Sem Estresse: Respire
por: Dalmário de Oliveira
“The breath is the fuel of sound”
O controle respiratório é o principal fator que conduz o indivíduo ao sucesso na arte de tocar qualquer instrumento de sopro. A respiração é o sustentáculo do som e, antes mesmo de começar seus estudos diários com o instrumento, o músico deve rever o processo respiratório. Isso certamente ajuda a melhorar qualquer tensão que esteja se interpondo à livre emissão do som.
Principalmente entre os iniciantes, há uma certa tendência de respirar erguendo o tórax quando, na realidade, a eficácia da respiração está no ato de se inspirar jogando o ar para baixo. O tórax só se enche quando o diafragma está totalmente esticado e os músculos intercostais já se expandiram suficientemente, o que indica que o ar já ocupou todo o espaço. Uma criança dormindo é o melhor exemplo de respiração correta.
A maior parte dos distúrbios de embocadura é, na realidade, provocada por uma respiração mal conduzida. Muitas vezes nos colocamos a repetir uma passagem e, à medida que erramos, tentamos de outro modo, seja mudando a posição dos lábios no bocal, o ataque ou pressionando o bocal contra os lábios. Tentamos tudo, menos rever a respiração.
O simples fato de errar no desempenho de um solo ou de uma passagem qualquer pode dar início a um perigoso processo de expectativa e tensão. Você erra, fica tenso porque errou, repete e erra porque está tenso, e essa tensão inibe a respiração. Após muitas tentativas, você tende a culpar sua embocadura, quando tudo seria resolvido se parasse e respirasse profundamente, tendo o cuidado de sustentar cada frase com grande volume de ar.
Tocar apoiando-se na coluna de ar deve se tornar um hábito. No entanto, precisamos dissociar volume de pressão. A pressão está ligada à velocidade do ar: maior pressão, maior velocidade. Já o volume diz respeito à quantidade de ar. A velocidade exagerada do ar pode provocar defasagem no som. A garganta deve estar aberta e a língua completamente relaxada. Os exercícios de nota longa servem para observar se o ar está passando livremente, sem obstáculos, entre o diafragma e a garganta. Exercitar a série harmônica partindo dos pedais ajuda a manter a garganta aberta, tendo o cuidado de se fazer a passagem de uma nota para outra sem nenhuma mudança na posição dos lábios, num processo análogo ao canto. A ideia é que, à medida em que se vai do grave para o agudo, relaxe-se a embocadura, procurando unir mais os lábios, fazendo com que a vibração se dê no centro do orifício labial e nunca pensando em pressão de qualquer natureza, uma vez que, mesmo sem querer, uma certa pressão já acontece, involuntariamente. Pensar em relaxamento na série harmônica ascendente pode eliminar, ou mesmo minimizar, a pressão labial contra o bocal.
Nem todos, é verdade, conseguem tocar percorrendo todas as regiões do instrumento com a mesma mímica facial, e isso, diga-se de passagem, não nos parece tão importante. Conhecemos muitas embocaduras “exóticas” com resultados sonoros simplesmente maravilhosos. Acontece, porém, que a tensão e a naturalidade se dão em direções opostas, isto é, ocorrem em proporções inversas.
As afirmações feitas aqui são frutos de minha própria vida como trombonista de orquestras sinfônicas. Após muitos anos, experimentei um problema que, a princípio, julguei ser cansaço muscular, e que abriu uma imensa lacuna no meu trajeto profissional, obrigando-me a renunciar a muitas oportunidades, situação que levou um longo tempo para se resolver. A tensão desencadeada devido a isso assumiu proporções tais que tocar já havia deixado de ser uma relação prazerosa e passou a ser um sacrifício. A partir do momento em que iniciei um trabalho mais intenso em relação ao processo respiratório, as coisas começaram a tomar o caminho de volta à normalidade, permitindo-me tocar de forma muito mais otimista.
O principal fator que nos libera das tensões advindas da nossa lida diária com o instrumento é, sem dúvida, estar atento, constantemente, ao processo respiratório, lembrando-se de respirar o mais plenamente possível, mesmo que seja para tocar uma nota de curta duração. Antes de dizer que sua embocadura está com problemas, veja como você esta respirando para tocar. Lembre-se de que o instrumento é de sopro e, portanto, é preciso soprar.
Dalmário de Oliveira é trombonista e professor de trombone e tuba da UFRJ.
Fonte: Publicado na Revista Weril n.º 136