por: Ivan Meyer
Nesta matéria, que continua no próximo Informativo, vamos abordar a execução dos “superagudos”.
Para se tocar no registro dos superagudos, é preciso conhecer e dominar as embocaduras do saxofone. Estas podem ser comparadas à de um trompete, que, na mesma posição de dedilhado, fazem várias notas com mudanças na embocadura.
Esse mecanismo é desconhecido pela maioria dos saxofonistas que tentam em vão tocar os superagudos lançando mão somente das posições, criando uma concepção errada de que, apertando ao máximo o lábio, conseguiremos atingir os agudos. Dessa forma, o que resulta são os apitos.
As posições dos agudos são pouco divulgadas e ajudam a frustrar o estudante, que então começa a atribuir a culpa por não dominar os superagudos às posições, à boquilha, à palheta, ao instrumento, namorada, cachorro, síndico, etc. Então ele espera que, com os anos de estudo, sua embocadura fique mais fiel. Mas os anos passam, o saxofone passa de pai para filho e nada de sair os superagudos.
De vez em quando sai um agudo, mas ele sempre falha na hora em que se precisa dele. Então, começa a achar que os superagudos é dom de alguns.
Os saxofonistas têm que conhecer e dominar as suas várias embocaduras que se diferenciam por :
- Pressão dos lábios sob a palheta
- Velocidade do ar
- Espaço interno da boca
- Posição da língua, que, dependendo do lugar onde se posicionar (mais para cima ou para baixo), mudará a emissão do harmônico e, conseqüentemente, a nota emitida.
Com a mesma posição de agudo, podemos fazer 4 ou 5 notas diferentes.
Antes de começar com os exercícios para dominar os agudos, é preciso ter consciência de alguns fatos :
O motor do saxofone é a boquilha, a estabilidade é a palheta e a aerodinâmica é o instrumento. Nós somos o condutor.
1a parte – Boquilhas
A primeira coisa que um saxofonista fala a outro é: que boquilha você usa? Essa tal boquilha já é uma lenda. O que sabemos é que a mesma boquilha tem som diferente (timbre), dependendo de quem a toca.
Existem boquilhas que têm o som mais brilhante e outras com o som mais fosco (aveludado). Há boquilhas de metal ,massa, fechada, com a câmara aberta ou fechada, coloridas, enfim, uma variedade que nos deixa confusos. Estão inclusive inventando boquilhas com acessórios, é uma confusão só!
Agora, certeza mesmo é que cada pessoa tem uma arcada dentária e uma boca diferente, fazendo com que a mesma boquilha seja ótima para uns e ruim para outros.
Algumas boquilhas foram inventadas com o intuito de facilitar a emissão de agudos (harmônicos) e outras são mais apropriadas para os graves. O que você precisa, juntamente com seu professor, é encontrar uma boquilha bem equilibrada para o seu tipo de embocadura
Em São Paulo, muitos conheceram o mestre Bove, que consertou por décadas os saxofones de diversos músicos. Uma das coisas interessantes que ele fazia era mexer nas boquilhas, colocando Durepox dentro para alterar a câmara interna. Conseguia assim mudar as características de som da boquilha (de grave/aveludado para um som mais brilhante), facilitando a emissão dos agudos e liberando o músico da mudança de boquilha. Atualmente, Aldo Bove Filho continua executando esta arte.
A boquilha é uma das peças mais importantes para a emissão dos agudos. Seus preços são muito variados.
Há boquilhas desenvolvidas para projetar harmônicos que, com certeza, são mais fáceis para a execução dos agudos. Isso não quer dizer que boquilhas que têm som mais aveludado ou grave não toquem nos agudos. Elas tocam, mas com o som mais apagado, sem brilho. Tem-se a impressão de soar menos nos agudos.
Procure uma boquilha que seja mais brilhante. Seu professor deverá conhecer várias com essas características.
2a Parte – Palhetas
Palhetas. Gosto de todas, desde que possa prepará-las a meu gosto! (consulte a matéria técnica Como Ajustar Suas Palhetas).
Em uma caixa com 10 palhetas, é muito difícil encontrar duas iguais. Cada uma tem sua personalidade. Umas são boas para graves, outras para agudos, outras um horror.
O melhor é saber preparar suas palhetas para o seu jeito de tocar e não ter que se adaptar a cada palheta. Isso atrapalha, pois seu som não cria uma personalidade. Numa determinada semana está metálico, noutra dá apitos ou não tem som nos graves. Assim não dá pé!
Temos várias marcas, todas muito boas para serem reguladas como você gosta. Algumas palhetas se parecem com bambu, mas são de fibra. Seu som assemelha-se às de bambu. O interessante é que esta palheta dura até seis meses ou mais, mantendo-se estável sem envergar ou perder suas características sonoras. Você não perde tempo regulando palhetas e estuda mais, conhecendo melhor o seu som (elas também são bem diferentes entre si e podem ser reguladas. Utilize uma lixa d’água bem fina e umedecida para fazer os ajustes).
Saiba que as palhetas são de lua e também mudam com as marés. Existem palhetas que liberam mais harmonia que as outras. Com o tempo, ao emitir uma única nota rapidamente, você notará se ela é boa para agudos, graves ou bem equilibrada.
3a Parte – Embocadura
Aqui mora o perigo. A embocadura é tudo no agudo. Comparo-a à construção de um prédio: quanto mais alto ele for, mais profunda deve ser sua base.
A embocadura para se tocar em 2 oitavas utilizada pela maioria dos saxofonistas não é a mesma para se tocar em 4 oitavas. Aquela que você usa para tocar com sucesso até hoje deve estar funcionado bem entre o Ré da primeira oitava e o Ré da terceira oitava. Agora, se você tem problemas fora desta região, significa que a sua embocadura está fora de lugar. Não diria errada, pois a embocadura que uso para tocar nos agudíssimos é a que você está usando, enquanto adoto uma outra para tocar nessa região mais grave.
Aí está o segredo! Para tocar nos superagudos, começo pelos graves. Quanto mais relaxados os graves, mais campo para os agudos, ou seja, quanto mais aberto o ângulo entre boquilha e palheta na região grave, maior será minha margem de extensão, pois, à medida que subo para os agudos o ângulo da boquilha se fecha. Se você começar com ela fechada, ao chegar nos agudos terá tal esmagamento da palheta com a boquilha que nenhum ar passará. O segredo é começar os graves o mais relaxado possível, quer dizer, com o ângulo entre a palheta e a boquilha o mais aberto possível. Você terá que descobrir que pode tocar a nota do meio tom abaixo soando um Si sem mexer na boquilha, somente relaxando o lábio inferior em relação à palheta, como se fosse uma batata quente na boca. Toque a nota Ré mantendo a relação de um tom entre o Dó, mas não esqueça que este Dó está com a afinação meio tom abaixo do normal. Isso foi feito com o relaxamento do lábio inferior. Se você tocar o Mi, ele também terá que manter a afinação relativa ao Dó, que, por sua vez, continua baixo.
Ao completar uma oitava fazendo a relação acima, e mantendo a afinação das notas entre elas, o Dó oitavado acima estará mais relaxado, com mais volume e brilho.
Em relação à boquilha e à palheta, o ângulo agora é maior. Então, você terá mais ângulo de boquilha para os agudíssimos. Da outra forma, você não teria mais ângulo entre palheta e boquilha.
4a Parte – Afinação
Como resolver a afinação do sax em relação ao diapasão?
Após abaixar a afinação da posição de Dó no saxofone, fazendo soar um Si, você agora afina pela boquilha, abrindo ou fechando. É importante não mexer a boca. Com isso, você conseguirá tocar os graves com mais facilidade, pois sua boquilha está aberta na boca.
Antes você estava com a afinação do Dó alta em relação à afinação real do saxofone. Em vez de abaixar a afinação do sax com o relaxamento da embocadura, você afinava seu instrumento pelo todel, mas agora aprendeu que se pode afinar pela boca. Isto é, conseguindo o ângulo mais aberto da embocadura, você estará na posição correta para ir até os agudos, fechando relativamente sem o perigo de, ao chegar na região superaguda, não existir mais ângulo.
Só irá tocar os agudos quem conseguir tocar os supergraves, pois eles são a base para se alcançar o alto.
Na próxima edição, iremos mostrar as posições mais adequadas para você tocar os superagudos.
Ivan Meyer é professor e autor de métodos de ensino de saxofone, além de ser responsável pelo site http://www.ivanmeyer.com.br
Fonte: Publicado na Revista Weril n.º 121