Sacerdócio Levítico ou Real?

por: Jonatan Marcelo Oliveira

Porque dele assim se testifica: Tu és sacerdote para sempre, segundo a ordem de Melquisedeque.” (Hebreus 7:17)

Quem é este Melquisedeque, citado em Hebreus, e por que ele é importante? Lemos, no Gênesis, a única menção histórica a este personagem, tanto fascinante quanto misterioso: “Ora, Melquisedeque, rei de Salém, trouxe pão e vinho; pois era sacerdote do Deus Altíssimo; e abençoou a Abrão, dizendo: bendito seja Abrão pelo Deus Altíssimo, o Criador dos céus e da terra! E bendito seja o Deus Altíssimo, que entregou os teus inimigos nas tuas mãos! E Abrão deu-lhe o dízimo de tudo.” (Gênesis 14:18-20)

Três versos são tudo o que a Bíblia relata da história deste homem. Mas por este pequeno trecho podemos ver que ele era uma pessoa muito especial. Ele era rei de Salém (que mais tarde tornou-se Jerusalém) e sacerdote de Deus (verso 18). O próprio Abrão (que mais tarde se tornaria Abraão) reconheceu-o como sendo representante de Deus e lhe deu o dízimo dos despojos de guerra que havia tomado de seus inimigos.

Mas o mistério acerca deste sacerdote de Deus continua. Vivendo como representante do Deus Altíssimo em meio a uma terra habitada por povos pagãos – os cananitas que séculos mais tarde o povo de Israel deveria exterminar – nada se sabe acerca de sua origem. A este respeito lemos em Hebreus 7:3 o seguinte: “sem pai, sem mãe, sem genealogia, não tendo princípio de dias nem fim de vida”. .

Porém, este personagem é tão importante que, ao descrever o ministério de Jesus, o autor de Hebreus diz o seguinte: “aonde Jesus, como precursor, entrou por nós, feito sacerdote para sempre, segundo a ordem de Melquisedeque.” (Hebreus 6:20). A expressão “segundo a ordem de Melquisedeque” significa que o sacerdócio de Jesus é do mesmo tipo, ou parecido com, o sacerdócio de Melquisedeque.

O ponto de ligação, de conexão entre estes dois ministérios é que ambos eram Rei e Sacerdote.

Depois do episódio em que Melquisedeque abençoa a Abraão, a Escritura não fala mais sobre ele; e da descendência de Abraão surgiu um novo sacerdócio, segundo o esquema: Abraão –> Isaque –> Jacó –> Levi –> Moisés e Arão.

A Eleição dos Levitas

A expressão “levita” refere-se a um membro da tribo de Levi – que era uma tribo secular do povo de Israel e que foi separada por Deus para exercer o sacerdócio (Números 3:1-10). A seu cargo estariam todas as atividades do Tabernáculo e, posteriormente, do Templo, em Jerusalém. E por que esta tribo, especificamente, foi escolhida? Esta consagração especial se deu porque esta tribo foi fiel a Deus em um momento em que todo o restante do povo de Israel estava envolvido no episódio da adoração ao bezerro de ouro (Êxodo 32:25-29).

Este triste relato nos informa que, poucos dias depois de o povo haver se santificado e se comprometido solenemente a cumprir fielmente as ordens de Deus (Êxodo 19:8) e terem visto o monte tremendo e fumegando, e ouvido a trombeta de Deus sobre o monte (Êxodo 19:18-19), esqueceram-se de quem era o Deus que os havia tirado com sinais e prodígios da escravidão do Egito, e construíram para si um ídolo de ouro e atribuíram a este ídolo tudo o que Deus havia feito em favor deles (Êxodo 32:4-5).

O plano original de Deus era fazer de Israel um “reino sacerdotal” e uma “nação santa” (Êxodo 19:5-7). Porém, no momento de prova, somente a tribo de Levi se mostrou à altura de tão importante comissionamento (Êxodo 32:26).

Dentre os levitas, a Arão e à sua descendência foi dada uma missão especial, a de servir diretamente diante de Deus, efetuando o serviço sacrifical e intercedendo diante de Deus pelo povo (Números 3:3). Ao incumbir Arão e seus filhos pelo sacerdócio, Deus designou o restante da tribo de Levi para auxiliá-los, incumbindo-os de realizar as tarefas do santuário e de zelar pelos utensílios sagrados, além de servir diretamente às necessidades espirituais do povo (Números 3:6-9).

Outros Requisitos

a) Entravam na profissão aos 25 anos de idade, provavelmente como aprendizes em prova sob a vigilância de levitas mais velhos (Levítico 4:3; 8:24);

b) Ao atingir os cinqüenta anos, o levita era eximido dos trabalhos rigorosos, mas podia continuar servindo nos deveres mais fáceis do tabernáculo;

c) Santificação – nenhum Levita poderia fazer a obra de Deus sem estar com sua vida em santidade (Números 8:21-22; Hebreus 12:14); tinham que se lavar e purificar suas vestes antes de realizar seus deveres santos.

Porém, todo o sacerdócio levítico era, por definição, falho, uma vez que seria impossível alcançar a perfeição por meio deste sacerdócio (Hebreus 7:11-12). As cerimônias e rituais realizados neste sacerdócio, por mais perfeitas que fossem, eram apenas uma sombra, uma ilustração do sacerdócio perfeito que Jesus Cristo iria desempenhar no futuro (Hebreus 9:9-10).

Além disso, muitos destes sacerdotes atuaram de forma a desonrar o nome de Deus. Por exemplo, Nadabe e Abiu, que eram filhos de Arão, desonraram o altar ao trazer fogo estranho para oferecer incenso diante de Deus (Levítico 10:1). Outro exemplo triste é o de Hofni e Finéias, filhos de Eli, os quais desonraram o ofício de sacerdote, portando-se de maneira inconveniente, desrespeitosa e moralmente condenável (I Samuel 2:12-17).

Ora, se estes eram os representantes de Deus diante do povo, maior ainda era a sua responsabilidade, porque através deles o povo conhecia a Deus e Seu caráter. Por representarem falsamente a Deus, este os castigou severamente.

O auge da corrupção e idolatria foi alcançado nos dias do profeta Ezequiel, quando a mais baixa idolatria pagã era executada pelos próprios sacerdotes, no recinto sagrado do templo (Ezequiel 8).

A conseqüência de tão grande depravação por parte da classe sacerdotal resultou, como não poderia deixar de ser, na completa depravação de todo o povo de Israel, conforme relatado pelo profeta Oséias (Oséias 4:3-19).

Porém, apesar de todas estas falhas gravíssimas, devemos ter em mente que o sacerdócio levítico não foi substituído porque errou, mas simplesmente porque seu papel era apenas ilustrar o sacerdócio de Cristo. Eles representaram uma solução transitória, de caráter instrutivo e de ação limitada.

Uma Nova Aliança

No livro de Hebreus, o autor bíblico descreve de forma magistral a supremacia do ministério sacerdotal de Cristo sobre o ministério levítico, demonstrando a ineficácia do ritual sacrifical que se repetia continuamente, ao dizer: “Porque tendo a lei a sombra dos bens futuros, e não a imagem exata das coisas, nunca, pelos mesmos sacrifícios que continuamente se oferecem cada ano, pode aperfeiçoar os que a eles se chegam. Doutra maneira, teriam deixado de se oferecer, porque, purificados uma vez os ministrantes, nunca mais teriam consciência de pecado. Nesses sacrifícios, porém, cada ano se faz comemoração dos pecados,porque é impossível que o sangue dos touros e dos bodes tire os pecados. (Hebreus 10:1-4)

É importante compreendermos que o ministério sacerdotal de Cristo estabelece uma nova aliança com Seu povo. Não se trata apenas de uma alteração pontual em um aspecto da aliança, mas é a obsolescência de uma aliança e a criação de outro pacto, completamente novo, a partir de novas premissas. As palavras que descrevem a beleza desta nova aliança estão em Hebreus 8:8-13.

Vemos então que o novo sacerdócio, dentro da nova aliança, se faz em bases completamente diferentes. A antiga lei do sacerdócio dizia que somente poderiam ser sacerdotes, homens da tribo de Leví. Jesus, porém, era da tribo de Judá, e não de Leví, o que demonstra que as leis do sacerdócio e cerimoniais foram mudadas. Na verdade, este Sacerdote do novo concerto era de uma ordem superior, a ordem de Melquisedeque (Hebreus 6:20; 7:17, 21).

O próprio Abraão, que seria o ancestral de todo o Israel (e, portanto da própria tribo de Levi) reconheceu esta superioridade ao entregar a Melquisedeque o seu dízimo (Hebreus 7:4-6) e esta superioridade foi confirmada quando Melquisedeque o abençoou (Hebreus 7:7).

Este novo sacerdócio, “segundo a ordem de Melquisedeque”, é perfeito, ou seja, possui um sumo sacerdote eleito por Deus sem defeito e que oferece um sacrifício eterno (Hebreus 7:24, 28). Isto quer dizer que este sacrifício, feito uma única vez, é válido para todo o sempre e em favor de toda a humanidade (Hebreus 9:11-14, 24, 28).

Além disso, este novo Sumo Sacerdote, sendo o penhor de uma nova aliança, é o cabeça de uma nova linhagem de sacerdotes; não mais da linhagem de Levi mas da linhagem de Jesus Cristo. A admissão no serviço deste novo sacerdócio não se dá mais pelo nascimento carnal, hereditário, como era o caso dos levitas, mas pela aceitação de Jesus Cristo como nosso único e legítimo salvador, e pela compreensão e obediência às suas leis (Hebreus 8:10-11).

Pedro descreve este novo sacerdócio dos crentes da seguinte forma: “Mas vós sois a geração eleita, o sacerdócio real, a nação santa, o povo adquirido, para que anuncieis as grandezas daquele que vos chamou das trevas para a sua maravilhosa luz” (I Pedro 2:9).

João, o Evangelista, descreve no livro do Apocalipse este processo com as seguintes palavras: “e da parte de Jesus Cristo, que é a fiel testemunha, o primogênito dos mortos e o Príncipe dos reis da terra. Àquele que nos ama, e pelo seu sangue nos libertou dos nossos pecados, e nos fez reino e sacerdotes para Deus, seu Pai, a ele seja glória e domínio pelos séculos dos séculos. Amém” (Apocalipse 1:5-6).

Isto não é maravilhoso? Através da aceitação do eterno sacrifício de Cristo em nosso favor, somos reis e sacerdotes diante do Deus vivo! Aleluia!

Levitas ou Sacerdotes do Deus Vivo?

Porém, sem nos darmos conta, muitas vezes temos voltado à velha aliança, onde a o acesso a Deus se dava através de rituais, os quais deixaram de fazer sentido na nova aliança; e fazemos isso com nossas bocas, pois muitos dizem: “sou um levita”.

Ora, já vimos claramente que o sacerdócio levítico não existe mais, tendo sido substituído por um sacerdócio muito mais excelente, o de Cristo. Mas muitos ainda falam assim, sem saber que podem estar rejeitando com essas palavras tudo o que o ministério intercessório de Cristo representa para o crente hoje. “Pelas tuas palavras serás justificado e pelas tuas palavras serás condenado” (Mateus 12:37).

A nova aliança que foi estabelecida com um alto preço de sangue por Jesus Cristo, não pode ser deixada de lado e nem revogada (Hebreus 7:24). A salvação que conquistamos, o sacerdócio que recebemos é pela graça através do pacto de Cristo.

O sacerdócio de Cristo não vem de tribo, pois a autoridade sacerdotal de Jesus vem da mesma linhagem de Melquisedeque isto é, antes da lei, antes das tribos, antes dos sacerdotes. “Sem pai, sem mãe, sem genealogia, não tendo princípio de dias nem fim de vida, mas sendo feito semelhante ao Filho de Deus, permanece sacerdote para sempre” (Hebreus 7:3).

“Porque aquele de quem estas coisas se dizem pertence a outra tribo, da qual ninguém serviu ao altar, visto ser manifesto que nosso Senhor procedeu de Judá, e concernente a essa tribo nunca Moisés falou de sacerdócio. E muito mais manifesto é ainda, se à semelhança de Melquisedeque se levantar outro sacerdote, que não foi feito segundo a lei do mandamento carnal, mas segundo a virtude da vida incorruptível.” (Hebreus 7:13-15).

Observe:

  • Melquisedeque: era rei e sacerdote do Deus Altíssimo (Gênesis 14:18).
  • Jesus Cristo: é Rei dos reis (I Timóteo 6:15; Apocalipse 17:14; 19:16) e Sumo Sacerdote da nossa confissão (Hebreus 3:1; 4:14,15; 6:20; 8:1; 9:11).
  • Nós, que aceitamos a Cristo como Senhor de nossa vida (através da nova aliança): somos sacerdotes reais para Deus nosso Pai (I Pedro 2:9). Esta é a nossa verdadeira ordem. Esta é nossa verdadeira posição.

Se disser que sou um levita, estarei negando, com esta palavra a nova aliança, ou seja; negando o sacerdócio de Cristo. Portanto, está na hora de decidirmos o que queremos ser: meros levitas ou sacerdotes do Deus vivo?

Alguns podem se preocupar, pois, inadvertidamente podem ter usado esta expressão, podem ter achado que seria uma coisa tremenda ser um levita. Então, esta pode ser para eles uma palavra muito dura. Porém, não nos esqueçamos que mais dura ainda era esta palavra para os cristãos que haviam se convertido do povo de Israel, para quem o livro aos Hebreus foi endereçado. E nem assim o Espírito deixou de inspirar o seu autor a escrever esta mensagem.

Não podemos ser como os cristãos de Hebreus 5:11, 14. Já esta na hora, espiritualmente falando, de comermos alimento sólido e deixar o leite para as crianças. Em nome de Jesus, você terá uma ótima digestão.

Atente para as promessas bíblicas:

“Mas Deus, não tendo em conta os tempos da ignorância, anuncia agora a todos os homens, e em todo o lugar, que se arrependam;” (Atos 17:30).

“Portanto, como diz o Espírito Santo: Se ouvirdes hoje a sua voz, não endureçais os vossos corações” (Hebreus 3:7-8a).

Deus nos abençoe.


Revisto e ampliado por Levi de Paula Tavares em Abril de 2010.