, gritos e coisas estranhas reapareceria hoje, ‘no futuro’, ou porque vivemos mais ‘imediatamente antes do fim da graça’…“. Porém, surpreendentemente (ou não, considerando-se a linha distorcida de pensamento que deu origem a toda a argumentação do articulista) ele conclui negando aquilo que acabara de afirmar. Ora, se faz sentido aplicar a profecia para os nossos dias, porque então concluir de forma diferente, dizendo que “para Ellen White, esse tempo era em seus dias“?

Porém, um ponto muito importante deve ser enfatizado na argumentação apresentada neste trecho, o qual demonstra as graves distorções na argumentação defendida pelo articulista e que o induziram à conclusão equivocada de que “‘em nossos dias’ e ‘no tempo do fim da graça’ para ela [Ellen G. White] são sinônimos“.

Conforme já destacamos no início desta réplica, a argumentação está, mais uma vez, baseada em um erro crasso de exegese, porque se utiliza de pequenos trechos de dois textos totalmente distintos, tanto em contexto quanto em propósito, para tentar forjar uma linha de pensamento claramente diversa daquela proposta pela autora.

Senão, vejamos: a primeira citação feita pelo articulista encontra-se na página 36 do volume 2 do livro Mensagens Escolhidas e faz parte da carta 132, de 1900, ao irmão S. N. Haskell. Porém, a segunda citação, a qual o articulista pretende que seja um complemento da primeira, encontra-se na página 35 do mesmo livro, sendo parte de um discurso feito por Ellen White em uma sessão da Conferência Geral, tendo sido publicado originalmente no General Conference Bulletin, 23 de abril de 1901.

Desta forma, mesmo que os dois textos que compõe o capítulo 3 do segundo volume do livro Mensagens Escolhidas fossem um só, a segunda citação aparece no capítulo antes da primeira e, portanto, não é seu complemento lógico, como uma simples análise contextual demonstraria. Ocorre que, verdadeiramente, como já demonstramos, este capítulo não é formado por um texto único, o que agrava o erro e lança sérias dúvidas acerca da intenção do articulista ao forjar esta linha de pensamento, visto que esta divisão foi claramente indicada pelos compiladores.

E, ainda mais impressionante, é que o articulista não desconhece esta inversão das citações, pois a referência que o articulista rotula como [liv] traz, textualmente: “Mensagens Escolhidas, vol. 2, p. 36, 34 [sic].” Isto demonstra a inversão intencional das citações, buscando propositadamente a distorção do sentido original da linha de pensamento da autora.

O termo “imediatamente” também apresenta dificuldades. Quão imediatamente antes do fim da graça isso ocorreria? Duas semanas, 1 ano, 5 anos, 20 ou 100 anos?

Lembre-se que em Sua bondade, Deus não revelou aos seus profetas ou a Ellen White quanto demoraria tempo o fim. Daniel 8:26-27 diz que a visão era para dias “mui distantes” mas nem mesmo Daniel a entendeu, pois estava selada. Paulo ao falar da trasladação diz: “nós, os que ficarmos”, referindo-se à vinda de Cristo (1 Tess. 4:12); Jesus disse a João: “Eis que cedo venho” (Apo. 22:12) mas já se passaram 1900 anos; Pedro diz em 2 Pedro 3:8: “um dia para o Senhor é como mil anos, e mil anos como um dia”. Todos eles esperavam que fosse em seus dias.

Por essa razão, a expressão “imediatamente antes do fim da graça” têm um significado bem mais dinâmico do que um ponto específico no tempo. (Para todos os efeitos, no entendimento Adventista, depois de 1844 já estamos “imediatamente antes do fim da graça”). Na perspectiva, de Ellen White esse período incluía os fanatismos passados do Adventismo bem como o movimento da Carne Santa e não algo num futuro ainda distante, como nos nossos dias. Afinal, a advertência de que essas manifestações ocorreriam “no tempo do fim” precisava ecoar no coração dos ouvintes no contexto imediato de 1901.

Os Adventistas do Sétimo Dia não têm – ou não deveriam ter – dificuldades com declarações dinâmicas de tempo, quando se trata de períodos proféticos. Afinal, a nossa “bendita esperança” na volta de nosso Senhor Jesus Cristo baseia-se em declarações deste tipo, conforme os textos destacados pelo próprio articulista, entre tantos outros.

Aliás, o próprio articulista lança um problema (a nosso ver, inexistente) e ele próprio o soluciona, ao dizer que “em Sua bondade, Deus não revelou aos seus profetas ou a Ellen White quanto demoraria tempo o fim” e que “para todos os efeitos, no entendimento Adventista, depois de 1844 já estamos ‘imediatamente antes do fim da graça’“.

Se o período “imediatamente antes do fim da graça” se estende de 1844 até o efetivo fechamento da porta da graça, em um futuro breve, mas indeterminado, então qual é o problema em compreender que a declaração da serva do Senhor abrange até o final deste período? Qual seria a distorção lógica que nos levaria a concluir que essas declarações se aplicariam exclusivamente até o período que abrange o movimento da Carne Santa, ou seja, o “contexto imediato de 1901“? Será que a porta da graça fechou-se nesta época, encerrando assim este período? Obviamente que não!

Acreditamos, assim como o articulista admite, que estamos mais verdadeiramente no período “imediatamente antes da terminação da graça” do que estava Ellen White em 1900-1901. Sendo assim, não seria então o caso de estarmos mais verdadeiramente sujeitos a que esta profecia se cumpra em nossos dias e, portanto, em maior necessidade de atenta vigilância no que diz respeito às advertências expostas nesta profecia, do que a igreja daquela época? Por que então, não aplicarmos esta profecia aos nossos dias, aceitando para nós as advertências ali declaradas? O que nos levaria a criar tal distorção interpretativa que nos impedisse disto? Que cada um responda por si, diante de Deus.

Ainda falando na conferência geral de 1901 sobre o fanatismo de 1900, Ellen White disse:

“Prepare-se,” é a palavra que soa aos meus ouvidos. … Aquele que esta por vir virá e não tardará.”[lv]

E a resposta definitiva da igreja Adventista em repelir o carismatismo da Carne Santa é prova contundente de que a liderança entendeu que viviam “imediatamente antes do tempo do fim da graça”.

No discurso à Conferência Geral em 1901, a doutrina do movimento da Carne Santa é atacado direta e firmemente, usando-se sempre o tempo presente, ou seja, era um ataque que se referia a coisas que estavam ocorrendo naquele tempo específico. Esta não é uma mensagem profética em seu sentido escatológico, mas uma mensagem profética no sentido de uma mensagem de advertência da parte de Deus para o seu povo, em um tempo e lugar específicos. Note a temporalidade específica no tempo presente de frases como as apresentadas abaixo (ênfases acrescentadas):

Fui instruída a dizer aos de Indiana que estão defendendo doutrinas estranhas:Estais dando feição errada à preciosa e importante obra de Deus.Mantende-vos dentro dos limites da Bíblia.” (Mensagens Escolhidas, v. 2, p. 33)

Muitos movimentos dessa espécie surgirão neste tempo, quando a obra do Senhor deve manter-se elevada, pura, sem superstições e fábulas. Precisamos estar em guarda, manter íntima ligação com Cristo, para não sermos enganados pelos ardis de Satanás.” (Mensagens Escolhidas, v. 2, p. 35)

Já havíamos observado, mas voltamos a ressaltar que o discurso à Conferência Geral em 1901 trata-se de um texto diferente – em conteúdo e endereçamento – do texto da Carta 132, de 1900, ao irmão S. N. Haskell. Portanto, destacando-se mais uma vez a visão tendenciosa e a exegese distorcida do articulista, podemos notar que a repulsão da liderança ao movimento da Carne Santa não tem qualquer vínculo com a expressão “imediatamente antes do tempo do fim da graça“, mas sim com a contundência e firmeza da oposição a essas doutrinas espúrias, expressa de maneira inspirada por Ellen White em sua mensagem àqueles líderes em seu discurso à Conferência Geral de 1901, na qual, conforme já demonstramos, ela não cita qualquer evento futuro.

Segundo, assim como outras profecias na Bíblia (Jonas) e do Espírito de Profecia,[lvi] a continuação ou ressurgimento desse estilo de culto no Adventismo estava condicionado pela resposta da igreja às heresias que o fomentavam. Se as heresias doutrinárias que estimulavam esse culto caótico não fossem condenadas e removidas de maneira categórica, essas manifestações continuariam a ocorrer na igreja Adventista “em nossos dias”, “no futuro”, em 1901 e além. A música se tornaria “um laço” para perpetrar falácias teológicas e um culto espúrio. Mas ao mesmo tempo ela diz que Deus dá instruções para que isso seja evitado.

Afinal, havia a possibilidade de que as pessoas envolvidas no movimento da Carne Santa não acatassem ao conselho e continuassem em suas práticas, ou que a igreja como um todo ignorasse ou até estimulasse essas manifestações. Sendo assim, as heresias e o fanatismo do passado continuariam a ressurgir no futuro. Em suas palavras:

O fanatismo, uma vez iniciado e deixado às soltas, é tão difícil de extinguir como o incêndio que tomou conta de um prédio.[lvii]

Daí a necessidade de fortes advertências sobre a possibilidade de que o falso culto e suas doutrinas viessem a se enraizar e se repetir no futuro.

Este item da argumentação do articulista nos leva à beira da perplexidade, pois, depois de tentar – através de distorções da interpretação e amalgamações de trechos díspares – provar que a profecia sobre a repetição das manifestações de Indiana aplicava-se unicamente ao contexto daquela campal e ao problema do movimento da Carne Santa, de súbito o articulista admite a sua aplicação futura. O que ocorreu com toda a argumentação anterior? Se as palavras de advertência de Ellen G. White não se aplicassem a nós, por que buscar um argumento para a sua aplicação condicional “em nossos dias” e “no futuro“? Esta mudança de postura é indicativa da sua incoerência argumentativa, conforme temos destacado no decorrer desta réplica.

Porém, prosseguindo em sua linha argumentativa altamente tendenciosa e distorcida, vemos que o articulista pretende que a profecia escatológica delineada por Ellen G. White em sua carta ao irmão Haskell tenha um desfecho condicional. Para compreendermos o erro introduzido aqui e desenvolvido nos trechos adiante, será necessário um estudo deste assunto, a fim de que possamos compreender melhor as possíveis características condicionais das profecias. Veremos que existem algumas profecias que são claramente condicionais e há outras profecias que não admitem a condicionalidade.

Um exemplo de profecia condicional pode ser encontrado em Deuteronômio 11. Neste texto, especialmente os versos 26-32, Moisés coloca dois caminhos diante do povo: a morte e a vida; a bênção ou a maldição. Uma vez que é Deus quem está inspirando o discurso de Moisés, os dois caminhos são absolutamente verdadeiros, embora opostos. Como pode ser isto? Não seria uma contradição lógica? Não! Nestes versos, temos uma clara noção de que Deus coloca condições para o cumprimento de Suas promessas e advertências.

Portanto, quando Deus prometeu prosperidade ao povo de Israel, esta promessa era condicional à sua obediência (ver Apêndice, itens nrs. 5, 9 e 19). As profecias relativas a bênçãos ou juízos divinos sempre seguem este mesmo princípio dos “dois caminhos”, conforme podemos notar em muitas outras situações semelhantes. Por exemplo, a bênção do acesso à árvore da vida no Éden também era condicional à obediência do ser humano (ver Apêndice, itens nrs. 12 e 25). Da mesma forma, as bênçãos derramadas sobre Seu povo hoje também são condicionais (ver Apêndice, itens nrs. 3, 4 e 23). Também é condicional a promessa de que seremos, de forma pessoal, justificados e recebidos por Deus em Seu reino (ver Apêndice, itens nrs. 18, 20, 22, 26 e 29), assim como a brevidade de Sua volta (ver Apêndice, itens nrs. 1, 2, 15, 16 e 24).

Outro exemplo de profecia condicional são as advertências que Deus ordenou a Jonas que fossem dadas à cidade de Nínive (Jonas 1:1-2; 3:1-2, 4). Esta pregação parece indicar apenas um caminho, o caminho da destruição; mas o desfecho da história (Jonas 3:5-10) indica que o segundo caminho, o caminho da reconciliação e da bênção, estava implícito tacitamente na pregação de Jonas.

Outro texto em que o caminho da reconciliação estava implícito é o que relata quando Deus decidiu destruir as cidades de Sodoma e Gomorra, tendo declarado esta intenção ao Seu fiel servo Abraão (Gênesis 18:17-22). Esta declaração levou a uma das mais tocantes intercessões registradas nas Escrituras, conforme lemos em Gênesis 18:23-33. Ora, com base nas afirmações do próprio Deus de que o justo não seria destruído com o ímpio, podemos presumir que, caso Ló (ou outro mensageiro) houvesse advertido o povo daquelas cidades e alguns deles atendessem a esta advertência e se arrependessem de seus caminhos, aceitando o Deus Criador como Senhor de suas vidas, as cidades teriam sido poupadas. O próprio Jesus nos indica esta possibilidade, ao vaticinar sobre a impenitente cidade de Cafarnaum: “se em Sodoma tivessem sido feitos os prodígios que em ti se operaram, teria ela permanecido até hoje” (Mateus 11:23). A decisão divina de aplicar juízos contra aquelas cidades teria sido desviada de seu cumprimento e, por amor àqueles, a ira de Deus seria aplacada. É desta maneira que funciona o mecanismo da condicionalidade profética: através do amor de Deus.

Contudo, este mesmo amor nos leva a outra classe de profecias, as profecias relativas ao tempo do fim, ou escatológicas. Os objetivos dos juízos (ou bênçãos) locais e específicos que já ocorreram eram recuperar, advertir, mostrar o desagrado divino, servir de exemplo ou lição para – se possível – reconciliar, sendo, por natureza, condicionais. Deve ser notado que o objetivo dos eventos escatológicos é completamente diverso.

Com relação à destruição final do pecado e dos pecadores, Ellen G. White declara:

O Universo todo terá sido testemunha da natureza e resultados do pecado. E seu completo extermínio, que no princípio teria acarretado o temor dos anjos, desonrando a Deus, reivindicará agora o Seu amor e estabelecerá a Sua honra perante a totalidade dos seres que se deleitam em fazer a Sua vontade, e em cujo coração está a lei divina” (O Grande Conflito, p. 504).

Note que os juízos finais têm como objetivo o “completo extermínio” “da natureza e resultados do pecado“. Esta natureza do pecado está intimamente arraigada na natureza deste mundo e na natureza do homem caído; tudo isso precisa ser destruído para que o Universo possa ser purificado e o amor possa reinar supremo por toda a Criação (O Grande Conflito, p. 678). Por este motivo, apesar de serem uma obra do amor de Deus (e por isso mesmo) as profecias escatológicas não podem ser condicionais.

Por exemplo, sabemos que quando Jesus disse e repetiu “Eu voltarei”, ou “virei outra vez”, ou “quando o Filho do Homem vier” (Mateus 25:31; Marcos 8:38; Lucas 9:26; 12:37-40; João 14:3 e 8), nenhum de Seus ouvintes duvidou, mesmo que por um minuto, de que esta promessa era verdadeira, real, pessoal e incondicional. Da mesma forma, quando os anjos anunciaram a volta de Jesus àqueles que assistiam extasiados à Sua ascensão (Atos 1:10-11), nenhum dos presentes imaginou que seu comportamento ou suas decisões pudessem alterar esta certeza, embora sabemos que poderiam influenciar sua brevidade. Esta mesma esperança nos impulsiona hoje; por isso somos “Adventistas”.

Igualmente, quando estudamos as maravilhosas profecias escatológicas de Daniel ou do Apocalipse, não imaginamos que a nossa aceitação ou não da veracidade e aplicabilidade daqueles simbolismos possa alterar seu fiel cumprimento. A pedra que “foi cortada, sem auxílio de mão” (Daniel 2:34 e 45) certamente atingirá os pés da estátua e “esmiuçará e consumirá todos esses reinos, mas ele mesmo subsistirá para sempre” (Daniel 2:44). Este texto e seu significado não são relativos, condicionais ou meramente possíveis; pela fé eles são reais, embora ainda não tenham ocorrido. Da mesma forma, todos os grandes acontecimentos descritos pelos símbolos apocalípticos ainda não cumpridos serão realidade, quer o mundo os aceite, quer não. Estas profecias são tão verdadeiras que podemos dizer que elas tratam de “fatos” que ainda não ocorreram. Isto é verdade para todas as profecias de cunho escatológico.

Vemos assim que a condicionalidade não pode ser considerada uma característica inerente a todas as profecias divinamente inspiradas. Pudemos notar, pelos exemplos dados, que as profecias condicionais são aquelas que envolvem as bênçãos, promessas e recompensas ou os castigos, juízos e ameaças de Deus, e que ocorrem de maneira pontual e especifica no tempo. Ocorre que, como muitas dessas promessas ou ameaças são dadas de forma profética – como no caso da advertência que o profeta Jonas levou à cidade de Nínive – muitas pessoas confundem as coisas e pretendem que a condicionalidade seja aplicável a todas as profecias. Contudo, o estudo detalhado que fizemos deste assunto demonstra que isto não é verdade.

Concordando com este ponto de vista, Richard M. Davidson reconhece que há dois diferentes gêneros ou tipos de profecia preditiva: apocalíptico (por exemplo, as visões de Daniel) e não-apocalíptico (freqüentemente chamado profecia “clássica” ou “geral”). Dentre estes dois gêneros, o autor é enfático ao afirmar que a condicionalidade somente se dá nas profecias não-apocalípticas determinadas como clássica ou geral. No entanto no que diz respeito às revelações que determinam, se relacionam ou se estendem ao fim dos tempos em eventos escatológicos, não é possível haver condicionalidade. Segundo Davidson, em predições relacionadas ao fim do tempo, cabe apenas o “determinismo (o curso real dos eventos humanos, conforme moldados pela mão divina na história e reconhecidos pela presciência divina das escolhas humanas” (citado por George W. Reid em “Compreendendo as Escrituras: Uma Abordagem Adventista” – Unaspress, Engenheiro Coelho, SP – p. 184). Embora o autor esteja aqui abordando mais especificamente o Antigo Testamento, as regras de interpretação de condicionalidade ou determinismo são, na teologia bíblica, estendidas a toda a revelação.

Reafirmamos assim que as profecias escatológicas não podem ser condicionais, pois se fossem condicionais, então não haveria certeza do término do reinado do pecado, não haveria certeza da salvação e seria completamente vã a nossa fé.

Há ainda outro tipo de profecia escatológica, que é aquela que fala dos sinais que anunciam os eventos escatológicos. Estes sinais não são o evento final em si e também não têm a finalidade de ser um castigo ou uma bênção aos seres humanos, mas apenas servir de alerta ou advertência aos seres humanos para que se preparem para acontecimentos que certamente ocorrerão. Portanto, as profecias relativas a sinais do tempo do fim também não podem ser condicionais, visto que estão ligadas a eventos que não são condicionais. Mais uma vez, é uma obra resultante do amor de Deus para com Seu povo.

Este objetivo é encontrado, por exemplo, nos sinais da vinda de Jesus. Ao lermos o grandioso sermão profético de Mateus 24, não podemos conceber aqueles sinais ali descritos por Cristo como condicionais, dados de forma que possamos impedir ou desviar sua ocorrência através de nossas escolhas. Vemos esses sinais como marcos, alertas, sinais de advertência, a fim de que possamos conhecer a proximidade do fim dos tempos. Na verdade, o próprio Jesus nos informa que este é o Seu propósito, ao dizer: “Igualmente, quando virdes todas estas coisas, sabei que ele está próximo, às portas” (Mateus 24:33).

Obviamente que a brevidade com que esses sinais devem ocorrer, e conseqüentemente os eventos para os quais eles apontam, pode variar, de uma forma condicionada à obra a ser desempenhada pelo homem, porém nunca a sua ocorrência propriamente dita.

Isto posto, vemos que esta profecia que estamos analisando é escatológica, o que fica evidente pelo uso que a Sra. White faz da expressão “imediatamente antes da terminação da graça“. Se, como Adventistas do Sétimo Dia, acreditamos que a terminação da graça é um dos eventos finais da história deste mundo de pecado, então uma profecia que trate de eventos a ocorrerem neste período, ou imediatamente antes dele é, necessariamente, escatológica. Maiores detalhes podem ser encontrados no artigo “A Música na Escatologia de Ellen White(18) de autoria do Pr. Jorge Mário de Oliveira.

Portanto, é falsa a pretensão do articulista de que a advertência de Ellen G. White acerca dos acontecimentos “imediatamente antes da terminação da graça” tivesse cunho de evitar que tais coisas ocorressem. O evento profetizado, dentro do esquema profético dos eventos relativos ao tempo do fim é a “terminação da graça“, e este evento não pode ser impedido ou desviado. A repetição das “coisas que descrevestes como ocorrendo em Indiana“, colocado profeticamente em um momento futuro a Ellen G. White, seriam o sinal de que o povo de Deus estaria no momento “imediatamente antes da terminação da graça“. Desta forma, os “gritos com tambores, música e dança” não se constituem no evento principal da profecia, mas num sinal de um evento escatológico, não sendo, portanto condicional. Este sinal certamente deve ocorrer, mais cedo ou mais tarde, “imediatamente antes da terminação da graça“.

O objetivo da advertência inspirada – ao invés de tentar fazer com “que isso seja evitado”, como sugere o articulista – foi de servir de alerta aos vigilantes filhos de Deus para que, ao notarem o seu cumprimento, saibam de que o tempo da sua redenção está próximo e que é o momento em que precisam buscar um comprometimento e um relacionamento mais íntimo com Deus como nunca antes. A este respeito, o Pr. Jorge Mário de Oliveira explica:

O papel do profeta não é meramente mostrar o futuro revelado, mas orientar para que quando o futuro se torne presente, os filhos de Deus, sensíveis à voz da profecia, possam saber como agir e que decisões tomar. É exatamente isso que Ellen White faz na carta a Haskell.” (Pr. Jorge Mário de Oliveira – “A Música na Escatologia de Ellen White“) (18)

A aplicação destes sinais aos nossos próprios dias, contudo, se dá de maneira perfeita. É patente a todos os que se preocupam com essas questões que o que está ocorrendo na atualidade com relação ao contexto da adoração cristã confirma as palavras de advertência profetizadas há mais de 100 anos atrás. O Pr. Jorge Mário de Oliveira confirma esta análise do quadro atual ao dizer:

A música cria o clima propício ao emocionalismo, ao falso reavivamento. Ela tem este poder ilusório. A forma como se canta, o uso de instrumentos de percussão com seu efeito hipnótico onde predomina a repetição própria dos cultos espiritualistas do paganismo, as dissonâncias e o excesso de amplificação, têm criado um êxtase e uma falsa segurança que Cristo não prometeu. O mundo religioso atual tem-se envolvido no carismatismo espiritualista, do catolicismo à religiões orientais, cada qual com suas formas e nuances peculiares, tendo no entanto, o mesmo espírito a orientá-los: o espírito do mal, Satanás, o grande enganador.” (Pr. Jorge Mário de Oliveira – “A Música na Escatologia de Ellen White“) (18)

Este alerta é o verdadeiro propósito das palavras inspiradas, por mais que o articulista pretenda distorcer este significado. Inclusive, seria paradoxal se ele tivesse razão, uma vez que neste caso, ao final da Grande Controvérsia não haveria, enfim, uma controvérsia tão grande, nem o inimigo atacaria tão intensamente, pois já o teria feito nos tempos de Ellen G. White. O que se pode concluir é que o articulista fundamentou sua argumentação em hipóteses que são flagrantemente contraditórias ao contexto profético esperado para o fim, quando a intensidade de ação de ambos os lados do conflito terá, na verdade, atingido o seu grau máximo.

É fundamental também entender qual a intenção de Ellen White ao usar a expressão “a história se repetiria” no contexto da Carne Santa. Assim como na Bíblia, precisamos comparar o uso de palavras e expressões em vários contextos por Ellen White para entendermos corretamente sua intenção ao usá-la. Vejamos abaixo outros exemplos:

Há o perigo de que a história do passado venha a se repetir.[lviii]

A história passada se repetirá, … e o perigo ameaçará o povo de Deus por todos os lados.[lix]

Desprezam a evidência da operação de Deus e a história se repete.[lx]

E essa experiência se repetirá, a menos que o coração dos homens se convertam e se transformem completamente.[lxi]

Homens e mulheres que entendem a vontade de Deus devem ser escolhidos … para que os erros do passado não se repitam.[lxii]

A história de Datã e Abirã se repete hoje e se repetirá até o fim dos tempos. Quem estará ao lado do Senhor?[lxiii]

E ao mesmo tempo em que ela adverte quanto ao “perigo” de a história se repetir, ela diz:
As coisas do passado se repetirão. … Mas o povo de Deus … sabe onde está firmado. Eles devem ficam firmes como uma rocha.[lxiv]

Esta história se repetirá. … O povo de Deus finalmente triunfará sobre todo o poder das trevas.[lxv]

Nada temos que recear quanto ao futuro, a menos que esqueçamos a maneira em que o Senhor nos tem guiado, e os ensinos que nos ministrou no passado.[lxvi]

A pesquisa a várias ocorrências de uma palavra em um texto, ou em vários textos do mesmo autor ou época, é um recurso bastante utilizado na exegese, quando não temos certeza sobre o verdadeiro significado de uma palavra. Ao observar como uma palavra específica é utilizada em diferentes contextos, temos uma compreensão ampliada do seu significado. Porém, não acreditamos que haja qualquer dúvida com relação ao significado do verbo “repetir”, ou seja, neste caso, “voltar a ocorrer”.

Portanto, o que o articulista está fazendo não é a utilização do recurso citado acima. Ao analisar os trechos apresentados, notamos que foi feita simplesmente uma compilação de várias ocorrências de uma expressão, citando apenas fragmentos de frases, dissociadas de seu contexto imediato, a fim de tentar impingir a esta expressão o significado que ele já decidiu qual seria. Este é mais um recurso frontalmente contrário aos mais básicos princípios de exegese.

Não cabe aqui, por uma questão de espaço, uma análise do verdadeiro contexto de cada uma das citações, a fim de desmascarar a inconsistência da linha argumentativa do articulista. Basta ao leitor comparar os fragmentos citados entre si, a ver por si próprio se há alguma coisa de comum entre eles, além do verbo “repetir”.

Apenas gostaríamos de destacar, para que ficasse gravado indelevelmente na mente dos leitores a seguinte citação apresentada pelo articulista:

Nada temos que recear quanto ao futuro, a menos que esqueçamos a maneira em que o Senhor nos tem guiado, e os ensinos que nos ministrou no passado.” (Mensagens Escolhidas, v. 3, p. 162)

Este conselho é sábio e verdadeiro. A questão que se apresenta na mente do leitor que busca compreender verdadeiramente a vontade de Deus para os nossos dias é: quais são “os ensinos” que o Senhor “nos ministrou no passado“? Como os interpretamos e como os aplicamos aos nossos dias?

Deixamos a cargo de cada um meditar profundamente sobre essas questões, verificando por si, através da direção do Espírito Santo, onde está a verdade e onde está o erro.

Veja que há sempre a possibilidade de que a história não se repita ao nos colocarmos “ao lado do Senhor” entendendo “Sua vontade” e não nos esquecendo dos “ensinos do passado”.
Note também que ela usa a expressão de maneira incondicional somente ao se referir às profecias de Daniel a Apocalipse:

Estude Apocalipse em relação a Daniel; porque a história se repetirá.[lxvii]
A história se repetirá. A falsa religião será exaltada. O primeiro dia da semana … será estabelecido como a imagem de Babilônia.[lxviii]

Portanto, o uso dessa expressão por Ellen White ao se referir à história da igreja Adventista (ou do povo de Israel) denota sempre um “perigo” ou possibilidade de que a história venha a se repetir se os conselhos de Deus forem rejeitados.

Na visão de Ellen White a repetição do fanatismo, música e culto caóticos estava condicionada pela resposta da igreja Adventista como um todo às lições aprendidas no passado. Ao confrontar o movimento, Ellen White condenou de forma inequívoca os erros doutrinários que estimulavam o falso culto, alertando sobre o perigo real de que eles viessem a se manifestar continuamente no futuro. Os envolvidos em Indiana e a liderança da igreja em geral responderam e o movimento se desfez.

É importante entender esse aspecto de condicionalidade da visão, porque a interpretação corrente da expressão “a história de repetirá” implica que os “tambores” e outros excessos da música da Carne Santa vão se repetir a qualquer custo na igreja Adventista, a despeito do repúdio desses desde 1900 e da falta do fundamento teológico que os estimule. Tal interpretação acaba colocando a “bateria” como elemento fundamental da escatologia adventista, o que é em si, uma heresia.

Já discutimos detalhadamente acima acerca da questão da condicionalidade das profecias, bem como o fato de esta profecia referente ao “término da graça” ser escatológica e, portanto, incondicional.

Destacamos que neste trecho o articulista concorda com este ponto de vista ao dizer que “ela usa a expressão de maneira incondicional somente ao se referir às profecias de Daniel a Apocalipse“, ou seja às profecias escatológicas, presumindo que a omissão de referências ao grande sermão profético de Mateus 24 e a várias outras profecias relativas ao tempo do fim tenha sido apenas um lapso ou uma generalização por parte do articulista.

Uma vez que as profecias escatológicas são reconhecidamente incondicionais, podemos afirmar que também seus sinais – ou seja, no caso em que estamos analisando, a repetição da confusão cúltica corrida em Indiana – são incondicionais com relação à sua ocorrência, podendo haver alguma variação apenas quanto à brevidade.

A inferência feita pelo articulista a respeito da condicionalidade deste evento, relacionada a uma resposta por parte da liderança da igreja, não encontra qualquer respaldo ou consonância com o texto da própria autora. Notemos que, por um lado, a autora afirma que a história se repetirá e o povo de Deus deve ficar firme como uma rocha, citando textualmente (na página 38) os seguintes versos bíblicos:

Portanto convém-nos atentar com mais diligência para as coisas que já temos ouvido, para que em tempo algum nos desviemos delas. Porque, se a palavra falada pelos anjos permaneceu firme, e toda a transgressão e desobediência recebeu a justa retribuição, como escaparemos nós, se não atentarmos para uma tão grande salvação, a qual, começando a ser anunciada pelo Senhor, foi-nos depois confirmada pelos que a ouviram?” (Hebreus 2:1-3.)

Vede irmãos, que nunca haja em qualquer de vós um coração mau e infiel, para se apartar do Deus vivo. Antes exortai-vos uns aos outros todos os dias, durante o tempo que se chama Hoje, para que nenhum de vós se endureça pelo engano do pecado. Porque nos tornamos participantes de Cristo, se retivermos firmemente o princípio da nossa confiança até ao fim.” (Hebreus 3:12-14.)

Por sua vez, o articulista conclui – por algum raciocínio peculiar – que essa história se repetiria somente, e tão somente, se a igreja não adotasse uma posição firme neste assunto. Este tipo de raciocínio é perigoso, pois pode ser usado para anular qualquer profecia bíblica, conforme a conveniência ou crenças pessoais de cada autor, invalidando a revelação de Deus em prol de meras hipóteses.

Gostaríamos apenas de destacar um ponto no último parágrafo deste trecho. O articulista escreve que “os ‘tambores’ e outros excessos da música da Carne Santa vão se repetir (…) a despeito do repúdio desses desde 1900 e da falta do fundamento teológico que os estimule.

Com esta frase, o articulista admite – conforme temos afirmado – a posição histórica da IASD como sendo de repúdio aos tambores (instrumentos de percussão), bem como a outros excessos; assim como a inexistência de argumentos teológicos favoráveis a esta classe de instrumentos que justifiquem a sua aceitação em nosso meio, desde a época em que foi escrito o texto que estamos analisando.

Outros pontos da argumentação equivocada deste trecho já foram cabalmente refutados e repeti-los seria desconsiderar a capacidade de compreensão de nossos leitores.

Outro ponto importante a ser considerado é o fato de a “profecia dos tambores” não ser mencionada em nenhuma outra parte dos escritos de Ellen White. Quando ela menciona a Carne Santa em seus escritos posteriores, ela se detém à heresia teológica, e não aos “tambores”.[lxix]

Se estes ou a bateria moderna viessem se tornar uma ameaça constante à igreja até o fim dos tempos, era de se esperar que ela mantivesse a advertência sempre presente e a articulasse em outras cartas ou escritos ou até expandisse a visão de maneira específica. Mas ela não parece crer que, no contexto da igreja Adventista, a aplicação do termo “tambores” (‘drums’) transcendia o movimento da Carne Santa e se aplicava à bateria moderna (também ‘drums’) como vimos acima. O termo tambores na Carta 132 aplica-se estritamente ao movimento da Carne Santa.

O argumento apresentado neste trecho não se sustenta. Cabe a pergunta, meramente retórica: Quantas vezes uma profecia precisa ser repetida para que possa ser validada como sendo uma profecia aceitável?

É obvio que aceitamos como válidas “até o fim dos tempos” diversas profecias e instruções divinas que aparecem apenas uma vez no texto sagrado. Seria de se esperar que, por algumas profecias não terem sido repetidas inúmeras vezes, elas deixariam de ser válidas ou tivessem uma aplicação específica, apenas para aqueles que as receberam originalmente?

Foi comentado anteriormente que Ellen G. White não cita o tambor mais vezes simplesmente porque a igreja não tinha este problema, uma vez que a nossa posição histórica sempre foi de repúdio a esta classe de instrumentos. Da mesma forma, ela não fala acerca da maconha ou do crack nem mesmo uma só vez, mas todos reconhecemos, através dos princípios de saúde deixados por ela, que estas substâncias não são apropriadas para um cristão.

Esta linha argumentativa e a sua conclusão final, de que “O termo tambores na Carta 132 aplica-se estritamente ao movimento da Carne Santa” são apenas mais equívocos, resultantes da confusão em que o articulista se colocou logo de início, ao considerar como se fossem um só os dois textos que compõe o capítulo 3 do livro Mensagens Escolhidas.

E a história mostra que o culto em Indiana de fato se tornou uma dura advertência para o Adventismo sobre os perigos de heresias carismáticas que levam ao êxtase emocional e físico na adoração. Felizmente, graças ao conselho inspirado, podemos afirmar com segurança que não há no entendimento doutrinário Adventista do Sétimo Dia o pano de fundo para que essas heresias e seu respectivo culto floresçam novamente. Até hoje, mais de 100 anos depois, os excessos do movimento não têm se perpetrado em nosso meio. Para Ellen White e a igreja Adventista, o movimento da Carne Santa era causa e cumprimento da profecia.

No entanto, contextualizar a visão e a sua aplicação como faz-se necessário para se evitar extremos de interpretação, não significa que a advertência contra o fanatismo se limita a Indiana em 1900 ou que estejamos imunes a ele e seu falso culto. Como ela disse: “Quanto aos testemunhos, coisa alguma é ignorada; coisa alguma é rejeitada…” A passagem contém princípios transcendentes para evitar que a “história se repita”. A igreja deve continuar em sua vigilância seguindo o conselho da “Palavra e nos Testemunhos” para que heresias carismáticas e o fanatismo não se desenvolvam dando lugar ao culto e música caóticos da Carne Santa.

Concordamos em parte com o exposto no início deste trecho. Realmente o ocorrido em Indiana e a conseqüente repreensão severa por parte da serva do Senhor deixou bem claro o que Deus espera de Sua igreja com relação a um culto aceitável. Na verdade, ela deixou bastante claro que nosso arcabouço doutrinário não tem lugar para este tipo de culto.

Porém, apesar disso, infelizmente temos notado em nosso próprio meio, em certas congregações e em alguns eventos, ocorrências que mimetizam de forma preocupante muitos aspectos das manifestações carismáticas e de excitação aos sentidos que caracterizam o culto pentecostal. Temos visto pastores, comissionados pela IASD escrevendo artigos defendendo o uso de palmas e até de dança nos cultos (compreendendo a possibilidade de que estes pastores não reflitam a posição da Igreja, mas apenas uma opinião pessoal); temos visto músicas acompanhadas de coreografias, eventos de pirofagia e malabarismos, tietes gritando e lançando peças íntimas aos seus “ídolos”, e muito mais. Não cabe aqui a descrição detalhada dessas manifestações, pois o leitor que acompanha mesmo que de longe estes eventos, reconhece acerca do que estamos falando.

Na frase final do primeiro parágrafo deste trecho o articulista chega a conclusões que são completamente infundadas. Conforme já vimos, o evento escatológico ao qual Ellen G. White se refere é o fechamento da porta da graça e ela apenas indica a repetição das manifestações estranhas de Indiana como sendo um sinal para este evento profético. Uma vez que esta argumentação já foi apresentada acima, não a repetiremos aqui.

Mais uma vez, concordamos com o articulista quando este afirma que é necessário contextualizar corretamente “a visão e a sua aplicação“, para que possamos “evitar extremos de interpretação“. Este é exatamente o espírito que nos moveu a esta réplica.

Também concordamos que “A passagem contém princípios transcendentes para evitar que a ‘história se repita’“, no sentido em que podemos evitar sermos nós os causadores dos males profetizados. Podemos, ao dar ouvidos a estas advertências, evitar tomar parte nestes fatos, ou seja: a profecia deve se cumprir, ou é “inevitável que tais coisas aconteçam, mas ai daquele por meio de quem elas acontecem!” (Mateus 18:7).

A questão aqui é: estamos nós aplicando corretamente e vivendo de acordo com esses princípios? Ou estamos dando ouvidos a doutrinas enganosas (I Timóteo 4:1-2; 6:3-5), disseminadas por falsos mestres (II Pedro 2:1), deixando de dar ouvidos à vontade de Deus revelada através de Seus profetas?

Mas note que os “gritos com tambores, música e dança” da Carne Santa em 1900 não esgotam as manifestações espiritualísticas que ocorreriam desde meados do século 19 até o fim dos tempos. Prova disso é o que ocorre em igrejas pentecostais tradicionais onde o êxtase e as manifestações espiritualísticas podem ocorrer mesmo na ausência de música hipnotizante ou com percussão. Um exemplo é a Congregação Cristã no Brasil, que utiliza música tradicional e não permite a percussão em sua música mas onde o êxtase e “tudo o que é estranho” continua a ocorrer. No caso deles há “gritos sem tambores”.

Porém o fato de que outros grupos pentecostais usam tambores não fazem desses os originadores do culto com “ruído e confusão” necessariamente, porque o falar em línguas, exorcismos, curas, e outras manifestações estranhas são promovidos por sua teologia e não pela música. Daí a preocupação primordial de Ellen White em combater o entendimento doutrinário da igreja que poderia dar lugar ao falso culto, não o inverso. Por isso é inadequado cair no extremo de considerar a música ou um instrumento musical como o originadores de heresias teológicas e do falso culto como tem-se interpretado.[lxx][lxxi]

Aqui novamente vemos a importância de proteger a igreja da teologia que para Ellen White poderia dar lugar ao falso culto, seja com êxtase ou solene formalidade.

Atualmente, apesar do zelo de alguns em condenar qualquer nova dinâmica no culto como suspeita e ameaçadora, não há evidências de que os excessos do culto caótico em questão estejam sendo reintroduzidos na igreja Adventista ou que a “história esteja se repetindo” meramente pelo uso da bateria­, percussão, guitarra elétrica, contrabaixo ou música adventista contemporânea.

De acordo com o que o articulista afirmou em um trecho acima, o período de abrangência desta profecia “incluía os fanatismos passados do Adventismo bem como o movimento da Carne Santa e não algo num futuro ainda distante“, ou seja, esse período seria restrito no máximo ao começo da década de 1900. É interessante que, apesar de haver feito esta absurda afirmação, agora o articulista afirma o contrário, aplicando a profecia ao período “desde meados do século 19 até o fim dos tempos“. Mais uma vez, vemos indicações de incoerência na argumentação do articulista, o que deveria nos levar desconfiar da sua credibilidade.

O leitor que conhece o fenômeno neopentecostal compreende com clareza que a intensidade das manifestações carismáticas é marcantemente maior exatamente naquelas igrejas que baseiam a sua instrumentação para acompanhamento dos momentos de louvor na mesma formação instrumental características dos grupos de rock desde a década de 1950: bateria, guitarra elétrica e contrabaixo elétrico. Em algumas poucas igrejas evangélicas que não seguem este modelo de instrumentação em seus cultos não se nota a mesma intensidade nas manifestações carismáticas, embora elas ocorram. Porém, sua ocorrência é mais esporádica e não há tantas distorções extravagantes, tanto teológicas quanto cúlticas, como vemos ocorrer nas igrejas neopentecostais que utilizam este modelo.

Por que isto é assim? É óbvio que a teologia distorcida acerca dos dons espirituais e da ação do Espírito Santo tem um papel importante a desempenhar nisso, considerando que as manifestações carismáticas pentecostais começaram a ocorrer em 1900, no avivamento da Rua Azuza, em Los Angeles (EUA), antes, portanto, do invento da bateria.

Mas também é claramente evidente que a ênfase no ritmo sempre desempenhou um papel preponderante neste fenômeno, desde seus primórdios, ou seja, antes de a bateria ter sido inventada. Não que não houvesse instrumentos de percussão àquela época, mas nem sempre eles eram imprescindíveis; porém o ritmo era indispensável.

Em seus primórdios, a marcação rítmica era realizada mesmo sem a utilização de instrumentos de percussão, tamanha era a sua importância para a experiência o êxtase, conforme o texto abaixo:

Os cânticos religiosos que os negros aprenderam dos missionários não tardaram a receber o tratamento ‘hot’ (quente). Hoje conhecidos por ‘Spirituals’, verifica-se o bater de mãos e de pés em vez de tambores, e fazem uso coerente de frases sincopadas de um modo que corresponde exatamente a padrões conceituais da música africana. A ideia de música religiosa ‘hot’ já havia sido comunicada aos brancos do Sul quando do encerramento do período reavivamentista, durante o qual hinos pesadamente rítmicos eram úteis à indução do fenômeno de ‘possessão’, comum nos ‘camp-meetings’.” (Gilbert Chase, “Do Salmo ao Jazz“, p. 237)

Trata-se, evidentemente, de um mecanismo de reforço, como apontam os seguintes parágrafos:

Quem quer que tenha ouvido o ‘spiritual’ como deve ser cantado, sabe que é praticamente impossível ficar imóvel enquanto se escuta… O ritmo exige movimento físico. Os pés insistem em bater. Há um desejo quase irreprimível de levantar-se e lançar todo o corpo em movimento cadenciado“. (Robert W. Gordon, “The Negro Spiritual”, em “The Carolina Low-Country” (Augustine T. Smythe, 1931), p. 192).

Os pentecostais, por sua vez, enfatizam a experiência mística intensa, explorando a adoração que leva a um êxtase místico, que, naqueles grupos mais antigos, é atingido quando a música utilizada pelos adoradores (bastante dinâmica e ritmada) conduz à glossolalia (o falar em línguas estranhas)…” (Pr. Douglas Reis – “A Canção e a Vida: A Coerência Necessária Entre o Uso da Música e uma Vida Autenticamente Cristã) (19)

Quando hinos são ritmicamente tão irresistíveis que palmas, dança ou batida de pés é a resposta comum, podemos até estar nos divertindo, mas tais canções são, no final, auto-destrutivas. Qualquer música que tenha um impulso rítmico dominante e que induz a excessos e a respostas corporais não controladas agrada ao ‘eu’. Ela fornece ao ‘eu’ momentos agradáveis e joviais. Mas lhe falta a disciplina necessária ao amadurecimento. Quando a atenção está vinculada a uma resposta carnal, então a música da igreja já sucumbiu a uma centralização infantil no ‘eu’.” (Calvin M. Johansson, “Discipling Music Ministry: Twenty-first Century Directions” (Peabody, MA, 1992), p. 73)

É significativo que a tradução do título do último livro citado seja “Disciplinando o Ministério da Música: Diretrizes para o Século Vinte e Um“. Ou seja, o autor deste livro, um doutor em Artes e ministro Adventista, não está falando de denominações pentecostais ou de uma situação no passado, onde este problema ocorreu pontualmente, mas do fenômeno musical adventista como um todo, no século 21. Infelizmente, não temos conhecimento que este livro tenha sido publicado em Português.

Os responsáveis por esta réplica fazem parte daqueles que “buscam com zelonãocondenar qualquer nova dinâmica no culto“, como o articulista tendenciosamente sugere, mas advertir acerca de modelos cúlticos que as experiências do passado já demonstraram ser perigosas e contra as quais existem instruções claras, tanto da Inspiração quanto das obras pastorais e acadêmicas.

Ao analisar historicamente o contexto da adoração reavivamentalista americana, que levou à experiência desastrosa da campal de Indiana, podemos encontrar os seguintes fatores que estiveram presentes no processo que culminou com a aceitação daquele tipo de música em nosso meio naquela época:

– Perda do discernimento entre o sacro e o profano.

– Saque de músicas profanas para uso religioso.

– Falso conceito do Evangelho como meio de fugir à danação do Inferno.

– Teste de conversão baseado em emoções e não em aceitação racional de doutrinas que servem de novos rumos para a regeneração.

– Esforço para tornar o Evangelho mais acessível e fácil, ao nível do gosto popular.

– Enfim, a maneira pesadamente rítmica de cantar servia para induzir ao êxtase, e o fenômeno da “posse”. (Dario Pires Araújo, “Música, Adventismo e Eternidade“, p. 17) (20)

Cabem as seguintes perguntas, que cada um deve responder por si mesmo:

– Quantos destes itens estão se repetindo hoje?

– Esta repetição deve ser motivo de alerta?

– Esta repetição já seria um cumprimento do sinal do fechamento da porta da graça, delineado por Ellen G. White na profecia que estamos analisando?

– Analisando o contexto litúrgico atual, que tendência podemos observar: uma tendência em direção a uma maior solenidade no culto ou em direção a maior imitação de momentos de entretenimento mundanos?

O texto abaixo espelha de maneira precisa o caráter de muitos daqueles que gostariam de ter um culto mais “animado”:

Para alguns, os cultos não significam mais que um tempo agradável. Quando seus sentimentos são despertados, pensam que estão grandemente abençoados. Alguns não acham que são abençoados a menos que sejam agitados e exaltados. A intoxicação do excitamento é o objetivo que buscam; e, se o não obtêm, julgam tudo estar errado com eles, ou que algum outro o está.” (Mensagens Escolhidas, vol. 2, p. 21)

A própria autora indica que o motivo para este espírito é a “falta de fé em Deus.” (Idem)

Apesar de todos os fatos o que acabamos de apresentar, o articulista declara friamente que “…não há evidências de que os excessos do culto caótico em questão estejam sendo reintroduzidos na igreja Adventista ou que a ‘história esteja se repetindo’…” Ou o articulista é ingênuo, ou é alienado, ou tem a sensibilidade cauterizada, achando que tudo é normal. Até alguns anos atrás poderíamos dizer que o fenômeno da música fortemente ritmada com letra cristã era exclusividade dos pentecostais e que, por não termos uma teologia que favorecesse as manifestações de êxtase, estávamos “blindados” contra este tipo de experiência em nossos cultos.

Porém, isto não é mais verdade. Temos não apenas copiado os estilos musicais pentecostais em nossos cultos, como também temos fornecido músicas e músicos para o “abrilhantamento” de cultos extáticos. Este fato, sobejamente conhecido, demonstra uma equiparação de valores no âmbito musical. Sabendo que Satanás utilizará todos os meios disponíveis para enganar o povo de Deus – sendo que a música é a arma com a qual ele está mais familiarizado – poderíamos dizer com segurança que a profecia que diz “Satanás fará da música um laço pela maneira por que é dirigida” não está se cumprindo diante dos nossos olhos?

Como podemos esperar “proteger a igreja da teologia que para Ellen White poderia dar lugar ao falso culto” se estamos abertamente dando as mãos àqueles que praticam o mesmo tipo de culto condenado pela serva do Senhor?

Diante da óbvia pergunta que brota na mente de qualquer pensante: “Pode alguém garantir que esta porta que está se abrindo não nos levará a novas manifestações pentecostais em nosso meio?”, a resposta ainda mais óbvia e, sincera, seria, “não sabemos”. Porque não há como se saber. No entanto, as Escrituras nos dizem que “onde não há profecia, o povo se corrompe” (Provérbios 29:18). Para comprovarmos isto, bastaria dar uma olhadela para o arraial evangélico.

O que sabemos com certeza é que a profecia que estamos analisando certamente se cumprirá, pois como vimos, é uma profecia escatológica. Mas de que lado cada um de nós estará neste conflito?

Precisamos nos perguntar com franqueza:

1. É justificável comparar o caos total, gritos estridentes, pessoas cantando enquanto outras oram em voz alta, música ruidosa e hipnotizante que levavam as pessoas a desmaiarem e outras manifestações da Carne Santa com o culto adventista que usa música com a bateria?

Precisamos nos perguntar com franqueza:

1. É justificável ou espiritualmente responsável consentir e encorajar uma forma de culto que mimetiza as formas de adoração e os estilos musicais de denominações que dão valor salvífico às experiências de êxtase? Até quando podemos achar que o estímulo musical poderá ser aplicado sem que haja uma resposta? Para maior clareza, repetimos o texto abaixo:

A música cria o clima propício ao emocionalismo, ao falso reavivamento. Ela tem este poder ilusório. A forma como se canta, o uso de instrumentos de percussão com seu efeito hipnótico onde predomina a repetição própria dos cultos espiritualistas do paganismo, as dissonâncias e o excesso de amplificação, têm criado um êxtase e uma falsa segurança que Cristo não prometeu. O mundo religioso atual tem-se envolvido no carismatismo espiritualista, do catolicismo à religiões orientais, cada qual com suas formas e nuances peculiares, tendo no entanto, o mesmo espírito a orientá-los: o espírito do mal, Satanás, o grande enganador.” (Pr. Jorge Mário de Oliveira – “A Música na Escatologia de Ellen White“) (18)

Outro ponto a ser considerado é a sugestão, sutilmente inserida pelo articulista nesta pergunta, de que só devemos nos preocupar com uma situação quando esta chega ao “caos total”. Será que, na visão do articulista, é assim que os pastores devem cuidar de suas igrejas? Ou os pais de seus filhos?

2. Seria coerente chamar a música que usa instrumentos com os quais não estamos acostumados ou que apenas tem volume mais alto do que o habitual, ou um culto mais vibrante de “baderna e barulho, confusão e ruído”? 2. Seria coerente achar que um culto vibrante e dinâmico – no verdadeiro sentido espiritual dessas palavras – depende de fatores externos, planejados para a excitação dos sentidos? Ou será que é impossível termos um culto bastante dinâmico, alegre, poderoso, em Espírito e em Verdade (João 4:23-24) apenas pela operação do Espírito Santo na vida dos adoradores, sendo necessário simular a Sua presença por meio do êxtase incitado exterior e artificialmente, lançando mão dos mesmos artifícios e recursos utilizados em cultos tão claramente rejeitados por Deus?

Ellen G. White diz o seguinte acerca deste modelo de culto:

Tenho ficado muitas vezes penalizada ao ouvir vozes não educadas, elevadas ao máximo diapasão, guinchando positivamente as palavras sagradas de algum hino de louvor. Quão impróprias essas vozes agudas, estridentes, para o solene e jubiloso culto de Deus! Desejo tapar os ouvidos, ou fugir do lugar, e regozijo-me ao findar o penoso exercício. Os que fazem do canto uma parte do culto divino, devem escolher hinos com música apropriada para a ocasião, não notas de funeral, porém melodias alegres, e todavia solenes. A voz pode e deve ser modulada, suavizada e dominada.” (Evangelismo, pp. 507 e 508)

Não temos tempo agora para gastar em buscar as coisas que agradam unicamente aos sentidos. É preciso íntimo esquadrinhar do coração. Necessitamos, com lágrimas e confissão partida de um coração quebrantado, aproximar-nos mais de Deus; e Ele Se aproximará de nós.” (Evangelismo, p. 510)

Nossa posição é que a utilização destes estilos musicais e instrumentais no culto, como se pudessem complementar ou incentivar a obra do Espírito Santo, indica a perda de qualquer parâmetro acerca do caráter da obra do Espírito Santo, bem como de Seu papel na edificação da igreja. Indica ainda a falta de parâmetros sobre o papel da música no culto. Para maiores detalhes acerca da função da música no culto, veja o artigo “O Papel da Música na Adoração(21).

É digno de nota, ainda, que o articulista infira que a bateria poderia ser apenas um instrumento com o qual “não estamos acostumados ou que apenas tem volume mais alto do que o habitual“, reduzindo a controvérsia ao campo dos gostos e costumes pessoais. Este é um frágil, porém recorrente recurso, freqüentemente utilizado pelos que defendem a qualquer custo o uso da Música Cristã Contemporânea ou Música Gospel nos cultos. Porém, o dito popular “gosto não se discute” não se aplica a assuntos espirituais, quando a salvação está em jogo.

Ainda que a questão toda tratasse puramente de gosto pessoal – e obviamente não é este o caso – caberia lembrar que nossos gostos moldam nosso caráter e, portanto, precisam ser educados de acordo com o “gosto” de Deus, ou seja, com os padrões divinos.

Devemos nos lembrar que a Bíblia nos relata exemplos trágicos, nos quais pretensos adoradores buscaram a sua própria vontade, seus próprios padrões, ao se aproximarem de Deus: Caim (Gênesis 4:1-16); Nadabe e Abiú (Levítico 10:1-2; Números 3:4); Uzá (I Crônicas 13; II Samuel 6:1-8); Ananias e Safira (Atos 5:1-11).

Mas Deus anseia pela nossa adoração O texto bíblico diz que “… o Pai procura a tais que assim O adorem” (João 4:23). Para isto, precisamos nos amoldar ao Seu caráter. Ellen G. White diz o seguinte a este respeito:

Quando o caráter de Cristo se reproduzir perfeitamente em Seu povo, então virá para reclamá-los como Seus.” (Parábolas de Jesus, pág. 69)

O caráter de Cristo substituirá o seu caráter, e você será aceito diante de Deus exatamente como se não houvesse pecado.” (Caminho a Cristo, p. 62)

3. Considerando-se a importância da influência teológica sobre a visão do culto, é possível detectar alguma heresia carismática infiltrando-se na igreja Adventista como um todo hoje e que vá levar ao desenvolvimento desse estilo de culto, fazendo a história se repetir? 3. Considerando-se a importância da influência dos estilos musicais sobre a visão teológica do culto, é possível imaginar que a teologia Adventista permaneça isenta de heresias, caso continuemos aceitando em nosso meio os estilos musicais espúrios, característicos de cultos extáticos e acerca dos quais já fomos firmemente advertidos pela serva do Senhor?

Vejamos o que Ellen G. White fala sobre a influência da música na espiritualidade dos jovens:

Sinto-me alarmada quando presencio a frivolidade de moços e moças que professam crer na verdade… Possuem um apurado ouvido para música e Satanás sabe qual órgão excitar, incitar, absorver e fascina a mente de modo que Cristo não seja desejado. Desvanecem-se os anseios espirituais da alma por conhecimento divino, por crescimento em graça.” (Testemunhos para a Igreja, v. 1, p. 496)

O próprio articulista afirma, em um trecho anterior, que a “música se tornaria ‘um laço’ para perpetrar falácias teológicas e um culto espúrio.” Como é possível que, após ter feito esta constatação, a partir da análise do texto inspirado, seja levantada uma pergunta como a que se apresenta ao lado?

O mesmo articulista que fez esta pergunta escreveu uma resenha extremamente desfavorável e até mesmo mordaz ao presidente recém-eleito da Conferencia Geral, Pr. Ted Wilson, por seu sermão inaugural (disponível na íntegra aqui) (22). Esta resenha, que tem por título “Reflexões Sobre o Sermão de Ted Wilson” estava disponível no site mantido pelo articulista, tendo sido retirada recentemente, por motivos que ainda não estão claros e sobre os quais não nos cabe especular. (23)

Neste sermão o Pr. Ted Wilson incita a igreja a prosseguir em frente sem se esquecer dos marcos do passado, sem perder de vista seus valores históricos, e encorajando a igreja a buscar o reavivamento espiritual e a reforma de vida.

Ora, qual seria o motivo para o presidente da Conferência Geral falar em reavivamento e reforma, em retorno aos valores históricos, se não houvessem em nosso meio desvios destes valores? Ele próprio apontou várias dessas distorções, tornando desnecessário que as repitamos aqui. Apenas destacamos, em uma tradução realizada pelos editores do Música Sacra e Adoração (01), um trecho referente à música e à adoração, que é o assunto debatido aqui:

Não sucumbam à ideia equivocada que está ganhando apoio mesmo dentro da Igreja Adventista do Sétimo Dia, de aceitar métodos de adoração ou de esforços evangelísticos somente porque são novos ou da moda. Precisamos ser vigilantes para provar todas as coisas de acordo com a autoridade suprema da Palavra de Deus, e os conselhos com os quais fomos abençoados nos escritos de Ellen G. White. (…) Utilizem práticas de adoração e musicais centralizadas em Cristo e baseadas na Bíblia nos cultos na igreja, embora compreendamos que os cultos da igreja, cultos de adoração e culturas sejam variados através do mundo e respeitemos isso. Não retrocedam para ambientes confusos e pagãos, onde a música e a adoração tornam-se tão concentrados na emoção e na experiência que se perde o foco central na Palavra de Deus. Toda a adoração, seja simples ou complexa, deve fazer uma coisa e apenas uma coisa: enaltecer a Cristo e rebaixar o eu. Métodos de adoração que enaltecem a execução e o eu devem ser substituídos pela simples e doce reflexão de uma abordagem centralizada em Cristo e bíblica. Definir [esta abordagem] muito detalhadamente é impossível, mas quando lerdes as Escrituras, quando lerdes acerca da santidade da presença de Deus, o Espírito Santo os ajudará a saber o que é certo e errado.” (Pr. Ted Wilson – “Marche” (Sermão Pregado na 59ª Conferência Geral)) (22)

Especificamente a respeito da introdução de “heresias carismáticas” em nosso meio, o Pr. Wilson adverte:

Não se envolvam com movimentos ou mega-igrejas, centros externos à Igreja Adventista do Sétimo Dia, que prometem sucesso espiritual com base em teologia falha. Afastem-se de disciplinas não bíblicas ou métodos de formação espiritual que estejam enraizados em misticismo tais como “oração contemplativa”, “oração centrante” e os movimentos de igrejas emergentes nos quais eles são promovidos.” (Pr. Ted Wilson – “Marche” (Sermão Pregado na 59ª Conferência Geral)) (22)

Mais uma vez, qual seria o motivo para o presidente da Conferência Geral advertir contra a aproximação em relação a estes movimentos, se não estivesse ocorrendo atualmente (e já há algum tempo) esta aproximação?

Considerando a pergunta feita apelo articulista neste trecho, cabe ao leitor meditar e definir, com base nestes fatos, quem está defendendo a verdade.


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Parte 04 – Estilo da Música Parte 06 – O Uso da Percussão na Igreja Adventista desde 1900

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