por: Joêzer Mendonça
Plantas gostam de Beethoven ou de Beatles? Alguns estudiosos têm feito essa pergunta diretamente às plantas e, segundo os experimentos, elas têm respondido de diversas formas. Umas murcham de tristeza com o 1º movimento da Sonata ao Luar, outras se assustam com os violinos arrepiantes do final de A Day in the Life. Algumas florescem ao som do risonho scherzo da 7ª Sinfonia e outras desabrocham ouvindo a delicada melodia Michelle, ma belle…
O experimento do parágrafo acima nunca aconteceu (pelo menos não dessa forma), mas o inventei para traduzir a controvérsia que cerca o resultado de pesquisas com plantas e sua reação ao som e à música.
Mas os fatos descritos a seguir realmente aconteceram: Charles Darwin procurou saber se a música influenciava o crescimento das plantas. Conta-se que ele sentou diante de uma Mimosa L. e tocou seu fagote para estimular o movimento das folhas dessa planta. A experiência foi um fiasco, mas despertou o interesse de outros cientistas. 100 anos depois de Darwin, pesquisadores da Universidade de Madras submeteram a Mimosa L. a 25 minutos diários de música Karnática (estilo do sul da Índia) tocada ao violino. Os autores relataram o aumento considerável do número de brotos, da produção de galhos e do número de folhas.
Os pesquisadores R. Klein e P. Edsall analisaram seis grupos de Tagetes erecta L. expostos a canto gregoriano, uma sinfonia de Mozart, jazz de Dave Brubeck, Beatles, uma big band – e um último grupo controle em silêncio. (Peraí, mas isso é experimento científico ou é uma happy hour?). As plantas recebiam a sonorização duas vezes ao dia e eram mantidas em ambiente com temperatura, umidade e fotoperíodo controlados. A experiência não apresentou resultados significativos entre os grupos.
Não há problema com uma pesquisa dessa ordem. Aliás, como diz Umberto Eco no indispensável Como fazer uma tese, não existe objeto de pesquisa que não seja digno de estudo, o que há são metodologias de pesquisa pouco nobres. Aí reside o problema. Quando avaliamos o impacto acústico, como a influência das freqüências sonoras sobre as plantas, temos um objeto de pesquisa. Quando, porém, as respostas biológicas dos vegetais ao fenômeno sonoro são transferidas para a área da recepção humana ao fenômeno musical, então temos um sério equívoco metodológico.
Há quem acredite que estilos musicais podem auxiliar ou corromper o desenvolvimento de uma planta. A notória experiência de Dorothy Retallack nos anos 70, é usada para atestar que os gêneros musicais afetam o crescimento dos vegetais, embora nenhuma outra experiência posterior obtivesse resultado semelhante. Naquele experimento, algumas plantas teriam crescido em direção às caixas de som que tocavam música clássica europeia e outras plantas teriam crescido em direção oposta à fonte sonora que tocava rock. Logo, se as plantinhas pareciam querer escapar do rock, os seres humanos deviam evitar o rock a todo custo. Sabe-se lá a que tipo de pauleira musical os pobres vegetais foram expostos, tadinhos.
Não podemos descartar a agressividade de muitas músicas à nossa fisiologia. De outro lado, não se pode negar que outras tantas músicas são capazes de tranqüilizar nossos nervos urbanos estressados.
No entanto, uma recente pesquisa do Instituto de Biociências da UNESP avalia que é “grande a dificuldade de se comprovar a possível influência de estilos ou composições musicais sobre um organismo vegetal” (p. 71).
Essa pesquisa relata que uma planta pode responder de maneira diferente a um mesmo estímulo sonoro. Vai depender se a frequência e a intensidade estão adequadas. Observou-se ainda que mesmo um ligeiro estresse pode ser benéfico ao desenvolvimento das plantas. Desse modo, uma maior amplitude sonora, se não for prolongada demais, contribui para uma melhor germinação.
As plantas não dependem de estilos musicais para sua germinação, mas da interação das ondas sonoras. Quando os resultados obtidos com plantas são usados para aplicação em seres humanos, ouve-se que tais e tais estilos e ritmos “mataram” os vegetais e outros tais estilos fizeram as plantas crescer fortes e viçosas. Contudo, o argumento unicamente biológico ou fisiológico não corresponde à totalidade da experiência humana, que é afetada social e culturalmente.
Plantas não são capazes de julgamento estético, não têm arquivo sonoro interior, não fazem opções musicais, não passam roupa ouvindo música, não cantam para os raminhos dormirem nem assobiam um hino quando estão felizes.
Além disso, seria preciso submeter os indivíduos às mesmas condições de controle das plantas dos experimentos. Somente sob padrões específicos e adequados de temperatura, luz e sonorização os vegetais apresentam as devidas reações. As pessoas teriam que experimentar ambientes semelhantes, o que não corresponderia à realidade acústica e musical vivida por aquelas pessoas em seu cotidiano.
Muitos dizem que certos estilos de música popular aceleram os batimentos cardíacos e transtornam os indivíduos. Entretanto, práticas esportivas ou um encontro entusiasmado entre amigos causam efeitos semelhantes. O problema com as músicas não será de ordem fisiológica (ou não apenas, se as pesquisas fossem conclusivas), mas de ordem cultural, intelectual e espiritual.
O estudo conclui dizendo que “todos os seres humanos têm um aparato sensório, neurológico, psicológico e cognitivo, que os permite responder a partir da interação que a percepção tem com seu histórico musical e mesmo estado emocional” (p. 78).
Como criaturas emocionais e intelectuais, podemos selecionar nossa escuta a partir do que faz bem para nossa estabilidade racional, inteligência e recreação. Como criaturas espirituais, podemos selecionar músicas que nos aproximem do Criador e mantenham nossa mente voltada para valores morais dignos.
Citações da dissertação de “Estudos sobre a ação de vibrações acústicas e música em organismos vegetais”, de Marcelo Silveira Petraglia (UNESP – Biologia Geral e Aplicada) – PDF da pesquisa disponível aqui.
Fonte: Nota na Pauta