A Forma da Adoração

Louvor, Adoração, e Espiritualidade: Ômega da Apostasia – Parte I

por: Pr. Joaquim Azevedo Neto, Ph.D.

Para uma melhor compreensão do termo Ômega, o qual aparece nos escritos do Espírito de Profecia, temos que considerar o tema do selamento. Quem é que sela? E por que sela? Podemos entender, fundamentados em Efésios 1:13 e 4:30, que o Espírito Santo é quem sela para a redenção. Em Apocalipse 7:1-4 (veja também Ezequiel 9:1-6) o anjo sai a selar o povo de Deus antes, durante e depois da sacudidura preparando-os para o alto clamor e o fechamento da porta da graça. Portanto, a função do Espírito Santo é fundamental nos últimos dias desta geração.

Assim podemos acertadamente dizer que o Inimigo das almas tentará neutralizar a obra do Espírito Santo na vida do remanescente. Essa tentativa satânica é a substituição do Espírito verdadeiro pelo falso. Desde a sua queda no Céu, Satanás assim tem trabalhado, mas seus esforços serão mais intensos nos últimos dias. Essa tentativa de substituição pode ser parte do Ômega. Apresentarei detalhes a seguir que corroboram esta asserção.

Da mesma maneira como o Alfa da apostasia no tempo do Dr. Kellogg era relacionado com a natureza de Deus (panteísmo), anulando assim o trabalho de Deus na vida do crente, o qual é a obra do Espírito Santo; assim é de se esperar que o Ômega, contenha esse mesmo elemento de engano, [1] isto é, a tentativa de anular a obra do Espírito Santo para que o remanescente não seja selado e preparado para enfrentar os últimos eventos da história desta terra.

Conseqüentemente, esse é um estudo introdutório à ampla produção literária da IASD e por outros autores mencionados na bibliografia deste estudo. Portanto, diante da expressiva quantidade de publicações referentes ao tema proposto, a objetivação deste estudo é permitir uma re-análise das informações obtidas até o momento por muitos.

Revisão de Literatura

O tema Ômega da apostasia assemelha-se a um quebra cabeça que merece ter atenção devida antes que se torne uma bola de neve que cresce até tornar-se uma avalanche descendo a ladeira. No passado, já tivemos muitos outros problemas teológicos. O Pastor José Carlos Ramos faz uma lista deles na sua obra que cito a seguir; hoje temos outros problemas como os antitrinitarianos, testemunhas de Yoshua, os perfeccionistas, os que querem redefinir babilônia, os pentecostalistas, os legalistas, os pós-modernistas, os liberais e muitos outros que incomodam a igreja de forma geral. Dessa forma, as lições do passado devem ser aprendidas hoje, pois não é seguro ignorar problemas enquanto ainda são embrionários, pois podem gerar danos futuros à igreja.

Podemos ver que muitos estão perguntando sobre o assunto, muito se tem publicado, mas na prática poucos tem tomado o tempo necessário para ler estas instruções. Assim, as opiniões e a cultura prevalecem como autoridade neste assunto. Portanto, devemos colocar de lado nossas pressuposições e opiniões individuais e, usando todas as ferramentas exegéticas, históricas, arqueológicas e teológicas disponíveis para, fundamentados na Palavra e no Espírito de Profecia achar soluções plausíveis para este dilema que se aproxima como uma avalanche místico-religiosa e cultural. Toda solução deverá possuir características redentoras, buscando não causar divisões. A igreja Adventista do Sétimo Dia é, simbolicamente, o corpo de cristo na Terra, é a igreja remanescente, aquela que possui a última mensagem de advertência ao mundo, portanto devemos nos manter unidos na verdade evitando assim, que a igreja se secularize seguindo os moldes populares pós-modernos.

Vários estudiosos têm contribuído com este estudo. O Pr. José Carlos Ramos no seu último livro [2] aponta acertadamente, fundamentado na Bíblia e no Espírito de Profecia, que a oposição de um grupo de pessoas à doutrina da Trindade, especialmente contra o Espírito Santo, é uma peça do quebra cabeça do Ômega. Se não aceitamos a existência do Espírito Santo como é que aceitaríamos a Sua obra na nossa vida dentro do processo da santificação?

Outro autor, Lewis R. Walton também apresenta uma análise histórica do que possivelmente poderia ser o Ômega, adicionando outras peças ao quebra cabeça [3]. Ele apresenta nove pontos a ser considerados. Nove características do Alfa da apostasia que poderiam ser repetidos no Ômega:

  1. Enganava as pessoas. Aqueles que apoiavam o Alfa não falavam segundo a Bíblia nem os Testemunhos;
  2. Trazia divisões nas igrejas em vez de uni-las na mensagem presente;
  3. Atacava os fundamentos da nossa crença como igreja remanescente: o Santuário, o Juízo, o Espírito de Profecia, a natureza de Deus, Justificação pela Fé, etc.;
  4. Atacava a estrutura organizacional da IASD e seus líderes;
  5. Esforçava-se para alcançar os jovens, até o ponto que E.G. White teve que escrever, no caso do nosso colégio em Battle Creek, o seguinte “Pais, mantenham os vossos filhos longe de Battle Creek. . . . Heresias sutis tem tomado a mente. . .. Uma advertência tenho recebido para dar aos pais, se teus filhos estão em Battle Creek, chamem nos de volta imediatamente.[4]
  6. Atacava o Espírito de Profecia, a validade dos Testemunhos e a inspiração de E. G. White;
  7. Causava um clima de ataques e críticas entre os membros da igreja;
  8. Atacava os padrões morais dizendo que isto é legalismo portanto deve ser mudado, assim neutralizando a obra do Espírito na vida do crente;
  9. Proclamava uma reforma na mensagem e não de vida.

Não poderia deixar de mencionar a Joachin Braun, músico professor da Bar-Ilan University, com a sua obra sobre a música na Palestina antiga. Este livro é muito esclarecedor especialmente com respeito à influência das culturas musicais do Antigo Oriente Médio sobre o povo de Israel. Esse autor declara, fundamentado na história e na arqueologia da Palestina, que o uso dos membranofones (instrumentos feito de membrana de couro sobre uma estrutura oca de madeira) eram antagônicos à religião de Israel e estes eram um símbolo do paganismo e idolatria [5].

A classificação dos instrumentos bíblicos recomendada por Braun baseia-se na classificação de instrumentos atualmente mais difundida entre os estudiosos e está dividida em quatro grupos conforme são produzidos os sons de cada um deles:

  • os aerofones são aqueles que usam o vento para produzir o som não importando o material, os quais podem ser de osso, madeira ou metal, ex., flauta, trombeta;
  • os cordofones possuem cordas e possivelmente uma caixa sonora para produzir o som, são eles: alaúde, lira, harpa;
  • os idiofones são os mais diversificados. Estes são aqueles em que o som é produzido pelas vibrações produzidas no próprio corpo do instrumento e, portanto, não conseguem manter o som. Por isso, eram tocados constantemente nos rituais pagãos junto com os membranofones, marcando assim o ritmo, por exemplo: chocalhos, reco-reco, castanholas, colar de ossos, cintos de pedras que ao dançar causam barulhos. Esses podem ser chamados de causadores de barulho;
  • os membranofones, que são feitos com uma estrutura de madeira oca recoberta por uma membrana de couro de animal que ao receber um golpe emitiam um som de percussão: tambores, tamborim, pandeiro, adufes [6]. Esta é a classificação usada neste estudo.

Outro estudo esclarecedor é o artigo de Eric Werner, onde ele apresenta de forma lúcida o conflito entre o helenismo e o judaísmo e sua influência com respeito à música e adoração sobre a igreja cristã dos primeiros quatro séculos depois de Cristo [7].

Outra obra que tem sido muito útil para este estudo é o livro escrito por Vanderlei Dorneles [8]. Na sua obra, ele apresenta de forma contundente o surgimento deste tipo do louvor pentecostal modelado pelo pós-modernismo com a sua ênfase no místico, semelhante às religiões primitivas. Nesse tipo de louvor e adoração podemos observar uma substituição do Espírito Santo por outro espírito.

Não poderia deixar de mencionar o pequeno livro publicado pela CPB, fundamentado nos escritos de E.G.W. Aqui há uma seleção de citações do Espírito de Profecia. Os livros dos quais essas citações foram tiradas são de fácil acesso, portanto podem ser lidas no contexto em que a autora inspirada os escreveu. No final do livro encontramos um guia de estudo preparado pelo pastor Erton Köhler [9].

Temos também um clássico da música sacra: a obra de Wolfgang H. M. Stefani. A sua obra já tem sido estudada por anos nos nossos seminários. Ele apresenta de forma lúcida que o nosso conceito e definição de música e reverência estão relacionados com o nosso conceito da natureza de Deus [10].

Na revista do Ancião, temos o artigo “O Hinário Adventista é para Jovem”  do pastor Otimar Gonçalves que aponta para os perigos dos estilos de músicas usados na igreja incluindo o uso dos instrumentos de percussão [11]. Além deste, temos do mesmo autor o artigo “As Preocupantes Implicações do Uso dos Tambores/Bateria na Adoração a Deus”, o qual analisa várias expressões atuais de louvor, inclusive a utilização de baterias nos cultos [12].

A última obra que proponho como leitura sobre este assunto é a do pastor Samuel Bacchiochi. Essa obra trata de forma histórica de como o estilo popular de música tem sido introduzida nas igrejas tradicionais e evangélicas, mostrando assim o efeito negativo desse novo estilo e novamente apontando para a substituição do Espírito verdadeiro por outro, que é o falso [13].

Portanto, no desenvolver desse assunto levaremos em consideração as Escrituras Sagradas, o Espírito de Profecia e estes autores. Além disto, deveríamos deixar nossas pressuposições pessoais e observar as evidências para termos a certeza de que aquilo que apoiamos é bíblico e não apenas uma crença popular ou gosto particular. Este estudo não tem de forma alguma a pretensão de ser a última palavra nem mesmo a última peça do quebra cabeça, mas apenas uma avaliação do que já foi encontrado anteriormente por outros estudiosos deste tema.

Qual a Importância de Reavaliar as Evidências

Colocarei de maneira resumida uma lista de razões do porquê da necessidade de se estudar e continuar aprendendo sobre o que realmente implica o ato de adorar através de música na igreja. Esta lista não está completa, é apenas uma amostra observada por mim e outros estudiosos:

1. Relaciona-se com o Futuro: “Essas coisas que aconteceram no passado hão de ocorrer no futuro. Satanás fará da música um laço pela maneira por que é dirigida,” [14]. Se a música seria um laço no futuro, tendo como presente o tempo de Ellen G.White, isto que dizer que hoje poderia ser o futuro que ela tinha em mente. Portanto, devemos estar conscientes disto.

2. Relaciona-se com a Identidade Adventista: “Nós somos adventistas e deveríamos abordar a adoração como adventistas. Uma adoração que preenche as necessidades dos metodistas, episcopais ou presbiterianos não seria necessariamente satisfatória para nós” [15]. Hoje, eu incluiria aqui a adoração e louvor pentecostal como sendo não sendo válidos para nós, adventistas.

3. Relaciona-se com o Sábado: O sábado é fundamental na adoração a Deus, pois Ele é o Criador, o Redentor e o Mantenedor pela eternidade. O sábado envolve assim a criação, recriação e a Nova Terra. Portanto, o serviço de culto aos sábados na igreja é a manifestação das Suas criaturas por esse grande amor criativo e redentor. Deus promove a adoração verdadeira, a qual é fundamentada sobre a Sua palavra. Dessa maneira, o tempo do sábado é santo, sagrado e separado do secular para um propósito especial, o ato de adorar a Deus. Esse tempo separado nos ajuda a diferenciar o sagrado do profano não somente em relação ao tempo, mas também com relação às nossas atitudes, motivos, roupas, comida, trabalhos, música e muitas outras coisas. Por isso, deveríamos ter muito cuidado em empregar qualquer estilo de música associado com estilos seculares como o jazz, blue, samba, rock, bossa nova, chorinho, country, hip-hop, etc. [16]. O sábado não é um dia de nos divertir, mas sim de re-criação, de adoração a Deus, servindo-O [17]. O sábado é o sinal de Deus com o propósito de nos auxiliar no processo da nossa santificação, que é a obra do Espírito na nossa vida [18]. Portanto, se usarmos estilos de músicas seculares estaremos profanando o sábado.

4. Relaciona-se com o reconhecimento da soberania de Deus: O termo “adoração” palavra aparece 58 vezes no Novo Testamento. Dessas, 23 vezes aparece no Apocalipse. Assim podemos ver que a música que faz parte da adoração a Deus deve ser estudada e compreendida, visto que a adoração ao verdadeiro Deus será o ponto divisor final entre o povo de Deus e os ímpios [19].

5. Relaciona-se com a rejeição à magem da Besta: A estátua que Nabucodonosor construiu para ser adorada em Daniel 3 representa de forma paralela um microcosmo do que será no futuro na adoração da imagem da besta (Apocalipse 13). Em ambas as passagens a adoração é fundamental. A música teve um papel importante para a adoração da imagem na planície de Dura. Essa música não era o todo do problema, era apenas uma parte que motivou ou levou o povo a aceitar de forma mais emotiva aquilo que racionalmente não aceitariam. Esse evento em Dura, sendo um paralelo com os eventos finais, poderia ser uma indicação do perigo da música no tempo do fim como E.G.W. menciona no item um desta lista [20], preparando o cristianismo para receber o anticristo. Doukhan escreve que “este episódio do livro de Daniel nos adverte contra uma religião estritamente emocional. A emoção pode fazer parte da experiência religiosa unicamente quando vai unida a reflexão e ao raciocínio. A adoração deve incluir todo o ser e descuidar um desses aspectos poderia conduzir à adoração de um ídolo” [21].

6. Relaciona-se com uma das primeiras coisas que faremos no Céu: Uma das primeiras coisas será o ato de cantar o cântico de Moisés e do Cordeiro sobre o mar de vidro com as harpas de Deus [22]. Nada indica que essa música será dançante, psicodélica ou melodramática. Ao contrário disso, será o cantar da nossa experiência vivida com Cristo aqui na terra cantando todos os feitos de Deus e de Seu Filho por nós com os instrumentos de Deus.

Tendo esta lista de razões e muitas outras que o próprio leitor poderia adicionar, podemos compreender melhor do porquê reavaliar as evidências do tipo de música e instrumentos que poderiam ser usados no louvor a Deus na igreja. Começarei com o Antigo Testamento direcionando, como já mencionei acima, até chegarmos à música no Céu como a encontramos descrita no Apocalipse. Observe que essa peça – louvor e adoração – do quebra cabeça do Ômega é apenas sintomática, e não a patologia em si [23]. Portanto este estudo tem como propósito o aporte de outra peça ao quadro geral já estabelecido por outros autores adventistas, incluindo E.G. White.

Exemplos Bíblicos Esclarecedores sobre o Louvor e Música no Antigo Testamento

Nesta parte do estudo não serei exaustivo, pois o espaço não nos permitiria. O propósito deste estudo não é o de exaurir todas as evidências, mas apresentar um começo à reavaliação das evidências. Começo com uma narrativa bíblica daquilo que Deus disse a Seu povo, neste caso Davi. Lembrem-se que Ele não muda.

Davi leva a Arca para Jerusalém primeira vez (ca. 1000 a.C.)

II Samuel 6:1-7
1 “Tornou Davi a ajuntar todos os escolhidos de Israel, em número de trinta mil.
2 Dispôs-se e, com todo o povo que tinha consigo, partiu para Baalá de Judá, para levarem de lá para cima a arca de Deus, sobre a qual se invoca o Nome, o nome do SENHOR dos Exércitos, que se assenta acima dos querubins.
3 Puseram a arca de Deus num carro novo e a levaram da casa de Abinadabe, que estava no outeiro; e Uzá e Aiô, filhos de Abinadabe, guiavam o carro novo.
4 Levaram-no com a arca de Deus, da casa de Abinadabe, que estava no outeiro; e Aiô ia adiante da arca.
5Davi e toda a casa de Israel alegravam-se perante o SENHOR, com toda sorte de instrumentos de pau de faia, com harpas, com saltérios, com tamboris, com pandeiros e com címbalos.
6 Quando chegaram à eira de Nacom, estendeu Uzá a mão à arca de Deus e a segurou, porque os bois tropeçaram.
7 Então, a ira do SENHOR se acendeu contra Uzá, e Deus o feriu ali por esta irreverência; e morreu ali junto à arca de Deus.”

Observe que o espaço dedicado pelo escritor ao preparo espiritual e musical do povo de Deus nesta ocasião foi pouco. Tudo parece ter sido feito no improviso fundamentado no sentimento, cultura, emoções, motivos e boas intenções, porém sem fundamento bíblico.

Tudo deu errado nessa viagem. Apesar de Davi ter preparado um carro novo “à moda dos filisteus,” apesar de terem os melhores motivos e intenções no coração, com uma multidão de pessoas devotas, apesar de estarem cantando e se alegrando, e ainda que todos estivessem se regozijando e achando que tudo isto era a melhor “festa” ao Senhor, tudo saiu errado antes do final da trajetória.

Vejamos agora a segunda tentativa de trazer a arca para Jerusalém.

Davi leva a Arca pela segunda vez (cerca de 1000 a.C)

I Crônicas 15:1-28
1 “Fez também Davi casas para si mesmo, na Cidade de Davi; e preparou um lugar para a arca de Deus e lhe armou uma tenda.
2 Então, disse Davi: Ninguém pode levar a arca de Deus, senão os levitas; porque o SENHOR os elegeu, para levarem a arca de Deus e o servirem para sempre.
3 Davi reuniu a todo o Israel em Jerusalém, para fazerem subir a arca do SENHOR ao seu lugar, que lhe tinha preparado.
4 Reuniu Davi os filhos de Arão e os levitas: (…)
11 Chamou Davi os sacerdotes ( …)
12 e lhes disse: Vós sois os cabeças das famílias dos levitas; santificai-vos, vós e vossos irmãos, para que façais subir a arca do SENHOR, Deus de Israel, ao lugar que lhe preparei.
13 Pois, visto que não a levastes na primeira vez, o SENHOR, nosso Deus, irrompeu contra nós, porque, então, não o buscamos, segundo nos fora ordenado.
14Santificaram-se, pois, os sacerdotes e levitas, para fazerem subir a arca do SENHOR, Deus de Israel.
15Os filhos dos levitas trouxeram a arca de Deus aos ombros pelas varas que nela estavam, como Moisés tinha ordenado, segundo a palavra do SENHOR.
16 Disse Davi aos chefes dos levitas que constituíssem a seus irmãos, os cantores, para que, com instrumentos músicos, com alaúdes, harpas e címbalos se fizessem ouvir e levantassem a voz com alegria.(…)
19 Assim, os cantores Hemã, Asafe e Etã se faziam ouvir com címbalos de bronze;
20 Zacarias, Aziel, Semiramote, Jeiel, Uni, Eliabe, Maaséias e Benaia, com alaúdes, em voz de soprano;
21 Matitias, Elifeleu, Micnéias, Obede-Edom, Jeiel e Azazias, com harpas, em tom de oitava, para conduzir o canto.
22 Quenanias, chefe dos levitas músicos, tinha o encargo de dirigir o canto, porque era perito nisso.
23 Berequias e Elcana eram porteiros da arca.
24 Sebanias, Josafá, Natanael, Amasai, Zacarias, Benaia e Eliézer, os sacerdotes, tocavam as trombetas perante a arca de Deus; Obede-Edom e Jeías eram porteiros da arca.
25 Foram Davi, e os anciãos de Israel, e os capitães de milhares, para fazerem subir, com alegria, a arca da Aliança do SENHOR, da casa de Obede-Edom.
26 Tendo Deus ajudado os levitas que levavam a arca da Aliança do SENHOR, ofereceram em sacrifício sete novilhos e sete carneiros.
27 Davi ia vestido de um manto de linho fino, como também todos os levitas que levavam a arca, e os cantores, e Quenanias, chefe dos que levavam a arca e dos cantores; Davi vestia também uma estola sacerdotal de linho.
28Assim, todo o Israel fez subir com júbilo a arca da Aliança do SENHOR, ao som de clarins, de trombetas e de címbalos, fazendo ressoar alaúdes e harpas.”

Davi ficou sabendo que Deus abençoava a Obede-Edom, o geteu, onde a arca havia sido deixada nos últimos três meses. Davi decide tentar trazer a arca novamente. Mas dessa vez, ele toma todas as precauções devidas, fundamentado nas Escrituras Sagradas. Perceba a quantidade de espaço dedicada ao assunto da música, louvor e preparo pessoal como requisito na participação deste evento. Isso não é apenas um capricho do escritor, mas um sinal para nós da importância que o autor quer transmitir para seus leitores com respeito à correta maneira de adorar a Deus [24].

Tudo deu certo nesta segunda tentativa de levar a arca. Qual foi a diferença na segunda vez que agradou ao Senhor? Compare com a primeira tentativa:

  1. Santificaram-se, preparo espiritual.
  2. Designaram pessoas preparadas para o canto e a música, os levitas, porque eles eram fiéis e conheciam a palavra de Deus. Mesmo no passado durante a apostasia do deserto com o bezerro de ouro, os levitas foram fiéis.
  3. Carregaram-na conforme o mandato divino.
  4. Usaram instrumentos apropriados para a ocasião escolhidos por Deus [25].
  5. Reavaliaram o ato de reverência. Esse aspecto tem haver com obediência à vontade Divina revelada nas Escrituras Sagradas.

Salmos 150 (Período de Davi)

Não poderia deixar de mencionar o Salmo 150, pois este é muito usado para apoiar o uso de membranofones (percussão) na adoração e louvor. Recomendo para este estudo o artigo do professor Vanderlei Dorneles que tem por título “O Canto do Senhor“. Seu trabalho é preciso na questão da exegese e da análise histórica. Portanto, o estudioso desse assunto deveria ler esse artigo de Dorneles e tomar a sua própria decisão [26].

Salomão: Inauguração do Templo (cerca de 960 a.C.)

II Crônicas 7:6
“Assim, o rei e todo o povo consagraram a Casa de Deus. Os sacerdotes estavam nos seus devidos lugares, como também os levitas com os instrumentos músicos do SENHOR, que o rei Davi tinha feito para deles se utilizar nas ações de graças ao SENHOR, porque a sua misericórdia dura para sempre. Os sacerdotes que tocavam as trombetas estavam defronte deles, e todo o Israel se mantinha em pé.”

Várias décadas mais tarde Salomão recebe o reino do seu pai Davi e inaugura o templo que seu pai planejou construir, mas não foi permitido por Deus, pois havia derramado muito sangue [27]. Perceba que Salomão usa os mesmos instrumentos musicais que seu pai usava no louvor a Deus, mas não houve membranofones (aqueles instrumentos que possuem membrana de couro sobre algo oco para produzir sons) nem danças. Então, o Senhor fez cair fogo do Céu como sinal de aceitação do Templo. Tome em consideração a frase “os instrumentos músicos do SENHOR”. Essa frase indica que eles conheciam a vontade de Deus a esse respeito, e assim se dispuseram a obedecê-lo.

Deus não permitiu o uso de instrumentos do tipo dos membranofones no templo para evitar a relação com o paganismo e os efeitos de tais instrumentos sobre o caráter e a mente dos ouvintes [28], e o seu efeito entorpecente, excitando os sentidos e motivando a dança, ainda que fossem instrumentos populares na sua época e muito usados pelos cananeus que rodeavam os israelitas em Canaã. Segundo Braun, com respeito aos tambores, ele escreve que “diferentemente dos shofar, este [membranofone] nunca é mencionado em conexão com a música do templo,” (I Crônicas 25:6). Esses instrumentos como o tamborim, tambor e pandeiros pertenciam a estrata mais antiga dos instrumentos em Israel, pois a iconografia desses instrumentos contradiz a fé ortodoxa do Antigo Testamento[29].

Lembrem-se que o santuário terrestre era um modelo e sombra da realidade celestial; uma réplica daquele que está no céu, assim o ritual, música, tipo de instrumento, mensagem, construção, etc., eram ordenados por Deus, conforme Hebreus 8:2 e 5:

2 como ministro do santuário e do verdadeiro tabernáculo que o Senhor erigiu, não o homem. …
5
os quais [sacerdotes] ministram em figura e sombra das coisas celestes, assim como foi Moisés divinamente instruído, quando estava para construir o tabernáculo; pois diz ele: Vê que faças todas as coisas de acordo com o modelo que te foi mostrado no monte.”

Tempo do rei Ezequias (cerca de 715 a.C.)

Ezequias repara o templo depois de uma longa era de apostasia, mas perceba: que “instrumentos músicos do SENHOR” eram estes usados pelo rei Ezequias mais de um século depois de Salomão? O rei Ezequias nos dá esta resposta em II Crônicas 29:25-26 (ênfase acrescentada):

25 Também estabeleceu os levitas na Casa do SENHOR com címbalos, alaúdes e harpas, segundo mandado de Davi e de Gade, o vidente do rei, e do profeta Natã; porque este mandado veio do SENHOR, por intermédio de seus profetas.
26 Estavam, pois, os levitas em pé com os instrumentos de Davi, e os sacerdotes, com as trombetas.”

Portanto, podemos ver que os “instrumentos músicos do Senhor” revelado a Davi pelos profetas eram o címbalos, alaúdes e harpas e as trombetas de pratas ordenadas a Moisés no deserto [30]. Esses eram para ser usados no louvor a Deus, ainda que já existissem os tambores, pandeiros, e muitos outros. Aqui se encontra não uma sugestão, mas uma ordem divina para o Seu louvor revelado a Seus profetas, pois o texto é porque este mandado veio do SENHOR.”

Vejam que o os instrumentos acerca dos quais o mandato veio da parte do Senhor pelos profetas eram o címbalo, alaúdes e harpas. Por isso, esses são os mesmos instrumentos usados por Salomão e anteriormente por Davi no louvor a Deus no templo ou em qualquer outra ocasião de culto solene. Ainda que haja menções esporádicas de tambores e pandeiros aqui e ali no texto do Antigo Testamento, indica-se que não eram os melhores para louvar a Deus. Na verdade, foram tolerados, devido a ignorância do povo, como o foram a poligamia e as bebidas fortes. No louvor dentro da Casa de Deus, porém, essas coisas nunca foram permitidas nem mesmo toleradas. Deus não aceita – na verdade Ele abomina – a mistura do sagrado com o profano, ou que as coisas santas sejam tratadas como se fossem comuns. Podemos constatar isso através da reação de Deus a Nadabe e Abiu, quando estes trouxeram fogo estranho para dentro do santuário, ou quando Uzá tocou a arca, ou então pelo fato de que nenhum dos sacerdotes jamais entrou em união de poligamia e também pelo fato de nunca ter sido permitido o uso de membranofones dentro do templo.

O címbalo, apesar de ser um idiofone, não era usado para marcar o ritmo, mas unicamente o início e as pausas, como o selah dos Salmos. Seu formato era diferente do usado no paganismo onde se primava pelo ritmo marcado pelos membranofones. Veja a descrição, de ambos os tipos de címbalos, na obra de Braun. Segundo Kleining o uso dos címbalos nos tempos bíblicos do Antigo Testamento tinha a seguinte função

“o címbalo não era usado pelo maestro para conduzir o canto marcando o ritmo da estrofe ou refrão por meio das batidas, pelo contrario, este era usado para indicar o início ou a nova estrofe na música. Pelo fato de que este instrumento era usado apenas para introduzir a música, este era manuseado pelo condutor do coral de vozes em ocasiões comuns (I Crônicas 16:5), ou por três lideres do canto em ocasiões especiais (I Crônicas 15:19). Já que a trombeta e o címbalo eram tocados juntos com o propósito de anunciar o início da música os instrumentistas que os tocavam eram chamados de ‘ressoadores’ (I Crônicas 16:42) [31].

Portanto este uso bíblico dos címbalos não deve ser usado como justificativa para usá-los, como têm sido nos conjuntos de rock ou bandas de músicas populares. No templo este instrumento não marcava o ritmo nem era usado como acompanhante do alaúde e da harpa. Esse método musical do templo é completamente oposto ao das músicas populares contemporâneas dos nossos dias, que usam os címbalos precisamente no auxílio dos tambores na bateria para marcar o ritmo da música.

O Profeta Ezequiel (Exílio Babilônico 605-530 a.C.) (Ezequiel 28:13)

Ezequiel é considerado o profeta do povo de Deus no exílio babilônico. Este profeta viveu na Babilônia. Assim, a passagem de Ezequiel 28:13 [32] tem sido considerado como uma possibilidade de que Deus tenha criado Satanás com tambores nas mãos. Isso, porém, iria não somente contra todas as narrativas bíblicas sobre o uso dos instrumentos de percussão no templo, mas também seria um crime contra o próprio texto de Ezequiel. O contexto geral é sobre a queda de Lúcifer e o contexto específico é de como ele estava paramentado para servir na presença de Deus antes da sua rebeldia.

Dois Termos-Chave para Entendermos esse Texto

Há dois termos (ou frases) hebraicos neste verso que esclarecem esta questão. O primeiro deles é tupeykha, traduzida por algumas versões por “teus tambores/tamborins.” Em nenhum outro lugar na Bíblia Hebraica esse termo aparece com esta vocalização, somente aqui ela ocorre. Portanto não há um paralelo bíblico para uma exata tradução. Contudo, fundamentando-se no contexto e no estudo etimológico do dado vocábulo, suas cabíveis traduções seriam: “estrutura” “engaste,” “encrave,” “suporte,” “encaixe,” ou “beleza.”

As versões antigas testemunham sobre o texto Massorético [33] traduzindo a frase tupeykha – supostamente “teus tambores” – da seguinte maneira: a Septuaginta traduz “[de ouro] os teus tesouros,” a versão Siríaca por “teu tórax”; a Vulgata latina de Jerônimo traduz por “teus adornos”; Áquila e Teodósio, duas versões antigas que primavam pela literalidade do texto traduziram como “tua beleza.”

Considerando-se o estudo semântico da língua hebraica e de suas cognatas, vários comentaristas preferem traduzir este primeiro termo, ou frase, como sendo apenas um suporte para as pedras preciosas e não como instrumento musical. O hebraísta H. J. van Dijk conclui que a melhor tradução para tupeykha seria “os trabalhos da tua beleza,” tomando por base a vocalização da palavra hebraica yafah “belo”. O reconhecido lingüista G. R. Driver interpreta esse termo como sendo um ornamento com o formato de um tamborim, onde as pedras preciosas eram encaixadas [34]. Assim conclui Driver ao analisar tupeykha em símile com o texto de Jeremias 31:4. Semelhantemente G. A. Cook, autor de um dos melhores comentários crítico textual já publicados [35], segue a mesma linha de interpretação de Driver. Por sua vez, o lexicógrafo Jahnow Hedwig sugere “tua obra esculpida” [36].

O segundo termo hebraico encontrado no mesmo verso que apóia a palavra “engaste” como a mais provável tradução para tupeykha é uneqaveykha “e os teus suportes” (traduzido por alguns por “adufes” ou “pífaros”), isto é, das pedras preciosas. Esse termo, na forma em que se encontra aqui, não ocorre em nenhum outro lugar do texto hebraico; portanto, sem um paralelo exato no texto hebraico, o que torna sua interpretação ainda mais difícil.

A Septuaginta traduz uneqaveykha por “os teus armazéns,” enquanto que a Vulgata Latina apresenta o seguinte texto “teu peito” ou “tua fronte”. O assiriologista Schiel, apoiado num estudo paralelo com a língua dos caldeus, propôs que este segundo termo implique em um “ornamento oco” onde se encaixavam as pedras preciosas [37]. Dijk (p. 119), por sua vez, prefere tomar essa palavra como um termo expressando algo “notável”. Ele conclui assim baseado em Amós onde um termo semelhante a este (uneqaveykha) aparece “… homens notáveis [nequevay] da principal das nações…,” Amós 6:1. Desta maneira Dijk propõe a tradução “e esplendor em ti,” para este segundo termo e não “teus adufes” ou “pífaros.” Um dos léxicos hebraicos mais populares no mundo acadêmico [38] explica esta palavra (nequeva, cujo significado primário é “orifício, túnel, buraco”) como “termo técnico para trabalhos de pedras preciosas, provavelmente contendo algum orifício ou cavidade,” e apresenta a seguinte tradução para ambos os termos encontrados em Ezequiel 28:13 thy sockets and thy grooves (“teus engastes e cavidades”) ou thy settings and thy sockets (“teus lugares de receber as pedras e teus engastes”). Esse termo está no dicionário de W. L. Holladay [39] como significando uma “mina,” isto é, onde se explora minério ou pedras preciosas, clarificando ainda mais o contexto desta passagem onde Lúcifer recebe pedras preciosas e não instrumentos musicais.

Perceba que as duas versões Bíblicas publicadas pela Sociedade Judaica de Publicações (JPS) traduzem parte deste verso como se segue, “And gold beautifully wrought for you, Mined for you” (“e ouro belamente trabalhado para ti, extraído para ti” [40]), e “and gold; the workmanship of thy settings and of thy sockets was in thee,” (“o trabalho elaborado da tua estrutura e dos teus engastes estava em ti” [41]). Semelhantemente a versão Almeida Revista e Atualizada de 1999 traduz “de ouro se te fizeram os engastes e os ornamentos.” Assim podemos ver que as versões antigas e as modernas, que apresentam uma tradução próxima do texto hebraico, não usam as palavras “tambores,” “tamborins,” “adufes,” ou “pífaros” para traduzir os termos hebraicos deste texto.

Isto demonstra que a melhor tradução para ambos os termos não é a de instrumentos musicais, mas sim apenas os encaixes e suportes das pedras preciosas. Portanto, estes dois termos descrevem apenas parte da vestimenta de Lúcifer que recebiam as pedras preciosas, como por exemplo, as 12 pedras e o urim e o tumim que estavam encaixados no peitoral do sumo sacerdote e este por sua vez servia de suporte para essas gemas preciosas.

Conseqüentemente, essa passagem em hebraico não é uma evidência apoiando ou não o uso de percussão na igreja, sendo apenas a descrição das vestes de Lúcifer quando ele servia na presença de Deus.

Como regra de interpretação bíblica, não se deve fundamentar algo de suma importância, como o tema de louvor e adoração na igreja, sobre um texto com termos ambíguos indo contra todos os outros textos bíblicos que são claramente entendidos sobre o assunto. Isso não seria uma boa regra de hermenêutica e demonstra apenas a parcialidade do suposto intérprete em favor de uma versão que apóie sua preferência musical. Concluo que uma das versões portuguesas que reflete neste caso específico o texto hebraico é a Almeida Revista e Atualizada de 1999, que diz: “de ouro se te fizeram os engastes e os ornamentos.” A tradução literal do texto hebraico é “de ouro se te fizeram os teus engastes e os teus encaixes.” Outras versões com traduções semelhantes a essas também são aceitáveis.

Esdras e Neemias (5 séc. a.C.)

Após o exílio (quinto século a.C.) a adoração foi feita da mesma forma que no tempo de Salomão. A ênfase não era apenas na letra, mas também na música. Letras de salmos e atos salvíficos de Deus só poderia ser apropriadamente transmitida através de um ritmo sóbrio, não dançante, sem sensualidade ou balburdia e com instrumentos escolhidos por Deus.

Esdras 3:10-11
10 Quando os edificadores lançaram os alicerces do templo do SENHOR, apresentaram-se os sacerdotes, paramentados e com trombetas, e os levitas, filhos de Asafe, com címbalos, para louvarem o SENHOR, segundo as determinações de Davi, rei de Israel.
11Cantavam alternadamente, louvando e rendendo graças ao SENHOR, com estas palavras: Ele é bom, porque a sua misericórdia dura para sempre sobre Israel. E todo o povo jubilou com altas vozes, louvando ao SENHOR por se terem lançado os alicerces da sua casa.

Neemias 12:27-31
27 Na dedicação dos muros de Jerusalém, procuraram aos levitas de todos os seus lugares, para fazê-los vir a fim de que fizessem a dedicação com alegria, louvores, canto, címbalos, alaúdes e harpas.
28 Ajuntaram-se os filhos dos cantores, tanto da campina dos arredores de Jerusalém como das aldeias dos netofatitas,
29 como também de Bete-Gilgal e dos campos de Geba e de Azmavete; porque os cantores tinham edificado para si aldeias nos arredores de Jerusalém.
30Purificaram-se os sacerdotes e os levitas, que também purificaram o povo e as portas e o muro.
31 Então, fiz subir os príncipes de Judá sobre o muro e formei dois grandes coros em procissão, sendo um à mão direita sobre a muralha para o lado da Porta do Monturo.

Observe que em Esdras 3:10 e Neemias 12:27 não há qualquer menção de danças ou músicas dançante. Pelo tipo de instrumentos e pela linguagem que o autor se refere ao preparo musical, tudo indica que o tipo de adoração era semelhante ao tipo ordenado por Deus a Davi pelos profetas.

Conclusão Parcial

E o Antigo Testamento termina com Malaquias 3:6 dizendo: “Eu sou o Senhor e Eu não mudo…” Deus é o mesmo ontem, hoje e amanhã. Se Ele escolheu assim, assim deveria ser até termos outra ordens dEle para que pudéssemos mudar. A cultura não deveria sobrepor aos mandatos divinos com respeito à adoração ou sobre qualquer outro estatuto explicitamente dados por Deus na sua Palavra. Lembre-se que o santuário terrestre era um modelo e sombra da realidade celestial; uma réplica daquele que está no céu, assim o ritual, música, tipo de instrumento, mensagem, etc., eram ordenados por Deus [42].

O Modelo de Adoração da Sinagoga (5 séc a.C-19 séc. d.C.)

A origem da sinagoga tem sido aceita como tomando lugar no tempo do exílio de Judá em Babilônia. Essa instituição teria sido fortalecida na Palestina com a volta de Esdras. E é nesta instituição que deveríamos observar os vestígios da adoração do templo do Antigo Testamento e da igreja primitiva apostólica até o quarto ou quinto século d.C., quando ocorreu a invasão do Império Romano pelos bárbaros. Os intelectuais do judaísmo no período helenista (330 a.C.-330 d.C.) viam o caminho do helenismo com certo temor. Criam que o helenismo poderia ser uma ameaça à identidade da religião judaica. Rodeados pelo helenismo especialmente depois da destruição do templo (70 d.C.) os líderes do judaísmo temiam que a música helênica fosse uma tentação para abandonar o judaísmo.

O Talmude de Babilônia menciona que o Rabino Elisha bem Abuyah se apostatou devido à melodia grega que ele ouvia e pelos instrumentos musicais da cultura grega que ele possuía em sua casa [43]. Essa preocupação com os instrumentos, com a música e com estilo de louvor da parte desses intelectuais judeus tinha como fundamento erigir uma muralha de proteção ao redor da lei. Esta era o fundamento da sua religião [44]. Chegaram a proibir a participação em desfiles musicais gregos com o temor de assimilarem os costumes gregos [45]. Podemos ver através da história judaica que os instrumentos musicais foram banidos da sinagoga já no exílio em Babilônia e enfatizado depois da destruição do templo no ano 70 d.C., sendo que a partir daí somente o shofar permanece como instrumento simbólico-litúrgico. A razão principal foi evitar qualquer associação com os cultos pagãos assimilando assim a cultura babilônica e posteriormente a greco-romana e conseqüentemente diluindo a identidade judaica. Principalmente, o culto a Cibele na Àsia Menor e de Dionísio em Roma fizeram com que os lideres judeus evitassem tais associações. Sibyl, escritor da época, é muito explícito no que diz respeito aos cultos pagãos em relação aos cultos judaicos deste período da história; ele diz o seguinte a respeito dos judeus:

“Eles não derramam sangue dos sacrifícios sobre o altar; nem mesmo os tambores são tocados, nem címbalos, nem as flautas com seus orifícios, instrumentos cheios de sons histéricos, nem um assovio da flauta pan é ouvido imitando a serpente, nem a trombeta chamando para a guerra de maneira selvagem” [46].

Somente no século vinte é que certas sinagogas permitem o uso de instrumentos variados. Ainda assim o uso só foi permitido nas sinagogas liberais da época, e hoje nas progressistas, messiânicas “pentecostais,” ou ultra-liberais. Os rabinos ortodoxos e chassidim não os permitem até os nossos dias, somente o shofar continua sendo aceito. Instrumentos variados, porém, são usados fora do recinto sagrado.

Conclusão Parcial

As evidências do Antigo Testamento não apóiam o uso dos membranofones (percussão) no templo ou na sinagoga ou em qualquer ajuntamento solene, mesmo que fora do templo. Estes estavam associados ao paganismo e foi tolerado no folclore israelita como o foi a poligamia e as bebidas alcoólicas, mas que posteriormente deveriam ser eliminados.


Notas Bibliográficas

[1] Jesus disse “Eu sou o Alfa e o Ômega, o Primeiro e o Último…” Os próprios títulos “Alfa” e “Ômega” da apostasia podem ser uma indicação da imitação que o inimigo quer fazer da verdade, isto é, tomar o lugar que só é dado a Cristo. Satanás sempre quis ser como Deus, tomando sobre si os Seus atributos de poder e deixando de lado os atributos relacionados como o amor. Satanás dizia no seu coração “. . . serei semelhante ao Altíssimo,” (Is 14:14).

[2] José Carlos Ramos, A Igreja em perigo: O Ômega da apostasia predita por Ellen White (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2008).

[3] Lewis R. Walton, Ômega (Washington: Review and Herald, 1981), cap. 7.

[4] Ellen G.W. Manuscripts Release, 20, 1906.

[5] Braun, Music in the Ancient Israel/Palestine, (Grand Rapids, MI: Eerdmans, 2002).

[6] Braun, 11-12.

[7] Eric Werner, “The Conflict Between Hellenism and Judaism in the Music of the Early Christian Church,” Hebrew University Studies (1975): 407-470.

[8] Vanderlei Dorneles, Cristãos em Busca do Êxtase (Engenheiro Coelho, SP:Unaspress, 2008).

[9] Elen G.White, Música: Sua influência na vida do Cristão (Tatuí, SP: CPB, 2005).

[10] Wolgang Hans Martin Stefani, Música Sacra, Cultura e Adoração, 2 ed. (Engenheiro Coelho, SP: Unaspress, 2002)

[11] Otimar Gonçalves, “O Hinário Adventista é para Jovem,” Revista do Ancião, abr-jun (2009): 26-28.

[12] Otimar Gonçalves, As Preocupantes Implicações do Uso dos Tambores/Bateria na Adoração a Deus

[13] Samuel Bacchiochi, The Christian and Rock Music: a Study on Biblical Principles of Music (Berrien Springs, MI: Biblical Perspective, 2000). Disponível em Português, com a permissão do autor, em O Cristão e a Música Rock – Capítulo 7

[14] Ellen G. White, Mensagens Escolhidas (Tatuí, SP – Casa Publicadora Brasileira), vol. 2, p. 38

[15] Norval Peace, And Worship Him (Nashville, TN: Publishing House, 1967), 8.

[16] Ver Manual da Igreja (Tatuí, SP – Casa Publicadora Brasileira), p. 180

[17] Isaías 1:13-14

[18] Ezequiel 31:13

[19] Apocalipse 14:6-12 (As três mensagens angélicas).

[20] Veja também Ellen G.White, Testemunhos para a Igreja (Tatuí, SP – Casa Publicadora Brasileira), vol. 5, p. 453

[21] Jacques B. Doukhan, Secretos de Daniel: Sabiduría y Sueños de um Príncipe Hebreo em el Exilio [Casa Editora Sudamericana: Buenos Aires, 2007], 49

[22] Apocalipse 15:1-8

[23] Ver: Helen G. Grauman, A Música em Minha Bíblia (Santo André, SP: CPB, 1968); Ellen G. White, Mensagens Escolhidas (Tatuí, SP – Casa Publicadora Brasileira), vol. 2, pp. 31-39, e outros.

[24] Quando E. G. White comenta este texto não enfatiza o problema da música na ocasião porque o texto já o faz. Portanto, seria redundante ou desnecessário. Ela enfatiza mais a falta de reverência e a presunção da parte Uzá pelo fato de ter pecado acariciado.

[25] Ver II Crônicas 7:6

[26] Vanderlei Dorneles, O Canto do Senhor (artigo)

[27] I Crônicas 22:6-10

[28] Eric Werner, 416: “Isto é notável o fato de que os três instrumentos … eram considerado não propícios para o uso no serviço do templo: o aulos (lylj), o tympanom (¸t), e o címbalos (mylxlx) … os rabinos possuíam uma estima muito baixa sobre estes instrumentos.” Estes címbalos eram os do tipo usados no paganismo.

[29] Joachin Braun, Music in the Ancient Israel/Palestine, (Grand Rapids, MI: Eerdmans, 2002), 29, 30, 31.

[30] Números 10

[31] John W. Kleining, The Lord’s Song: The Basis, Function and Significance of Choral Music in Chronicles (England: Sheffield, 1993), 82-83.

[32] “… a obra dos teus tambores e dos teus pífaros estava em ti…,” Almeida Revista e Corrigida, 1969

[33] Veja o aparato crítico da Bíblia Hebraica Stuttgartensia

[34] G. R. Driver, Uncertain Hebrew Words, JTS 45 [1944]: 14

[35] G. A. Cook, The Book of Ezekiel, International Critical Commentary [Edinburg, T &T Clark, 1936], 317

[36] Jahnow Hedwig, “Das Hebräische Leichenlied im Rahmen der Volkerdichtung”, em Beihefter zur Zeitschrift fur die Alttestamentliche Wissenchaft, 36 [Giessen: Alfredo Töpelmann, 1923], 222

[37] Schiel, “Fragments de la legende du dieu zu”, Revue de Assyriologie et d’Archéologye Orientale, 35 (1938), 14-25

[38] F. Brown, S.R. Driver e C.A. Brigg, eds., A Hebrew and English Lexicon of the Old Testament (Oxford: Clarendon Press), 1951

[39] W. L. Holladay, A Concise Hebrew and Aramaic Lexicon of the Old Testament (Grand Rapids, MI: Eerdmans, 1988), 244

{40] JPS-Tanakh, 1985

[41] JPS-1917

[42] Ver novamente Hebreus 8:2-5

[43] b. Chagiga 15b.

[44] Eric Werner, 410.

[45] Ibid. 415. Veja o tratado b. Sukkah 50b sobre os instrumentos usados nos cultos pagãos da Ásia Menor.

[46] Oracula Sibyllina 8, 113 (J. Geffken, Die Oracula Sibyllina, Leipzig, Hinrichs, 1902.), 147; Werner, “Tu,mpanon ouk hvcei. . ., p. 416.


Este artigo continua na Parte II


Pr. Joaquim Azevedo Neto, Ph.D. é Professor de Línguas Bíblicas e Antigo Testamento do SALT-IAENE, Bahia, Editor da revista Hermenêutica e Coordenador do Centro de Pesquisa de Literatura Bíblica.

Os editores do Música Sacra e Adoração agradecem ao Pr. Joaquim pela disposição em enviar este material para divulgação


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