Que é Boa Música?

por: Milton G. Crane

Muitas vezes os pais são levados a se decidirem a favor ou contra alguma coisa, e a seguir descobrem que há fortes argumentos contra a posição que assumiram. Com freqüência enfrentamos este problema em relação aos programas de rádio e TV ou escolha de música. Pelo fato de algumas coisas nesta vida não terem nada de bom em si mesmas, a classificação de um número musical, por exemplo em “bom” ou “mau” pode ser enganosa, devido aos muitos aspectos envolvidos.

A maioria dos adultos circunspectos e de jovens cristãos percebe que o diabo tem música que difere da música do céu. O problema neste ponto é sabermos como expressar coisas dignas e seguras nesta vida, em contraposição às que nos distanciam de Deus. Visto que Deus não nos deu um Index de cânticos proibidos, como podemos saber o que lhe agrada ou desagrada?

Parece que neste aspecto, bem como em outros da vida, Deus nos deu princípios normativos, e espera que os busquemos e os sigamos sob a orientação de Seu Espírito. Ao estudar este assunto, considerei, com especial interesse, vários trechos que nos indicam os princípios que regem a música que os seres celestiais apreciam. Citamos quatro deles:

“O bom canto é como a música dos pássaros – dominado e melodioso (…) As notas longamente puxados e os sons peculiares, comuns nos cantos de óperas, não agradam aos anjos. Eles se deleitam em ouvir os simples cantos de louvor entoados em tom natural”. – Evangelismo, p. 510.

“O som dessas felizes, irreprimidas vozes foi uma ofensa para os dirigentes do templo (…) Disseram ao povo que a casa de Deus era profanada pelos pés das crianças e sua aclamações de júbilo”. – O Desejado de Todas as Nações, p. 440.

“Satanás fará da música um laço pela maneira por que é dirigida” -Mensagens escolhidas, livro 2, p.38.

“Solenes responsabilidades recaem sobre os jovens, as quais eles consideram levianamente. A introdução da música em seus lares, em vez de estimular a santidade e espiritualidade, tem sido o meio de desviar-lhe a mente da verdade. Canções frívolas e a música das camadas populares da época parecem congeniais ao paladar deles. (…) A música, sem abusos, é uma grande benção. Quando, porém, mal empregada, torna-se uma terrível maldição. Excita, mas não comunica força e ânimo que o cristão só pode encontrar no trono da graça. (…) Ele [Satanás] é experimentado encantador, que os engana [aos jovens] até a perdição”. Testimonies, vol. l, p. 497.

Situo-me na faixa etária que se encontra no perigo de rejeitar qualquer coisa nova somente por ser nova e diferente. Quanto mais idosa é uma pessoa em maior número são os caminhos da memória que a levam a recordar-se. Nessas avenidas da memória acham-se antigas canções, antigos conceitos, e antigas maneiras de fazer as coisas. Às vezes a idade tende a produzir uma auréola no passado. Conscienciosamente, não quero rejeitar ou aceitar o passado ou o presente porque seja uma época acariciada ou moderna.

Embora reconhecendo a tendência da educação e do hábito, analisemos as partes da música separadamente numa tentativa de classificá-la. Por vezes convém ser exigente a ser liberal na área do conhecimento, de modo que as partes de um todo possam ser examinadas separadamente, em profundidade, antes de juntá-las para ver sua função como uma entidade. Para maior clareza, basear-nos-emos num diagrama. (Ver diagrama).

Parece-nos que deveríamos classificar a música em três categorias, e considerá-la na base de sete aspectos. Talvez o número de categorias e aspectos possa ter aumentado, diminuído, ou mantido, dependendo do discernimento de cada um; contudo, esta classificação nos tem sido útil em avaliar as músicas. Com a aplicação do diagrama podemos determinar os fatores de aceitação ou fatores apropriados de execução para cada cântico.

Preferimos não deixar lugar para preferências pessoais. Neste assunto, como em todas as coisas da vida, devemos guiar-nos por uma consciência submetida à direção e orientação do Espírito Santo. Teoricamente as avaliações devem ser feitas como se Deus considerasse as coisas. Praticamente temos de usar a razão santificada que vem de uma atitude pacífica com um objetivo, a preferir outras motivações que se nos deparam, e evitar o que seja desagradável ou se torne pedra de tropeço aos que possam estar à nossa frente ou atrás de nós na vereda cristã.

As Três categorias

As três categorias, conforme esta classificação, achamo-las necessárias por tratar-se de coisas espirituais, pois as coisas comuns são de duas espécies. Algumas das coisas comuns da vida não são más em si mesmas. As coisas inofensivas só se tornam prejudiciais quando usadas em excesso ou quando se tornam um ídolo. Há, por outro lado, coisas comuns que são más e degradantes.

Para ilustrar as categorias, consideremos uma profissão. O trabalho de um carpinteiro é uma benção quando feito para ajudar outros e edificar algo digno. Entretanto não seria oportuno armar uma carpintaria num templo dedicado a Deus, com martelos e serrotes trabalhando no Sábado. O mesmo critério aplica-se aos programas musicais comuns. Podem ser bons em seu devido lugar. Fora disto, a música popular ou sacra, como o trabalho do carpinteiro, pode ser usada para servir o diabo.

A exigência é mais do que bons motivos, mesmo importantes. As coisas devem ser feitas corretamente, a maneira de Deus, para lhe serem aceitáveis.

Os sete Aspectos da Música

A Melodia

É pela seqüência das notas, a melodia de um cântico, mais do que por qualquer outro aspecto, que lembramos e distinguimos uma música de outra. A melodia é a impressão digital da música. Esta pode ser deformada um pouco pelo ritmo ou arranjos, ou pelos malabarismos do teclado mas a melodia ainda identifica o número musical. Podemos mudar a letra ou o instrumento que a executa, e mesmo assim ela é reconhecida. Desde que a música é escrita com as palavras para o canto, os que ouvem interpretação dela associam mentalmente as palavras, a melodia, o ritmo, o instrumento e o executante ou cantor. Associam-na a determinado ambiente e a classificam consciente ou inconscientemente. Essa melodia tem um direito autoral na categoria de música com aquelas palavras. Pertence a elas por associação de ideias que ocorre em nos.

Para ilustrar o assunto, façamos algumas suposições. Suponhamos que há uma congregação que conheça bem a canção popular “Cidade Maravilhosa” e também com o hino 426 de nosso hinário, “Olha Para Cima”. Suponhamos que as palavras desse hino se adaptem musicalmente à música de “Cidade Maravilhosa”. Ora, se alguém , muito familiarizado com a letra de “Cidade Maravilhosa” cantada com sua própria melodia, fosse ouvir em seu lugar a letra de “Olha Para Cima” cantada com aquela melodia, teria uma perturbada reação mental. Isto aconteceria mesmo que o cantor fosse um cristão dedicado e fosse acompanhado calmamente por um órgão de tubos. Por outro lado, alguém que jamais ouvira “Cidade Maravilhosa” não teria essa associação de ideias, e poderia receber uma bênção da interpretação.

Em outras palavras, os fatores que determinam a categoria a ser posta num cântico especifico são, até certo ponto, motivados pelo ambiente do qual a melodia foi extraída, e isto é determinado pelo fato de o auditório tê-lo ou não ouvido. Seria a mistura do sagrado com o comum na mente de um auditório numa parte do mundo, e ainda não ser assim a alguém, em outra localidade, que jamais ouvira antes essa melodia.

Permitam-me fazer mais uma observação sobre a melodia. Há certas espécies de música clássica, para mim duras de apreciar. Refiro-me àquelas em que o acorde ou seqüência notas não formam um padrão melodioso, mas constituem uma sucessão de sons desconjuntados, não relacionados um com o outro.

Essa música é análoga à pintura moderna. Vê-se no cavalete do pintor um conglomerado de sombras e matizes. Mais exatamente há salpicos de cor, mas não organizadas para apresentar um quadro. Para se saber o que o artista tinha em mente é preciso aceitar a palavra do artista ou dispor de um intérprete altamente imaginoso. Duvido que essa espécie de música representará um problema moral. Não pode criar libertinagem mais do que os borrões do artista moderno possam retratar pornografia. Por outro lado, como pode isto apresentar uma clara lição espiritual?

A música é mais do que uma série de bramidos sônicos de “rock’n’roll”, executados com tão longa duração até que os músicos fiquem exaustos. É mais do que exercício de ginástica instrumental com o rótulo de música clássica ela deve ser melodiosa.

Compasso ou Ritmo

Não há provavelmente nenhum outro aspecto de um cântico que cause tanto desacordo entre os cristãos como o compasso ou ritmo de uma peça musical.. A geração mais jovem inclina-se para um ritmo que incite a participação do corpo físico com os processos mentais e a natureza espiritual. Parece-me que um bom hino pode compelir tanto a uma movimentação espiritual como física, dependendo do ritmo. Os critérios tornam-se, então, um pouco mais claros. Procura o músico, através do ritmo, edificar os presentes, ou deseja ele favorecer demonstrações físicas pelo auditório? Demonstrações físicas, estimuladas pela maneira em que um cântico é executado, podem ser apropriadas sob certas circunstâncias, mas batidas de pé, palmas, gritos, e danças não são apropriados numa igreja.

Letra

As palavras de uma melodia nem sempre são necessárias para transmitir uma bênção espiritual. Por outro lado, muitos hinos começam como poemas. A melodia veio ao autor da música depois que ouviu a letra. Para um adventista do sétimo dia, as palavras devem ser feitas para transmitir a verdade. As vezes é aconselhável reformular a letra de um hino de modo que o adventismo, em vez de protestantismo apostatado, seja ensinado pelo hino. Se não estou autorizado a alterar a letra a fim de corrigir um erro doutrinário, inclino-me, pessoalmente, a escolher outro hino, pois como poderia louvar a Deus cantando uma falsidade conhecida? As boas palavras de um hino expressarão, idealmente, o profundo sentido que anima quem mais aprecia e ama a Deus. As palavras de um hino devem ser mais do que frases superficiais, ridículas, triviais e ecumênicas. Elas devem criar um desejo de pureza interior, paz e santidade; não age como uma distração ou uma chupeta espiritual.

Os que estudaram letras de algumas músicas de “rock’n’roll” apontam o perigo das palavras que há em tais canções. As palavras percorrem todo o caminho provindo de frases sórdidas ou sensualmente provocativas, frases de desânimo, frases que sugerem suicídio ou drogas. Como podemos tolerar coisas como esta?

Instrumento

A espécie de instrumento musical empregado na execução de uma página musical é importante até certo ponto. Alguns deixam de receber a bênção da letra ou da música de um hino pelo fato de o acompanhamento ser feito com o violão. Talvez, daqui a algum tempo, o violão, o banjo, e a guitarra não venham a estar mais mentalmente associados a músicas de boate, ao “rock’n’roll” ou à cultura hippie, mas isto parece ainda demandar algum tempo.

Esta é uma área em que a educação de uma congregação pode ajudar muito. Os membros devem ser levados a considerar a música, a letra, a maneira em que ela é expressa, e ficar menos apreensivos acerca do tipo de instrumento utilizado. Um pouco de transigência, de ambos os lados, sobre esta questão, será de muito valor. Contudo, eu diria aos músicos que não é correto para o auditório que os artistas passem por alto os escrúpulos de formação, que há nas outras pessoas. Por que não podemos “preferir um ao outro” nesta questão, de modo que todos possam receber uma bênção?

Os Executantes

É-me sumamente grato, ao ouvir música religiosa, saber que os músicos dedicaram sua vida a Deus, e vivem de acordo com sua profissão de fé. Afinal de contas, a parte que o músico ou cantor desempenha na igreja é denominada ministério.

Não me sentiria bem, a despeito da maneira em que a música fosse executada, se os músicos que tocam o hino fossem artistas populares mundanos, da espécie dos que vivem desbragadamente na perversão e na imoralidade. Seu estilo de vida me viria à mente durante a execução, e interferiria com as bênçãos que ou poderia fruir.

Espécie de Programa

Afigura-se-nos óbvio que a escolha da música e o instrumento devem ser apropriados para a ocasião. Há um lugar para a comédia e o divertimento, mas devemos ser cuidadosos em não misturarmos o comum com o sagrado.

Deus é Santo. Os anjos velam a face diante dEle. Os cultos dedicados a Ele devem ser o melhor que podemos oferecer com nossas habilidades e talentos. Nas tribos primitivas, os instrumentos musicais eram simples, porém o melhor de que podiam dispor. Deus aprecia que Se lhe ofereça o melhor. Requintados instrumentos da sociedade civilizada soam de modo muito semelhante tão estridente aos seres celestiais como os instrumentos selvagens nos soam, mas, conhecendo este fato, não devemos ser levados a executar de maneira desleixada em instrumentos mal conservados. Cumpre-nos empenhar-nos para fazer o melhor.

Maneira de Apresentar

Volvamos às quatro citações que fizemos na introdução. A ênfase na primeira e terceira declarações é sobre a maneira em que a música e apresentada. Freqüentemente os artistas seculares apresentam uma música para chamar a atenção para sua capacidade como vocalistas ou para a agilidade técnica e virtuosidade como instrumentalistas. Há outros que, pelo movimento do corpo, chamam atenção para sua plástica e seus encantos físicos Certos movimentos corporais mais do que inocentes volteios, têm o objetivo de incitar pensamentos de imoralidade sexual.

O músico piedoso e não egoísta apresentará o número musical com humildade para produzir gozo e felicidade advindos da música, e não para atrair a atenção a sua execução. O músico cristão deve, por todos os meios, evitar atrair atenção sobre si mas, ao contrário, pela boa escolha da música e maneira de apresentá-la, dirigir o ouvinte mesmo sem O perceber para a mensagem e para a Pessoa que é o objetivo de seu ministério pela música.

Em resumo, cremos que devemos examinar a música em nossas igrejas, escolas, lares e a música-ambiente tocada em nossos hospitais e outras instituições, na base de, pelo menos, esses sete aspectos. Nós que amamos a Deus devemos ser uma luz a guiar o mundo. Devemos unir-nos para fazer calar com uma carranca (Mensagens Escolhidas, livro 2, p.29) os aspectos objetáveis da música, e estimular a boa música, apropriada para a ocasião.

Talvez uma maneira de guiar-nos em nossa decisão sobre a música apropriada para a ocasião seria formular várias perguntas como estas: Com o que geralmente esta música está associada? Onde tem ela sua origem? Teve ela origem em bares ou tabernas? Foi destinada aos salões de dança? Acha-se ela associada aos festivais de “rock” comprometidos com drogas e sexo?

Antes da época das vitrolas, do rádio, e da televisão, a recreação doméstica girava em torno de músicas simples, próprias para o lar. Muitas dessas canções contavam enredos inocentes. Sua origem e estilo tornavam-nas muito apropriadas em seu lugar. Outras não eram melhores do que certas óperas, com seu enredo trágico.

É imprescindível relacionar o número de música ao seu ambiente e ao auditório, pois isto é o que ocorrerá na mente dos ouvintes. A resposta é: Você, músico ou cantor, quer que seu auditório pense que você aprova o auditório do salão de bailes ou da boate, aprove a cultura hippie, ou você quer elevar a mente de seus ouvintes aos prazeres puros ou coisas espirituais?

Não se pode seguir livremente uma regra de culpa ou inocência pelo relacionamento, porque vemos um novo aspecto. Nos últimos anos muitas atividades estranhas tem sido observadas na plataforma de nossas principais igrejas na América. Em essência estão dizendo: “Algo está muito na moda”. Cuidado. Babilônia está caindo!

Nos últimos dias Satanás tentará induzir cada pessoa a fazer sua própria vontade. Ele quer que cada indivíduo seja o juiz de suas próprias atividades. Ele nos levará a crer que as normas não têm nenhum valor. Dirige nossos pensamentos para que o que quer que se faça seja correto. Ele quer que pensemos que uma coisa é boa apenas porque ela existe ou pode ser feita. (O Conflito dos Séculos, pp. 599 e 600). Ele quer enxovalhar a diferença entre o sagrado e o comum.

Cumpre-nos buscar a Deus para nos iluminar de modo que se possa estabelecer a devida orientação neste assunto. Podemos planejar em todas as áreas, musicais ou quaisquer outras, a fim de agradar-lhe. Não podemos fazer as coisas que o povo ao nosso redor faz. Ainda que Deus não condenasse os filisteus por transportarem a arca num carro, Davi não podia fazer isto como fez. Nós, como filhos de Deus, que recebemos maior luz, devemos atingir a norma que Deus nos deu. E Suas normas no são penosas. Elas conduzem à calma, paz e felicidade intimas.


Fonte: Revista Adventista, novembro de 1973 – pp. 12,13,14,15.