Quando o Ministro Não Ministrou

por: Denis Nogueira

Quando era iniciante como membro adventista, sonhava em ajudar, ministrar no louvor, cantar hinos, tocar, formar grupos, cantores, corais, quartetos, compor para a igreja, fazer arranjos me afundar no universo musical, uma experiência mais que sublime na Seara do Senhor.

Numa dessas andanças pelas igrejas num período de férias de fim de ano com minha família, ocorreu um fato que acho importante relatar para reflexão do ministério musical. 

A Escola Sabatina estava se iniciando, havia alguns poucos membros naquela igreja, um piano elétrico Yamaha de armário, fechado. Nos momentos de louvor que antecedem ao inicio, não havia nenhum tipo de som, nem música de CD instrumental; silencio total, sem música, um vazio total. O templo tinha capacidade para trezentas pessoas se estivesse cheio, muito bem estruturado e construído, uma igreja realmente linda. É anunciado o primeiro hino. Com o som do CD do hinário todos ficam de pé e começam a louvar ao Senhor. Havia, em média, 12 pessoas presentes, a orquestração estava linda, as vozes do CD ecoavam por aquele lugar, que linda melodia. Todos cantamos, somente se ouvia a voz do CD. Oramos e iniciou-se o estudo da lição que, por haver poucas pessoas, foi passada geral.

Paro agora para pensar, será que esta realidade na igreja que relato é irreal ou fictícia? Será que não tem acontecido isto em muitas de nossas igrejas? Onde estão os cantores no louvor, os músicos para tocarem e soarem a trombeta do evangelho? Podem até dizer, “mas era período de férias, é normal estar assim, muitos foram viajar, e passear” (assim como eu fazia com a família), mas pergunto: e no sábado estão onde? Onde anda o diretor de música, o ministro que organiza o louvor?

Bem, não parou por ai: a escola sabatina é dada por encerrada, e alguns minutos antes de iniciar o culto divino, um dos anciãos me pede para ministrar os momentos de louvor congregacional, pois me conhecia como músico e maestro. Minha reação foi automática, recusei-me a fazê-lo. Isto foi estranho até para mim, pois tenho costume de ajudar e ministrar no louvor. Perguntei a ele, onde está o diretor de música? Viajou também, estamos sem ninguém, foi a resposta dele. Disse-lhe que se tivesse alguém que cantasse eu tocaria. Mas, como não havia ninguém que cantasse, não havia esta possibilidade. Enfim, e para minha surpresa, uma irmã simples e sem conhecimento musical foi louvar ao Senhor com a igreja, e os seus olhos e atitudes para com a igreja me impressionaram.

Ouvi-la naqueles momentos de louvor antes de iniciar o culto, levou-me a refletir sobre dois textos da bíblia.

O primeiro está em S. Marcos 12: 41 a 44 onde diz:

41 E sentando-se Jesus defronte do cofre das ofertas, observava como a multidão lançava dinheiro no cofre; e muitos ricos deitavam muito.
42 Vindo, porém, uma pobre viúva, lançou dois leptos, que valiam um quadrante.
43 E chamando ele os seus discípulos, disse-lhes: Em verdade vos digo que esta pobre viúva deu mais do que todos os que deitavam ofertas no cofre;
44 porque todos deram daquilo que lhes sobrava; mas esta, da sua pobreza, deu tudo o que tinha, mesmo todo o seu sustento.

O segundo texto está em S. Lucas 14: 16 a 25:

16 Jesus, porém, lhe disse: Certo homem dava uma grande ceia, e convidou a muitos.
17 E à hora da ceia mandou o seu servo dizer aos convidados: vinde, porque tudo já está preparado.
18 Mas todos à uma começaram a escusar-se. Disse-lhe o primeiro: Comprei um campo, e preciso ir vê-lo; rogo-te que me dês por escusado.
19 Outro disse: Comprei cinco juntas de bois, e vou experimentá-los; rogo-te que me dês por escusado.
20 Ainda outro disse: Casei-me e portanto não posso ir.
21 Voltou o servo e contou tudo isto a seu senhor: Então o dono da casa, indignado, disse a seu servo: Sai depressa para as ruas e becos da cidade e traze aqui os pobres, os aleijados, os cegos e os coxos.
22 Depois disse o servo: Senhor, feito está como o ordenaste, e ainda há lugar.
23 Respondeu o senhor ao servo: Sai pelos caminhos e valados, e obriga-os a entrar, para que a minha casa se encha.
24 Pois eu vos digo que nenhum daqueles homens que foram convidados provará a minha ceia.
25 Ora, iam com ele grandes multidões; e, voltando-se, disse-lhes:
26 Se alguém vier a mim, e não aborrecer a pai e mãe, a mulher e filhos, a irmãos e irmãs, e ainda também à própria vida, não pode ser meu discípulo.

Quantos de nós, assim como eu, nos recusaríamos a fazer a Obra do Senhor quando Ele chamar? Porém, muitas vezes fazemos como os ricos, que dão “grandes ofertas”, ou seja, grandes louvores, e músicas de alto nível; só cantam com muita gente assistindo, em pleno sábado, onde serão mais vistos, e receberão elogios pela sua performance, por suas técnicas instrumentais, e/ou performance vocal no ministério. Será que Deus terá de chamar os pobres e simples para fazer neste ministério como na parábola? Será que seu povo, que tem a verdade (e conhecimento técnico para isto), não irá fazer um verdadeiro louvor na Sua Casa?

Muitas vezes nos esquecemos do louvor sincero e de coração, com singeleza e simplicidade. Onde andam os cantores, para cantarem nas casas dos doentes, enfermos, viúvas, órfãos, os enlutados em suas lutas e dor, que estão em suas casas tristes e sozinhos? Onde estão os ministros que pensam nos faltosos da igreja, aqueles que há meses não aparecem no templo do Senhor? Precisamos pensar mais na preservação dos membros de nossa igreja, muitos estão saindo pela porta de trás.

Ellen White diz fortemente ao meu e seu coração:

“… a instrução no canto é grandemente necessária… podem fazer muito bem como cantores evangelistas. Eles encontrarão muito ensejo de empregar o talento que Deus lhes deu, levando melodia e claridade a muito lugar solitário e entenebrecido pelo pecado e a dor e aflição, cantando para aqueles que raramente têm os privilégios da igreja… ide a caminhos e valados. Empenhai-vos por alcançar tanto as classes mais ricas como as mais pobres. Entrai nos lares de ricos e humildes e assim que tiverdes oportunidade, perguntai: ‘Poderíamos cantar para o vosso deleite?’… Deste modo, à medida que os corações se suavizam, o caminho pode-se abrir para que possais oferecer algumas palavras de prece pela bênção de Deus. Poucos recusarão. Tal ministério [de música e visitação] é um genuíno trabalho missionário. Deus deseja que cada um de nós converta-se e aprenda a se engajar em esforços missionários de modo diligente. Ele nos abençoará neste serviço pelos outros e veremos Sua salvação (grifos acrescentados).” – Review and Herald, 27 de agosto de 1903. [Trechos em Evangelismo, p. 504].

É meu caro amigo, após anos estudando, planejando, organizando musicalmente corais, grupos, duetos, trios e quartetos, dando aulas de canto, compondo, ensaiando, fazendo arranjos, escrevendo sobre ministério musical, fazendo de tudo que se possa imaginar num ministério musical, deparo-me com uma situação tão triste e reflexiva. O músico que está praticando sonoridade todos os dias, se recusa a fazer o ministério que Deus chamou; e uma senhora simples, de poucos conhecimentos musicais, e até falta de experiência na ministração, começa a louvar o Senhor com o coração e entendimento.

Ouvi Deus falando a mim, ministro chamado por Ele, e ao mesmo tempo, pobre e pecador. “Filho… esta viúva pobre (a irmã que ministrava) deu mais do que todos… deu tudo o que tinha para viver.”

Que ministério é o seu, o que pensas fazer para o Senhor? Depois deste acontecido, me entrego todos os dias para o nosso Deus orando pedindo mais humildade pelo que fiz, e tenho trabalhado incessantemente para que outros não façam o mesmo. Logo em seguida, assim que acabou o culto, parabenizei aquela querida irmã que, de pronto, se dispôs a ajudar; e ao ancião pedi desculpa pela minha insensatez. Mas, ao mesmo tempo, pensei em quantos querem somente fazer seus shows de talentos no templo, mostrar o quanto sabem. Não estou dizendo que temos de fazer um louvor ruim na qualidade e execução, mas onde estão os ministros? A seara é grande e os ceifeiros, poucos.

Quero terminar minha reflexão com a declaração de um músico reconhecidamente aceito em nossa igreja, o irmão José Newton, da Casa Publicadora Brasileira, onde ele diz o que pensa sobre o ministério.

“No tempo do povo de Israel Deus designou um grupo de levitas que eram responsáveis pelo Ministério da Música. Eles cantavam, tocavam, compunham e ensinavam o povo a cantar.

De alguma forma este Ministério ainda existe. Há um pequeno número de obreiros que trabalham nos colégios e instituições e um grande (enorme) número deles que o faz voluntariamente.

Eles estão em cada cidade, em cada congregação. Muitos deles não têm o preparo, não têm formação, mas dão do melhor de si para que a música da igreja cresça e os membros sejam abençoados com bonitas e apropriadas mensagens musicais a cada reunião da igreja. Há que se olhar com carinho para este exército anônimo de ministros que se reúne a cada sábado para ensaiar, aprender e cantar; que gasta do seu tempo, da sua energia andando, caminhando, correndo, pedalando, remando para chegar aos locais onde vão ensaiar ou cantar; e de seus recursos com passagens de ônibus, gasolina, seus próprios veículos para transportar equipamentos de som, pastas, partituras, CDs, etc. Nem tudo na igreja é perfeito, há muito o que se melhorar, mas dou graças ao meu Deus que mantém acesa a chama do serviço no coração deste enorme exército de ministros. Em muitas ocasiões eles não recebem reconhecimento, mas errando e acertando, andando, tropeçando, caindo e levantando-se continuam prosseguindo para que o Ministério continue.”- José Newton — Gerente artístico da MUSICASA, Compositor, Arranjador, Produtor Musical e Editor do Hinário Adventista.

Pode parecer duro para alguns, para outros pode ser uma verdade latente, mas ainda há tempo de mudar e melhorar o ministério e precisa começar comigo e você.

Em Isaias 58:6-11 encontramos o seguinte texto, que cala fundo na alma:

6 Acaso não é este o jejum que escolhi? Que soltes as ligaduras da impiedade, que desfaças as ataduras do jugo? E que deixes ir livres os oprimidos, e despedaces todo jugo?
7 Porventura não é também que repartas o teu pão com o faminto, e recolhas em casa os pobres desamparados? que vendo o nu, o cubras, e não te escondas da tua carne?
8 Então romperá a tua luz como a alva, e a tua cura apressadamente brotará. e a tua justiça irá adiante de ti; e a glória do Senhor será a tua retaguarda.
9 Então clamarás, e o Senhor te responderá; gritarás, e ele dirá: Eis-me aqui. Se tirares do meio de ti o jugo, o estender do dedo, e o falar iniquamente;
10 e se abrires a tua alma ao faminto, e fartares o aflito; então a tua luz nascerá nas trevas, e a tua escuridão será como o meio dia.
11 O Senhor te guiará continuamente, e te fartará até em lugares áridos, e fortificará os teus ossos; serás como um jardim regado, e como um manancial, cujas águas nunca falham.
12 E os que de ti procederem edificarão as ruínas antigas; e tu levantarás os fundamentos de muitas gerações; e serás chamado reparador da brecha, e restaurador de veredas para morar.

Primeiro Deus te diz o que deve ser feito: “soltes as ligaduras”, “desfaças as ataduras”, “repartas ao faminto”, “recolhas em casa”, “deixe livre”. O que você tem feito no teu ministério? Só tem cantado em igrejas cheias, ou teu louvor está sendo feito nos outros lugares solitários e a casa dos doentes? Depois tudo isto, Deus te dá promessas maravilhosas: e então “romperá Tua alma”, “a tua cura”, Ele “será tua retaguarda”, “te responderás”, “te guiará”, “te fartará”, “fortificará”, “serás um manancial”. E, finalmente, termina com uma missão: “serás chamado reparador de brechas e restaurador de veredas”, levantarás ao caído, preservarás o que dentro está!

Que Deus te ilumine e te transforme para Sua honra e glória! Amém!


Denis Nogueira é graduado em Composição/Regência e Licenciatura Plena em Música pela Faculdade de Música Carlos Gomes