Canto

por: Maurício Qüint Fortunato

“E disse Deus: Façamos o homem à nossa imagem, conforme nossa semelhança; domine ele sobre os peixes do mar, sobre as aves do céu, sobre o gado, sobre os animais selvagens e sobre todo animal rastejante que se arrasta sobre a terra. E Deus criou o homem à sua imagem; à imagem de Deus o criou; homem e mulher os criou” – Gênesis 1: 26 e 27.

A raça humana foi criada com a capacidade natural de comunicar-se, utilizando o aparelho fonador sem quaisquer imperfeições.

No livro Educação Ellen Gould White afirmou:

“Quando Adão saiu das mãos do Criador, trazia ele em sua natureza física, intelectual e espiritual, a semelhança de seu Criador. [….] Todas as suas faculdades eram passíveis de desenvolvimento; sua capacidade e vigor deveriam aumentar continuamente.

Pela desobediência, porém, isto se perdeu. Com o pecado a semelhança divina se deslustrou, obliterando-se quase. Enfraqueceu-se a capacidade física do homem e sua capacidade mental diminuiu; ofuscou-se-lhe a visão espiritual. Tornou-se sujeito à morte. Todavia, a raça humana não foi deixada sem esperança” (WHITE, Ellen Gould. Educação, CPB, Santo André – SP, 1977, pg. 15).

Em estado de inocência e pureza Adão e Eva contemplavam a face do Criador e rendiam-Lhe louvores que incluíam os cânticos. Portanto, a origem celestial da música é incontestável.

“Eu vi a beleza do céu. Eu ouvi os anjos cantarem seus cânticos arrebatadores, atribuindo louvor, honra e glória a Jesus. Pude então compreender alguma coisa do magnífico e maravilhoso amor do Filho de Deus” (WHITE, Ellen Gould. Testemunhos para a Igreja, CPB, Tatuí – SP, 2004, vol. I, pg. 123).

“Tem-me sido mostrada a ordem, a perfeita ordem do céu, e fui arrebatada quando ouvi a perfeita música que lá havia. Depois de acabar a visão o canto aqui me soou muito mal e dissonante. Eu vi grupos de anjos, que ficavam num quadrado; cada um tinha uma harpa de ouro. Na base da harpa havia uma peça girável para fixar a harpa ou mudar os tons. Seus dedos não corriam descuidadosamente sobre as cordas, mas faziam soar diferentes cordas para produzirem diferentes sons. Havia um anjo que sempre regia, o qual tocava primeiro a harpa dando o tom, então, todos se uniam à rica e perfeita música do céu. Esta não pode ser descrita. Era melodiosa, celeste e divina, enquanto cada semblante irradiava a imagem de Jesus, brilhando com glória inexprimível” (WHITE, Ellen Gould. Testemunhos para a Igreja, CPB, Tatuí – SP, 2004, vol. I, pg. 146).

O pecado, que é o afastamento da criatura de seu Criador, trouxe degeneração à raça humana, levando à morte.

“Portanto, assim como o pecado entrou no mundo por um só homem, e pelo pecado a morte, assim também a morte passou a todos os homens, pois todos pecaram” – Romanos 5:12.

O primeiro casal humano foi expulso do Éden, onde havia o direto relacionamento do Criador com suas criaturas. Adão e Eva não mais teriam acesso à árvore da vida que seria, a partir daquele momento, preservada para os salvos na Nova Jerusalém.

“A fim de possuir uma existência intérmina, o homem devia continuar a participar da árvore da vida. Privado disto, sua vitalidade diminuiria gradualmente até que a vida se extinguisse. Era o plano de Satanás que Adão e Eva pela desobediência incorressem no desprazer de Deus; e então, se deixassem de obter o perdão, esperava que comessem da árvore da vida, e assim perpetuassem uma existência de pecado e miséria. Depois da queda do homem, porém, santos anjos foram imediatamente comissionados para guardarem a árvore da vida. Em redor desses anjos chamejavam raios de luz, tendo a aparência de uma espada inflamada. A nenhum da família de Adão foi permitido passar aquela barreira para participar do fruto doador de vida; logo, não há nenhum pecador imortal” (WHITE, Ellen Gould. Patriarcas eProfetas, CPB, Tatuí – SP, 2003, pg. 60).

Cremos que Deus permitiu que o primeiro casal humano pudesse ouvir os cânticos dos anjos em louvor a Ele a cada sábado, quando se dirigiam aos portais do Éden para adorá-Lo.

“O jardim do Éden permaneceu sobre a Terra muito tempo depois que o homem fora expulso de suas deleitáveis veredas (Gênesis 4:16). Foi permitido à raça decaída por muito tempo contemplar o lar da inocência, estando a sua entrada vedada apenas pelos anjos vigilantes. À porta do Paraíso, guardada pelos querubins, revelava-se a glória divina. Para ali iam Adão e seus filhos a fim de adorarem a Deus. Ali renovaram seus votos de obediência àquela lei cuja transgressão os havia banido do Éden. Quando a onda de iniquidade se propagou pelo mundo, e a impiedade dos homens determinou sua destruição por meio de um dilúvio de água, a mão que plantara o Éden o retirou da Terra. Mas, na restauração final de todas as coisas, quando houver “um novo céu e uma nova Terra”, será restabelecido, mais gloriosamente adornado do que no princípio” (WHITE, Ellen Gould. Patriarcas e Profetas, CPB, Tatuí – SP, 2003, pg. 60).

O texto bíblico revela que somente após Jubal o ser humano passou a utilizar instrumentos musicais.

“O nome de seu irmão era Jubal; este foi o pai de todos os que tocam harpa e flauta” – Gênesis 4:21.

Nos versículos de 19 a 21 do capítulo 4 do livro do Gênesis temos o registro dos ascendentes de Jubal que são sete gerações a partir de Adão até que apareceram os primeiros instrumentos musicais; ou seja, Adão e seus descendentes até Jubal entoavam cânticos “alla cappella”.

“Os primórdios da música na Terra, conforme relato do primeiro livro da Bíblia, parecem pobres e inadequados, quando comparados com a música do Céu. Mas, apesar de haver sido simples, a música é mencionada em Gênesis.

O pecado trouxera escuridão à vida dos primeiros habitantes do mundo. Muito da alegria da vida edênica se havia perdido nos penosos dias de labor e suor para arrancar do duro solo os elementos vitais. Todavia, a música vocal deve ter tornado mais leve o trabalho e colorido as horas de lazer da primeira geração. A música instrumental demorou mais, pois, foi na sétima geração depois de Adão – o qual indubitavelmente ainda vivia – que Jubal se tornou o criador da lira e do pífaro ou flauta” (GRAUMAN, Helen G. Música em Minha Bíblia, CPB, Santo André – SP, 1968, pg. 11).

Se considerarmos como média de idade, na qual cada geração sucede a outra geração, podemos verificar que a raça humana do primeiro milênio de sua história na Terra adorou ao Criador sem qualquer acompanhamento de instrumentos musicais.

“A voz humana que entoa a música de Deus vinda de um coração cheio de reconhecimento e ações de graça, é incomparavelmente mais aprazível a Ele do que a melodia de todos os instrumentos de música já inventados pelas mãos humanas” (WHITE, Ellen Gould. Evangelismo, CPB, Tatuí – SP, 2007, pg. 506).

Podemos deduzir que a cada sábado, diante dos portais do Éden, os seres humanos e os anjos formavam um grandioso coral de louvor em adoração ao Criador. E ainda nos dias atuais as vozes humanas e as vozes dos anjos podem cantar juntas.

“Uma congregação pode ser a mais pobre da Terra. Pode não ter atrativo algum de pompa exterior, mas se os membros possuírem os princípios do caráter de Cristo terão Seu gozo na alma. Os anjos unir-se-ão a eles na adoração. O louvor e a ação de graças de corações reconhecidos ascenderão a Deus como suave oblação” (WHITE, Ellen Gould. Parábolas de Jesus, CPB, Santo André – SP, 1976, pg. 298).

“Quando seres humanos cantam com espírito e entendimento, músicos celestes vibram juntamente e unem-se ao cântico de ações de graças. Aquele que nos tem outorgado todos os dons que nos capacitam como obreiros de Deus, espera que Seus servos cultivem suas vozes de maneira a poder falar e cantar audível e compreensivelmente. Isto não implica a necessidade de cantar alto, mas com entonação clara e pronúncia correta, boa dicção. Que todos tomem tempo para o cultivo da voz, para que o louvor a Deus possa ser entoado claramente, em tonalidade suave, não com aspereza e estridência que fira o ouvido. A arte de cantar é um dom de Deus; que o usemos para a Sua glória” (WHITE, Ellen Gould. Testemunhos paraa Igreja, CPB, Tatuí – SP, 2006, vol. I, pg. 143 e pg. 144).

“Nunca se deve perder de vista o valor do canto como meio de educação. Que haja canto no lar, de hinos que sejam suaves e puros, e haverá menos palavras de censura e mais de animação, esperança e alegria. Haja canto na escola, e os alunos serão levados para mais perto de Deus, dos professores e uns dos outros.

Como parte do culto, o canto é um ato de adoração tanto como a oração. Efetivamente, muitos hinos são orações. Se a criança é ensinada a compreender isto, ela pensará mais no sentido das palavras que canta, e se tornará mais suscetível à sua influência” (WHITE, Ellen Gould. Educação, CPB, Santo André – SP, 1977, pg. 167).

“Aprende-se uma grande lição quando compreendemos nossa relação para com Deus e Sua relação para conosco. As palavras “Não sois de vós mesmos”, “porque fostes comprados por bom preço” deviam ser fixadas nas recâmaras da memória para que sempre possamos reconhecer o direito de Deus sobre nossos talentos, nossa propriedade, nossa influência e o nosso eu individualmente. Devemos aprender a lidar com esses dons de Deus no espírito, na alma e no corpo, a fim de que como possessão adquirida de Cristo possamos prestar-Lhe serviço sábio e agradável” (WHITE, Ellen Gould. Testemunhos para Ministros e Obreiros, CPB, Santo André – SP, 1979, 2ª edição, pg. 423).

Podemos concluir, após a apreciação de todas as citações, que a música teve sua origem no Céu e que sua gênese não pode ser creditada ao ser humano. Deus dotou a espécie humana da capacidade de compor e executar música por meio do canto e dos instrumentos musicais para adoração, para o desenvolvimento da expressão artística e para o deleite humano.

A música destinada à adoração precisa ser diferenciada de qualquer outra manifestação musical, porque o seu objetivo é atingir a sublimidade que deve caracterizar todo e qualquer ato de adoração ao Criador do universo. Os textos deste tipo de música devem servir para fixar verdades bíblicas.

A música também se destina ao desenvolvimento dos músicos e, neste caso, seria coerente e aceitável o uso do “play back”? Parece-nos que este recurso apenas uniformiza a execução musical, tolhindo possíveis nuances interpretativas dos músicos. Estaria este tipo de recurso revestido de autenticidade ou não passaria de simples cópia, de simples produção em série despersonificada? Seria este tipo de recurso uma forma sem sentido diante da multiforme criação divina?

A música do Céu foi ouvida por Ellen G. White e era perfeita, arrebatadora, melodiosa, solene e harmoniosa. Para que a música na Terra se aproxime um pouco desta forma não basta que o texto exalte o Senhor Deus Todo-Poderoso; é preciso que o equilíbrio entre melodia, harmonia, ritmo e andamento estejam adequados à solenidade e à santidade dAquele para O qual a música é composta e executada, ou seja, para o louvor e para a adoração do Criador.

Não há uma única folha que seja igual à outra folha mesmo que sejam da mesma planta. Por que o Senhor Se alegraria com recursos “engessados” em prejuízo do desenvolvimento dos talentos que Ele concedeu a cada pessoa?

“É bom render graças ao Senhor e cantar louvores ao Teu nome, ó Altíssimo, proclamar Teu amor pela manhã, e à noite, Tua fidelidade, com instrumentos de dez cordas, com saltério e ao som solene da harpa” – Salmo 92: 1 a 3.

Chamamos a atenção para a forma enunciada pelo salmista referente ao louvor ao Senhor: “som solene”. A qualidade do som tem que estar revestida de solenidade. Esta solenidade é devida e requerida à maior autoridade do universo. A solenidade a Ele dirigida em muito deve exceder àquela prestada ao mais relevante governante humano. Mas, lamentavelmente, muitos de nós nos dirigimos ao Senhor como se Ele não fosse o Criador e ofertamos-Lhe a “oferta de Caim”.

“Mas ordenei-lhes isto: Dai ouvidos à Minha voz, e Eu serei o vosso Deus, e vós sereis o Meu povo; andai em todo o caminho que Eu vos ordenar, para que vos corra tudo bem” – Jeremias 7:23.


Bíblia Sagrada Almeida Século 21, Editora Vida Nova, SP, 2008


Maurício Qüint Fortunato é Advogado graduado pela Universidade Federal de Santa Catarina. Formação em Canto Básico na Opus Associação de Música e Artes (SC). Participou dos grupos Coro Pro-Música e Polyphonia Khoros conectados à Orquestra Filarmônica Camerata Florianópolis e, atualmente, é estudante de violino no Projeto Orquestra Escolar da Associação Cultural Vieira em Florianópolis.