Música e Educação

por: Harold B. Hannum [1]


A música desfrutou destacado lugar nas antigas escolas dos profetas, no tempo de Samuel e Davi e mesmo nos séculos posteriores. Afirma o Espírito de Profecia que “os principais assuntos nessas escolas eram a Lei de Deus, com a instrução dada a Moisés, a história sacra, a música sacra e a poesia”. Através dos tempos, tem sido inegável o papel da música como um dos fatores na formação do homem. Neste artigo o autor encarece a necessidade de nossas escolas encorajarem a busca da excelência na música.


Ó Senhor, Senhor nosso, quão magnífico é o Teu nome em toda a Terra! (Salmo 8:1).

O propósito da educação é trazer de volta o homem em harmonia com o Divino – espiritual, física, mental e moralmente – e assim restaurar no homem aquela perfeição que ele tinha na criação original. Por este propósito a educação deve continuar além desta vida até a eternidade.

Grande ênfase através dos anos tem sido colocada no desenvolvimento físico e mental. O desenvolvimento espiritual tem sido interpretado mais ou menos com ênfase sobre a religião e a verdade doutrinária. O espiritual, como se aplica aos intangíveis encontrados num estudo de arte, não tem sempre recebido suficiente destaque.

A música, como uma das artes, é uma importante área de estudo no currículo da educação. Foi salientada nas antigas escolas dos profetas, no tempo de Samuel e Davi, e manteve destacado lugar em Israel. “Os principais assuntos nessas escolas eram a Lei de Deus, com a instrução dada a Moisés, a história sacra, a música sacra e a poesia[2] “.

Em diferentes períodos da História, a música tem executado parte importante na educação. Seu estudo tem sido reconhecido como necessário para tornar o homem um ser completo, bem equilibrado. Algumas vezes o estudo da música tem sido considerado como um estudo de técnica, uma prática no desempenho de atividades ou habilidades, e como um exaltado campo de entretenimento.

A música tem estes variados aspectos. Tem o lado técnico que demanda pensamento claro e lógico. Tem seu lado matemático no estudo da acústica e da ciência do som. Desenvolve habilidades motoras na execução de um instrumento ou no canto. Tem também grande valor recreativo.

Mas, além de tudo isto, está o valor da música como uma arte, como a expressão de sons ordenados da experiência, pensamento, imaginação e instinto criativo no homem. Através da música o homem tem expressado algumas de suas mais profundas experiências e entendimento do significado da vida. Como em toda arte, isto não pode ser traduzido em palavras ou algum outro meio, mas é sem paralelo em sua expressão musical.

Por exemplo, Bach deu-nos em sua “Paixão Segundo São Mateus”, uma interpretação, uma expressão do sacrifício de Cristo a qual não pode ser expressa de nenhuma outra maneira a não ser mediante os recitativos, as árias, os coros e os corais contidos nesta profunda peça-mestra de interpretação coral. Conceitos espirituais são expressos por meio desta música que tem enriquecido vidas de todos que aprenderam a apreciá-la. Nela existem verdades tão válidas como num fato científico.

A escola em todos os seus níveis deve ser o lugar onde o aluno possa prosseguir um estudo musical desta qualidade. O grande filósofo Alfred North Whitehead disse que a educação moral é impossível, a menos que tenha diante de si a visão habitual de grandeza. Pela contemplação somos transformados. Se estamos continuamente contemplando o magnificente em música e literatura, estamos realmente sendo transformados no melhor. Paulo expressa isto desta maneira: “Finalmente, irmãos, tudo o que é verdadeiro, tudo o que é respeitável, tudo o que é justo, tudo o que é puro, tudo o que é amável, tudo o que é de boa fama, se alguma virtude há e se algum louvor existe, seja isso o que ocupe o vosso pensamento” (Filipenses 4:8).

Tem havido progresso em nossas escolas, desde o fundamental ao curso superior, apresentando aos alunos o melhor em música. Isto tem sido feito através de corais, orquestras, bandas, conjuntos, e ensino particular e canto e instrumentos. Isto também se realiza por meio de cursos de literatura musical, teoria, contraponto, composição, história da música sacra, história da música, hinologia, estética e outras. Estes cursos estão fazendo muito para colocar diante dos alunos os grandes ideais a serem encontrados na melhor música. À medida que os alunos aprendem a amar a melhor música nas escolas, não se sentem felizes ao retornar às suas próprias igrejas sem nada fazer para melhorar a música. Cabe-nos também verificar que a música melhore em todas as nossas igrejas[3] .

A influência do rádio, televisão e Hollywood tem feito muito para popularizar as técnicas de entretenimento mundano. As invenções musicais da indústria de entretenimento têm produzido um tremendo impacto na educação, e sua influência nos membros da igreja se torna bastante óbvia nas ocasiões em que a igreja rejeita a música sincera e honesta, colocando no seu lugar algo banal e indigno proveniente do campo de entretenimento popular.

Um exemplo disto vê-se na ênfase dada a competições, concursos e programas que se baseiam em motivações opostas à ética cristã. É difícil, no campo musical, evitar o desenvolvimento de tendências de exibicionismo, busca de adulação e bajulação, mas nossos colégios estão procurando o caminho melhor [ou deveriam estar].

Num mundo em que a rivalidade e egoísmo são motivos dominantes, é algumas vezes difícil para os cristãos manterem-se distantes destas coisas em suas próprias vidas. Vêem-se competições e corridas pelo primeiro lugar em muitas áreas de atividade. Em anos recentes o número de competições musicais tem aumentado grandemente e a motivação de muitos músicos é alcançar algum tipo de prêmio. Esta influência até pode penetrar em nossas escolas, onde, em programas de variados tipos, se conferem prêmios como elementos de incentivo, o que toma precedência sobre qualquer outro motivo. Quando cada aluno determina fazer o seu melhor, é digno de recomendação e louvor. Mas, quando ele procura ultrapassar a outrem, seu motivo é duvidoso.

O lema de Bach era: “Somente para a glória de Deus”. Ele escreveu sua música e a executou nas igrejas de seus dias, para a glória de Deus. Hoje, o verdadeiro músico da igreja não está buscando mostrar habilidades técnicas ou satisfazer desejos egoísticos. Procura servir a igreja com bela música para a glória de Deus, e este espírito será o motivo dominante de músicos consagrados que ensinam nas escolas paroquiais.

Músicos eclesiásticos recebem muitas vezes rude crítica por apresentarem algo complicado ou difícil em técnica, porque julgam alguns tratar-se de uma apresentação de virtuosidade. Não se entende que esta música foi escrita para a glória de Deus e usada para este propósito por aqueles que dominaram suas dificuldades. Devemos ser cuidadosos em fazer juízo errôneo. Possivelmente alguns músicos são estimulados por motivos errados, mas aqueles que são sinceros, oferecendo louvor a Deus pela música, merecem nossa compreensão e bondade.

Em nossas escolas devemos encorajar a busca da excelência na música, bem como em outras fases da educação. Honramos nosso Criador quando aprendemos a compor, a executar, e a apreciar o mais puro e belo em música.

“Mais elevado do que o sumo pensamento humano pode atingir, é o ideal de Deus para com Seus filhos. A santidade, ou seja, a semelhança com Deus, é o alvo a ser atingido. A frente do estudante existe aberta a senda de um contínuo progresso. Ele tem um objetivo a realizar, uma norma a alcançar, os quais incluem tudo o que é bom, puro e nobre. Ele progredirá tão depressa, e tanto quanto for possível, em cada ramo do verdadeiro conhecimento. Mas seus esforços se dirigirão a objetos tanto mais elevados que os meros interesses egoístas e temporais quanto os céus se acham mais altos do que a Terra[4] “.


Notas:

[1] Agradecemos à Loide Simom por esta contribuição ao Música Sacra e Adoração. Aproveitamos a nota para enfatizar duas questões do presente artigo: 1. Concordamos com ele no sentido de que as escolas “eclesiásticas” (as que são associadas a alguma denominação religiosa) – do ensino fundamental ao superior – deveriam motivar em suas atividades músicas com a finalidade de elevar o aluno a um Deus que pede culto racional (Romanos 12:1). 2. O artigo de Hannum é válido para que percebamos o quanto um plano de erudição e de aperfeiçoamento musical, tentado por músicos Adventistas nos anos de 1978, foi sendo erodido e até abandonado nos dias de hoje (nota dos editores do Música Sacra e Adoração).

[2] White, Ellen G. Educação, p. 47.

[3] Infelizmente nós, do Música Sacra e Adoração, sentimos a necessidade de fazer um adendo a esse artigo de Harold Hannum. Hoje, nem mesmo nas escolas vemos mais essa preocupação com a qualidade das músicas ensinadas e executadas. Se “pela contemplação somos transformados”, a quem estamos contemplando através das canções de nossas escolas? Estamos sendo transformados sob a “Paixão Segundo São Mateus”, de Bach (o que nos levaria a uma elevação do pensamento para algo “claro e lógico”)? Ou sob algum som qualquer que nos subalterna a pensamentos obscuros e meramente sentimentalistas? Pensemos sobre isto… Aproveitamos a nota para explicar ao leitor que todas as palavras entre chaves são adições dos editores do Música Sacra e Adoração e não constam do artigo original.

[4]White, Ellen. Obra Citada, pp. 18 e 19.


Texto Bíblico:

Romanos 12:1 – 1 Rogo-vos pois, irmãos, pela compaixão de Deus, que apresenteis os vossos corpos como um sacrifício vivo, santo e agradável a Deus, que é o vosso culto racional.(voltar)


Fonte: Revista Adventista. Julho de 1978, pp. 41-2. A Revista Adventista publicou o artigo com a seguinte declaração: Este artigo, publicado com permissão do autor, corresponde ao Capítulo 7 do livro Music and Worship, de Harold H. Hannum, professor de Música na Universidade de Loma Linda, EUA.