Música Sacra Versus Popular
por: Dario Pires de Araújo [1]
Quando alguém canta não está pondo apenas uma roupa bonita e atrativas palavras. Está, isto sim, unindo duas maneiras de expressão, casando linguagem falada com linguagem musical, duplicando o poder de penetração.
Neste casamento tanto as palavras como a música têm seu caráter, e a Música Sacra Vocal é aquela que une palavras sagradas com música inspirada por Deus.
Ficou evidente no artigo anterior[2] que a música popular nada tem a ver com inspiração divina, pois Deus não tem interesse algum nela. Ela nada perde de seu caráter puramente humano ou satânico se se unir em casamento com um texto sagrado.
Hinos e cânticos evangélicos em suas várias formas são considerados como a Música Sacra que a Igreja usa quando canta. Uma análise do caráter da música determinará se é Música Sacra ou não, uma vez que normalmente não há problemas com as palavras, exceto a pobreza de alguns corinhos.
Como não tem sido fácil demais arrastar jovens adventistas para um “Rock in Rio”, por exemplo, parece que tem sido a artimanha do inimigo criar o gosto pela música popular através da pressão massificante, e depois, sutilmente ou abertamente, introduzi-lo na Igreja. O processo se intensifica rapidamente, mas não nos esqueçamos de que este gosto é a tragédia da maioria da juventude.
A ânsia de produzir algo novo tem levado vários compositores a criar formas musicais híbridas, amalgamadas com elementos da música popular para alcançarem maior aceitação entre os jovens. Outros têm procurado fazer arranjos, e por vezes, na realidade nada mais fizeram que o desarranjo de introduzir ritmos característicos da música popular e sua atmosfera sonora no que Deus inspirou outros a escreverem. A linha de distinção entre o sacro e o profano tem assim caído na penumbra e obscurecido o discernimento.
A herança da Igreja em sua Música Sacra é a do protestantismo – formas musicais dentro do gênero erudito. É Música Sacra da cultura européia, da civilização ocidental. Os elementos rítmicos que deitam suas raízes no poluente paganismo africano, embora básicos para a música popular, são estranhos à nossa Música Sacra; as escalas e ritmos indígenas nada têm a oferecer à Música Sacra cristã. Caem assim as tendências e possibilidades para nacionalismos musicais sacros cristãos.
Quando nalguma igreja ou teatro os presentes contemplam cantores com microfones na mão, e ouvem os sons amplificados de guitarras e baterias na marcação de ritmos balanceados pedindo movimento, e vozes meio “assopradas”, ou com “pigarrinho”, quase entoando com voltinhas e garganteios em síncopes e descompassos as palavras de alguma “mensagem musical sacra”, com expressões faciais e trejeitos copiados de algum mestre que seja ídolo do momento para “comunicar melhor”, podem ter a certeza de que não estão em presença de Música Sacra, e sim de música popular autêntica.
No passado o povo de Deus não foi beneficiado com os Aarões “flexíveis servidores de ocasião[3]“. Hoje parece que muitos, mesmo pastores, se acostumaram a conviver com música popular religiosa no lar, na escola e na igreja. Não querem se indispor com algum compositor ou intérprete; temem tornarem-se antipáticos aos jovens, a algum administrador, evangelista ou líder J.A. Às vezes não sabem, não conhecem, e acabam também desenvolvendo o gosto e se esquecem da responsabilidade.
É, porém, dever de quem lidera, saber que música é aceitável e qual não; jamais diminuir a importância do assunto; entender que o gosto nem sempre é guia seguro; e, sobretudo, saber que “pais cristãos e líderes da Igreja prestam um grande desserviço aos jovens quando obscurecem a distinção entre a música aceitável e a não aceitável, e toleram uma baixa qualidade de música e apresentação dentro do contexto da igreja, ‘a fim de manter os jovens na igreja'”.
“A igreja nunca presta um serviço ao pecador comprometendo-se com o mundo. É melhor que os não regenerados permaneçam fora da igreja até que se submetam aos princípios da igreja, do que ela se tornar semelhante ao mundo, alistando como membros aqueles que desejam trazer suas normas, seus costumes e gostos[4]“.
Aqui não se trata de ser conservador ou liberal. É questão de princípios e de discernimento para não se confundir leve com trivial, alegre com vulgar, animado com excitante, sacro com popular. A liberdade com que Cristo liberta não tem nenhuma relação com a liberdade existencialista na derrubada de todos os padrões e princípios estabelecidos, a qual permeia a música popular.
Em 1900, da Austrália, a Sra. White escreveu uma carta ao Pastor Haskell na qual fala que Deus lhe revelou que um pouco antes da terminação da graça “demonstrar-se-á tudo quanto é estranho. Haverá gritos com tambores, música e dança”. “É melhor nunca ter o culto do Senhor misturado com música do que usar instrumentos músicos para fazer a obra que, foi me apresentado em janeiro último, seria introduzida em nossas reuniões campais. A verdade para este tempo não necessita nada dessa espécie em sua obra de converter almas”. “O Espírito Santo nada tem a ver com tal confusão de ruído e multidão de sons como me foram apresentadas em janeiro último. Satanás opera entre a algazarra e a confusão de tal música, a qual, devidamente dirigida, seria um louvor e glória a Deus[5]“.
Essas coisas que aconteceram no passado hão de ocorrer no futuro. Satanás fará da música um laço pela maneira por que é dirigida. Deus convida Seu povo, que tem a luz diante de si na Palavra e nos Testemunhos, a ler e considerar, e dar ouvidos. Instruções claras e definidas têm sido dadas a fim de todos entenderem. Mas a comichão do desejo de dar origem a algo novo dá em resultado doutrinas estranhas, e destrói largamente a influência dos que seriam uma força para o bem, caso mantivessem firme o princípio de sua confiança na verdade que o Senhor lhes dera[6]“.
Será que certas músicas na igreja não estão abrindo as portas para o pleno cumprimento dessa profecia? Cabe a cada adventista vigiar para que não seja a sua igreja que a cumpra.
Ninguém se iluda. A maneira estropiada, esdrúxula, sacudida, ritmada e sem preparo (bungling manner) como às vezes o canto é conduzido, “não é nenhum crédito para a verdade, nenhuma honra para Deus[7]“.
Triste seria se a Igreja não tivesse uma posição definida. Felizmente existe uma Filosofia Adventista de Música.
Notas:
[1] Agradecemos à Loide Simon por este contribuição ao Música Sacra e Adoração.
[2] Os editores do Música Sacra e Adoração não encontraram o referido artigo de Dario P. de Araújo localizado na Revista Adventista de Agosto de 1985, agradeceríamos esta contribuição de algum leitor.
[3] Ellen G. White, Patriarcas e Profetas, pág 331.
[4] Kenneth H. Wood, Editorial da Review and Herald de 20/01/72.
[5] Ellen G. White, Mensagens Escolhidas, livro 2, Págs. 36 e 37
[6] Ibidem, pág. 38.
[7] Idem, Evangelismo, pág. 506; Review and Herald de 24/07/1883.
Fonte: Revista Adventista, setembro de 1985, pp. 11-12.