A Adoração

A Última Prova

por: Cláudio Hirle

A condição da vitória é o discernimento do Espírito, apoiado em um estilo de vida santificado

Sadraque, Mesaque e Abednego estavam diante de um momento crítico. Você se lembra da história, não é? Eles se encontravam no campo de Dura perante a imagem de ouro de Nabucodonosor. A fornalha de fogo ardente estava preparada para consumir os desleais. A ordem era incisiva. Todos deveriam adorar a imagem.

Como saberiam em que momento prostrar-se? Haveria algum anúncio? Não! O sinal indicativo do instante da prestação do falso culto era a música. Quando ela soasse, todos deveriam prostrar-se.

Mas, que mal havia em tomar parte ativa naquela celebração? Aparentemente, nada que comprometesse sua fé. Os jovens hebreus eram apenas ilustres convidados num culto pagão. Tratava-se simplesmente de uma cerimônia de consagração de uma estátua, com a presença de muita gente importante, acompanhada de uma banda executando “toda espécie de música” (Daniel 3:5, 7 e 10). Por que foram então tão resolutos em seu propósito de não ceder mesmo sob pena de morte? Havia algum forte motivo para essa resistência?

Uma atenta análise do contexto histórico dos três primeiros capítulos do livro de Daniel poderá conduzir o leitor a algumas conclusões, talvez surpreendentes. Essa não era a primeira vez que os príncipes hebreus estavam sendo testados na corte babilônica. Por duas outras eles tiveram que decidir entre os princípios divinos e os costumes e filosofias humanos, apoiando-se firmemente nos princípios divinos.

Observe-se que há uma linha progressiva nestas três provas, e a firmeza demonstrada na prova anterior reforçou a resistência para a posterior. Na primeira, o que estava em jogo era o estilo de vida (Daniel 1); na segunda, o conhecimento da verdadeira revelação (Daniel 2); e, na terceira, a adoração (Daniel 3). É digno de nota o fato de que, à semelhança do que ocorreu com Jesus no deserto (Mateus 4:1-10), as provas começam no campo do apetite e deságuam no campo da adoração.

Foi essencial superarem o teste alimentar para que tivessem uma mente desembotada e lúcida para receberem e compreenderem perfeitamente a revelação divina, de modo a terem discernimento para perceber a natureza falsa da adoração que lhes estava sendo então imposta.

Paralelo
As provas dos jovens hebreus em Babilônia e as tentações de Jesus no deserto

Provas dos jovens hebreus Tentações de Jesus
Daniel 1: Apetite Primeira: “manda que estas pedras se transformem em pães.” (Mateus 4:3 e 4)
Daniel 2: Revelação Segunda: “Se tu és o Filho de Deus, atira-te de aqui abaixo; porque está escrito…” (Mateus 4:5-7) Satanás se vale da revelação, interpretando-a de forma distorcida para favorecer o engano.
Daniel 3: Adoração Terceira: “Tudo isto te darei se, prostrado, me adorares.” (Mateus 4:8-10)

Os fatos relacionados com os jovens hebreus na corte babilônica, constituem-se numa maquete do “grande conflito”, e elucidam fatos atuais. Sua história é uma figura do povo de Deus na moderna Babilônia. Suas provas são as nossas provas, pois a palavra profética ao referir-se aos registros de Daniel, nos assegura: “Repetir-se-á a história passada. Antigas controvérsias serão revivescidas, e perigos rodearão de todos os lados o povo de Deus” (Ellen, G. White, em Testemunhos para Ministros, pág. 116). Muito tempo antes de Daniel, Salomão já havia demonstrado possuir consciência dessa natureza cíclica da história, ao afirmar: “O que é já foi; e o que há de ser, também já foi; Deus fará renovar-se o que passou” (Eclesiastes 3:15).

Deparamo-nos hoje, como igreja, com um tempo de teste semelhante ao dos hebreus em Babilônia. A adoração volta a ser uma área crítica. Temos sido levados pelas mudanças, aparentemente inofensivas, em nosso culto, por uma quase irresistível influência. Uma forte demanda por estimulação vinda do pentecostalismo e do movimento carismático está batendo fortemente a nossa porta, e muitas pessoas e congregações têm cedido aos encantos dessas sensações.

Este fenômeno acontece justamente num momento em que podemos estar perdendo nossa identidade musical, e nossos princípios litúrgicos parecem diluídos. O que os incautos não percebem, porém, é que o pacote babilônico contém muito mais que uma simples oferta musical. Há “vinho adulterado” (Apocalipse 14:8). Não podemos nos esquecer, porém, que fomos designados a denunciar a apostasia de Babilônia e não a nos contaminarmos em seu banquete.

Por enquanto, a falsa adoração está sendo sugerida pela sedução da música diversificada que agrada aos mais variados gostos. No entanto, a história profética indica que os que não se curvarem ao “som de toda sorte de música” serão forçados por Babilônia Mística a se render com as ameaças da fornalha da perseguição e da própria morte (Apocalipse 13:15). A ira do inimigo será endereçada então a todos os que a ele não se inclinarem. O caminho está sendo preparado para esse desfecho.

Parece claro, porém, que resistirão a esta prova final somente os que forem aprovados nos testes do estilo de vida e da revelação. Portanto, se temos fracassado nestas duas provas preparatórias, corremos o risco de não estarmos habilitados a superar a prova final. Restaurar os princípios da reforma de saúde e fortalecer o espírito com as verdades das Escrituras são, por conseguinte, nossas urgentes necessidades.

Precisamos de hábitos alimentares saudáveis que nos proporcionem uma mente desobstruída que sirva como canal de comunicação para o Espírito Santo. Assim estaremos aptos a nos debruçarmos sobre a revelação e adquirirmos a luz da verdade que nos proporcionará o discernimento necessário para identificarmos com sabedoria divina a verdadeira adoração, e rejeitarmos a falsa.

Vivemos hoje no tempo em que “os que habitam sobre a terra estão sendo seduzidos a fazer uma imagem à besta” (Apocalipse 13:14). Os “hebreus” modernos encontram-se no campo de Dura apocalíptico. Está em operação um sistema de culto e adoração paralelo ao sistema de adoração a Deus.

A música voltou ao palco, como o anúncio para se curvar e adorar o falso. Seus fascinantes efeitos estão levando muitos a se prostrarem perante um deus estranho, que jamais seria adorado em perfeito juízo. E como era de se esperar, Deus não se calou quanto ao papel que ela desempenharia nestes últimos dias (ver Mensagens Escolhidas, vol. II, págs. 31-39). Longe de ser elemento neutro no contexto escatológico do grande conflito, a música possui uma poderosa influência agregadora. Um estilo de música comum tem servido ao propósito satânico de consolidar a união ideológica entre adoradores de diferentes segmentos religiosos, representados profeticamente pelas figuras do Dragão, da Besta e do Falso Profeta (Apocalipse 16:13).

Diante disso, nosso papel é alertar os que têm sido iludidos por esses encantos, e convidar o mundo a prestar um culto distinto (Apocalipse 14:7). Nossa proposta de adoração é caracterizada por diferenciais que incluem, entre outras coisas, o cuidado do corpo e a integridade da mente (I Coríntios 6:20; Romanos 12:1).

Nesse tempo de crise em que o falso e o autêntico têm sido tão confundidos, quando está em pleno andamento um processo de intoxicação e embriaguez espiritual que embota a razão e entorpece o juízo (Apocalipse 17:1 e 2), mais que nunca precisamos ter mente clara, apurado discernimento espiritual, e consciência de toda a luz revelada. Só assim poderemos ser poupados do engano. E certamente, Aquele que andou com os valorosos hebreus na fornalha ardente, estará conosco no meio do fogo da angústia que assolará os fiéis na consumação do século (Mateus 28:20).


Cláudio Hirle é diretor do Instituto Petropolitano Adventista de Ensino (IPAE), em Petrópolis, RJ.

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