Música Propicia Estado de Êxtase e Transe em Igrejas Pentecostais

Juliana Kiyomura Moreno


“No decorrer do culto há uma gradação sonora e musical até o seu ápice que é quando alguns fiéis são agraciados pelo recebimento do Espírito Santo”

O uso da música como meio para chegar a um estado de êxtase e transe religioso vêm se tornando comum em igrejas de diversas religiões em todo o mundo. A partir dessa constatação, uma pesquisa do Instituto de Psicologia (IP) da USP analisou essa prática em algumas Igrejas Pentecostais da cidade de São Paulo. A dissertação Manifestações espirituais nas Igrejas Pentecostais: um estudo psicossocial do êxtase e do transe através da música como mobilizadora de emoções desenvolvida por Valdevino Rodrigues dos Santos mostra que a utilização da música nestas igrejas ajuda a aumentar o número de fiéis.

De acordo com o pesquisador, que apresentou sua pesquisa em agosto desse ano, “as Igrejas Pentecostais são as que mais crescem no mundo inteiro e esse tipo de recurso (o uso de ritmos musicais contemporâneos) só tende a aumentar”.

Santos analisou as igrejas pentecostais desde a primeira Assembléia de Deus, trazida ao Brasil pelos suecos Gunnar Vingren e Daniel Berg em 1910. Ele também estudou “Igreja do Evangelho Quadrangular”, instalada em 1950, e a “Renascer” na década de 1980.

Dentre elas, a Igreja Renascer é a mais liberal. Para se aproximar de seu público-alvo utiliza rock, samba, rap e até heavy metal. Pastores vestidos de metaleiros pregam para jovens utilizando uma linguagem semelhante a desse grupo. “Jovens são atraídos pela atmosfera a que estão acostumados. Este tipo de recurso une a pregação da fé com uma filosofia de vida que muitas vezes não seria bem aceita em outras religiões”, explica Santos.

A dança do samba, por exemplo, é admitida por estarem “sambando para Deus”. “Se Deus criou a arte por que não utilizá-la para louvá-lo?”, esta é uma das justificativas dada pela igreja para o uso da dança e uso tipos musicais registrados na tese.

Mais proximidade

As Igrejas Pentecostais têm como característica principal a crença no “batismo do Espírito Santo”, que teria acontecido pela primeira vez durante a “Festa de Pentecostes”, simbolizando a descida do Espírito Santo sobre as pessoas que rezavam e comungavam após a morte de Cristo. Neste momento, pessoas de origens étnicas e idiomas diferentes começaram a falar a mesma língua e a se entender. Esse ato recebeu o nome de “glossolalia”, que seria este “falar línguas estranhas”, e é um dos momentos mais importantes do culto atual nessas Igrejas Pentecostais. Seria um “retorno às origens e a verdadeira fé”, de acordo com o estudioso.

Segundo esta característica de busca pelo Espírito Santo, o uso de ritmos musicais diferentes durante o culto propiciariam uma aproximação entre o pastor, a palavra pregada e a recepção e compreensão por parte dos fiéis. ” No decorrer do culto há uma gradação sonora e musical até o seu ápice que é quando alguns fiéis são agraciados pelo recebimento do Espírito Santo”, declara Valdevino Rodrigues dos Santos.

No momento de êxtase e transe a música tem por função ambientar toda essa erupção de sentimentos por parte dos fiéis. “O transe que o indivíduo possa ter no “contato solitário com o divino” é compartilhado nessas assembléias religiosas e isto vêm aumentando e tomando uma importância para a antropologia mundial”, conclui Santos.


Resumo (Abstract) da tese:

As igrejas pentecostais “Assembléia de Deus”, ‘Renascer’ e “Igreja do Evangelho Quadrangular’ vêem a música como um fator importante para que elas executem suas funções em relação aos homens: evangelização e instrução. E ainda visa o desenvolvimento e intensificação dos laços de comunhão do grupo. Essas igrejas acreditam que a música influencia o comportamento, reforça os valores do grupo, expressa as emoções, dá prazer e finalmente serve como veículo de revelação de Deus.

O ponto máximo do culto ocorre quando as pessoas ficam em estado de êxtase. Nesta ocasião, muitos dos fiéis recebem o Espírito Santo, que é um momento caracterizado por muitos atos diferentes e repetidos enquanto duram; aparecem nesse instante: desmaios, choros, gritos, pessoas pulando, tremendo e, finalmente a marca central do ato: o falar “línguas estranhas” (glossolalia), as quais são palavras inteligíveis somente do ponto de vista espiritual. É impossível definir o idioma. Quando se atinge o clímax da adoração – isso se dá por volta das 21:00 h – as manifestações e os dons espirituais começam a ocorrer. Nesse momento, as pessoas estão mais exaltadas, aqui há uma intensa mistura de sons: cânticos, os gritos de glória e aleluia do pastor e dos membros cantando, sons instrumentais e as glossolalias.

Quanto à música executada, há presença de ritmos variados como: rock, heavy metal, samba, reggae, country, rap e estilos mais lentos. Essas músicas são sempre cantadas com expressão corporal; há, portanto, coreografia: as pessoas dançam e batem palmas de acordo com o ritmo musical executado.

Além da pesquisa bibliográfica com o intuito de traçar o histórico do movimento pentecostal, e obter subsídios teóricos sobre a música, o presente trabalho está baseado na observação participante que constou de entrevistas, gravações e do envolvimento pessoal do pesquisador em vários contextos religiosos. A presente pesquisa mostra que, por ser desenvolvida a todo momento no culto, a performance musical é um dado crucial no desenvolvimento do êxtase religioso, tendo a função de potencializar o culto para promover a conversão dos adeptos


Fonte: http://www.usp.br