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Tubos
Sonoros
... tocados
à mão |
Prof.
Luiz Ferraz Netto
[email protected]
Introdução
Esse experimento permite demonstrar
que boa música pode ser produzida a partir de materiais ordinários e de
obtenção bem simples. Não é essencial ter instrumentos custosos,
extravagantes e bem polidos para se tocar as melodias favoritas. Com tubos
de PVC de comprimentos diferentes pode-se criar uma escala musical.
Qualquer escala pode ser construída. Para tanto basta que a pessoa entenda
um pouco da teoria da música e, claro, um pouco de Física.
Quando
golpeamos a extremidade aberta de um tubo, com a mão espalmada, uma nota
é produzida. E nós a ouvimos!
Com os tubos devidamente dependurados por cordéis horizontais (ou linha de
pesca), a 'mão espalmada' pode ser substituída por pequena raquete plástica
envolvida por pano ou couro. Com os tubos devidamente apoiados na
horizontal (ou, ligeiramente inclinados), poderão ser tocados com
"chinelos" tipo 'havainas'.
Como
vibram as colunas de ar?
A fonte de qualquer som é um objeto
vibrando. Praticamente qualquer objeto pode vibrar e assim pode ser uma
fonte de som. Em um tubo de PVC, o ar é posto em vibração ao se bater na
extremidade aberta do tubo com a mão espalmada. Uma vez perturbado, o ar
dentro do tubo vibra com uma certa variedade de freqüências, mas só
certas freqüências persistem, aquelas compatíveis com um sistema de ondas
estacionárias.
Vamos comentar um pouco mais sobre ondas estacionárias usando da ilustração
a seguir:
Uma
onda estacionária ocorre quando uma onda contínua percorre um dado meio
(uma corda tensa, na ilustração acima), reflete-se em algum obstáculo,
volta atrás e interfere com a onda original. É uma superposição de
ondas de mesma freqüência e mesma amplitude que se propagam no mesmo meio
numa dada direção e sentidos opostos. Essa superposição especial recebe
o nome de ondas estacionárias pelo fato de dar a impressão de que
não há nada se propagando ... não se nota a onda progressiva ou a retrógrada.
As
regiões onde ocorrem interferência destrutiva são chamadas de nós
(os pontos cheios na fig.2) e aquelas onde ocorrem interferência
construtiva são denominadas de ventres (ou antinós - pontos
marcados com X na fig.2). Nós e ventres ocupam posições fixas num
sistema de ondas estacionárias.
Ondas
estacionárias ocorrem com mais de uma freqüência. A menor das freqüências
que é capaz de produzir uma onda estacionária no ar (meio que nos
interessa no momento), com obstáculos nas duas extremidades, apresenta um
padrão como em (a) na fig. 2, e isso se traduz auditivamente como um
determinado tom. Essa freqüência, cujo tom é o mais baixo possível,
é denominada de freqüência fundamental.
As
ondas estacionárias mostradas nas figuras 2b, 2c e 2d são produzidas por
ondas com freqüências duas, três e quatro vezes maiores que a freqüência
fundamental. Os sons que percebemos será 2, 3 ou 4 vezes "mais
agudos" que o tom da freqüência fundamental.
As
freqüências com as quais formam-se ondas estacionárias são as freqüências
naturais ou freqüências ressonantes do objeto vibrante, e os
padrões de ondas estacionárias distintos, mostrados da fig. 2, são os
modos de ressonância distintos das vibrações naturais. Só ondas
estacionárias que correspondem às freqüências ressonantes persistirão
por bom tempo no meio em questão.
O
estudo das ondas estacionárias em tubos sonoros (fechados e abertos) é
feito, tradicionalmente, com as montagens abaixo ilustradas:
Nesse
experimento clássico, as ondas estacionárias correspondentes aos sons
reforçados pelo tubo fechado podem ser ilustradas assim:
Para
os tubos abertos (normalmente, na prática, são tubos telescópicos)
tem-se:
Embora
uma onda estacionária seja o resultado da interferência de duas ondas que
percorrem em sentidos opostos, também é um exemplo de um objeto vibrando
em ressonância. Uma placa ou uma membrana que vibra estacionariamente
apresentará padrões de nós e ventres, como podemos constatar usando das
maravilhosas figuras de Chadni.
Física
dos tubos tocados à chinelo
Quando excitados por ondas de fontes
externas (sons de diapasões, por exemplo), nossos tubos de comportam como tubos
abertos (abertos em ambas as extremidades), mas quando golpeados com a
palma da mão ou chinelo, comportam-se como tubos fechados (um
extremo aberto e outro fechado). Por essa razão, nós nos preocuparemos só
com as ondas estacionárias que se formam nos tubos fechados.
Os
primeiros padrões de ondas estacionárias que se podem formar são os
ilustrados na fig. 3. As ilustrações representam as amplitudes dos
deslocamentos das partículas de ar que vibram no interior do tubo,
rebatidas na direção perpendicular aos seus deslocamentos. São ilustrações
típicas nos compêndios de Física, para suprir as dificuldades da ilustração
de ondas longitudinais. Note que, realmente, as partículas de ar vibram
horizontalmente, paralelas ao comprimento do tubo (mostrado por setas
pequenas sobre o segundo desenho).
Como
a extremidade fechada é um obstáculo fixo, o ar ai não tem liberdade
para se movimentar e junto a ela sempre teremos um nó de vibração; no
extremo livre o ar tem liberdade de movimento, formando ai um ventre de
vibração.
NOTA:
Os ventres nos extremos abertos dos tubos não se formam precisamente sobre
esses extremos porque eles dependem do diâmetro do tubo. Isso causa o
denominado "efeito de extremidade", do qual voltaremos a falar
mais adiante. Por enquanto, vamos assumir que os ventres estão exatamente
sobre os extremos abertos.
A
figura 4, a seguir, ilustra uma impossibilidade física para um sistema de
ondas estacionárias em tubos abertos (uma extremidade fechada e outra
aberta).
Na
figura 3 destacamos a relação existente entre o comprimento físico do
tubo (L) e os correspondente comprimentos de onda (l1,
l2 e l3)
das ondas estacionárias.
Um
quarto de comprimento de onda (l1/4)
pode se ajustar ao comprimento do tubo (L), na
freqüência fundamental (L = l1/4);
três quartos de comprimento de onda (3.
l3/4) podem
se ajustar ao comprimento (L) ao emitir o terceiro harmônico (freqüência
3 vezes superior à fundamental: f3 = 3.f1) e cinco
quartos de comprimento de onda (5. l5/4)
podem se ajustar ao comprimento do tubo (L) ao
ser emitido o quinto harmônico (freqüência 5 vezes superior à do
fundamental: f5 = 5.f1).
As
freqüências dessas ondas estacionárias que se formam relacionam-se com a
velocidade do som (v) no ar (343 m/s, a 20oC) e com os
comprimentos de ondas assim: f = v/l
.
Vamos
exemplificar, usando o terceiro harmônico:
L = ¾ l3
è l3 =
4L/3 f3 = v/l3 è
f3 = v / (4L/3) = 3v / 4L
Os
demais seguem a mesma construção. A partir do fundamental obteremos,
portanto:
f1
= 1.v / 4L , f3 = 3.v / 4L , f5 = 5.v / 4L , f7
= 7.v / 4L , e assim por diante.
Essa
sucessão pode ser escrita genericamente assim:
f
= n.v / 4L , com n = 1, 3, 5, 7, .... ou f = (2n+1).v / 4L , com
n = 0, 1, 2, ....
Com
essa expressão, estamos habilitados para determinar todas as freqüências
de ressonâncias produzidas pelos tubos sonoros tocados à mão, em função
do particular comprimento do tubo, e vice-versa. Porém, só nos
interessaremos, para cada tubo, pelo cálculo da freqüência fundamental
(a mais baixa freqüência de ressonância), uma vez que é ela quem
determinará o tom básico (altura) do som emitido pelo tubo.
Construindo
a escala musical
Que poderemos fazer para obter uma
escala completa de notas musicais?
Para
obter sons de alturas diferentes (cada um deles na freqüência
fundamental), temos duas chances, a saber: alterar a velocidade do som no
interior do tubo ou alterar o comprimento de onda.
Essa conclusão vem de : f
= v / l
A
velocidade do som não irá mudar significativamente a menos que você
altere drasticamente a temperatura do ar no interior do tubo ou substitua o
ar por outros gases. Pelo dito, parece-nos mais simples alterar a altura do
som fundamental produzido através da mudança do comprimento de onda.
Os
comprimentos de ondas que interessam (ln)
podem ser selecionados através do conveniente
comprimento do tubo sonoro (Ln).
Recordemos
que f = v / 4L , para a freqüência fundamental, assim L = v /
4f. Desse modo, para obtermos uma nota específica (som de determinada
freqüência) basta substituir na expressão acima o f por seu valor
escolhido e obter o correspondente valor para L, comprimento do
particular tubo sonoro.
Resta
um pequeno problema que passaremos a discutir agora, é o efeito de
extremidade.
Os
comprimentos dos tubos obtidos pela fórmula acima (L = v / 4f), emitem
"um" som fundamental (e obviamente seus harmônicos) um tanto
alterado, como se os tubos fossem realmente um pouquinho mais comprido do
que realmente são. O som real emitido (com todo o rigor das medidas de
freqüência feitas por osciloscópio) correspondem a tubos cujos
comprimentos são L + ¼ dint , onde dint são os diâmetros
internos dos tubos. Desse modo, para que nossos tubos emitam realmente a série
de sons que desejamos, devemos subtrair dos comprimentos obtidos via
fórmula, a parcela ¼ dint.
Nossa
fórmula de cálculo, ajustada para o efeito de extremidade, passa a ser:
L = (v/4f) - ( ¼ dint) , onde
dint é o diâmetro interno dos tubos.
Agora,
tudo que precisamos saber são as freqüências das notas que pretendemos
tocar. Há muitas escalas que podemos escolher, cada uma delas com seu
"sabor cultural". Os povos de cultura ocidental ao ouvirem uma música
da cultura oriental, torcem o nariz e dizem: --- que dlem, dlem dlem
esquisito, de onde tiraram isso? Bem, está explicado, a escala musical
deles é diferente da nossa. Adotaremos aqui, pela cultura ocidental, a
escala em C maior, cujas freqüências estão baseadas na escala
cromática "bem temperada" de Bach. Eis a fórmula:
f1
= fo [ 21/12]número do intervalo
Como
um exemplo:
fD
= fC [ 21/12]2 = (262).(21/6) =
294 Hz
Eis
uma tabela, nessa escala, com as notas, os números de intervalos, as freqüências,
os comprimentos sem correção e uma coluna para anotar os comprimentos com
correção (após subtrair a parcela dint/4).
Notas |
No. do intervalo |
Freqüências |
L sem correção |
L com correção |
C |
--- |
261,6256 |
32,77 |
|
D |
1 |
293,6648 |
29,20 |
|
E |
1 |
329,6276 |
26,01 |
|
F |
½ |
349,2282 |
24,55 |
|
G |
1 |
391,9954 |
21,87 |
|
A |
1 |
440,0000 |
19,48 |
|
B |
1 |
493,8833 |
17,36 |
|
C |
½ |
523,2511 |
16,38 |
|
- |
|
Hz |
cm |
cm |
NOTA:
A escala na tabela acima não está completa. Bach 'selecionou' 12
notas para sua escala 'bem temperada', a saber:
nota
|
dó
|
dó#
|
ré
|
ré#
|
mi
|
fá
|
fá#
|
sol
|
sol#
|
lá
|
lá#
|
si
|
dó
|
temperado
|
1
|
21/12
|
22/12
|
23/12
|
24/12
|
25/12
|
26/12
|
27/12
|
28/12
|
29/12
|
210/12
|
211/12
|
2
|
Freqüência
|
262
|
277
|
294
|
311
|
330
|
349
|
370
|
392
|
415
|
440
|
466
|
494
|
523
|
Material
Tubo de PVC (medir a anotar o diâmetro interno dint),
lixa, serra, tinta.
Montagem
Meça um comprimento específico (L sem correção) e corte o
tubo. Faça isso para cada pedaço. Não caia na esperteza de marcar os
comprimentos no tubo e cortar tudo de uma vez ... a espessura da serra vai
enganá-lo!
Após
os cortes é que serão feitos os ajustes de comprimentos com correção.
Uma lixadeira fixa, vertical (disco com lixa girando no plano vertical) e
apoio a 90 graus, vem bem a calhar. Uma lixa fina dará o acabamento.
Limpe
bem os tubos, retire qualquer eventual rebarba, e passe à fase de pintura.
Um tubo de cada cor facilitará o "regente da orquestra" na sala
de aula. Os tubos também poderão ser etiquetados indicando nome da nota,
freqüência, comprimento com correção.
Precaução:
extremos dos tubos não lixados podem ferir as palmas das mãos.
Na
aula de Acústica, levei os tubos sonoros para a sala, distribuí para 8
alunos que se sentaram na primeira fila e começamos nossas "execuções".
Primeiro tocamos a escala completa várias vezes para sentir o sabor da
escala ... e daí para a frente foi o maior sucesso da temporada!
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